Antonio Carlos Egypto
Vi 3
filmes recentes da Índia que estão na Mostra, além da retrospectiva de Satyajit
Ray.
TUDO
QUE IMAGINAMOS COMO LUZ (All We Imagine as Light), Índia,
2024, competição Novos Diretores.
O
filme, dirigido por Payal Kapadia, tem duas etapas distintas, ao apresentar uma
trama centrada na figura da enfermeira Prabha.
Na primeira, o destaque é para Mumbai, cidade grande, de oportunidades
ou de ilusões, com muita agitação, problemas, desgastes, que se refletem na
rotina do hospital. Uma cidade que tem
muito a oferecer, mas que se tem de suportar.
Na segunda parte, há o oposto, a ida a um pacato lugarejo litorâneo, onde
se pode obter mais liberdade ou intimidade, ainda que o controle venha a ser
maior, após a expressão inicial dos desejos.
Mas aqui está se falando também de fantasias, imaginação, elementos
mágicos e destino. Isso dá um sabor
diferente à trama, embora também a disperse um tanto. O filme foi o vencedor do prêmio do júri, no
Festival de Cannes. 115 min.
SEGUNDA
CHANCE (Second Chance). Índia, 2024.
Competição Novos Diretores. Filme dirigido por Subhadra Mahajan.
O
filme se passa numa casa de veraneio, no Himalaia, na verdade, na neve, em
pleno frio. A jovem Nia, que há muito não
ia lá, passa um bom tempo sem que possamos saber de que se trata. Mas o assunto
central acaba aparecendo e, se eu não falar dele, não tenho nada a dizer. Por
isso, se não quiser saber, pare a leitura aqui e também não leia a sinopse
oficial do filme.
Bem, o
que se passa é uma gravidez não planejada, não desejada, e a busca por uma
pílula que possa impedi-la, depois do que já aconteceu. Não fica claro se seria
a opção da chamada pílula do dia seguinte ou, mais provável, de uma medicação com
efeito abortivo. O fato é que algo não
deu certo. E o filme, em magnífico preto
e branco, nos leva aos sentimentos que daí surgem, colocando em cena um menino,
cuja mãe morreu no parto, para interagir com ela num momento desses. É a infância ocupando o espaço. Por outro lado, ela está muito bem cuidada
pela sabedoria de Bheni, uma mulher calejada que também tem conhecimentos
ancestrais de povos originários e suas deusas das montanhas. Há ainda a questão das diferenças de classes
e castas entre os personagens principais.
Um trabalho digno de atenção. 104
min.
O
CATADOR DE SONHOS (The Scavenger of Dreams),
Índia, 2023, dirigido pelo experiente cineasta Suman Ghosh, mostra de forma
ultrarrealista o que é uma sociedade desigual, separada por distâncias abissais
dos pontos de vista econômico e social.
Um casal de lixeiros vive com sua filha de 6 anos numa favela de
Calcutá, em situação de miséria absoluta.
E, pelo jeito, não há uma Bolsa Família para lhes assegurar as condições
mínimas de uma vida digna. Isso, apesar
do trabalho remunerado do dia-a-dia, sem qualquer garantia. Mas eles são seres humanos que não só lutam
para sobreviver como têm esperanças e sonhos, como todo mundo. Mudanças na estrutura do trabalho podem
afetar o pouco que resta a essa família, já que não é possível reclamar,
questionar, lutar por direitos, impunemente.
A sequência em que a catadora de lixo precisa subir a uma casa grande
para fazer a coleta escancara de forma escandalosa a desigualdade existente na
Índia. Não só na Índia, claro. A Índia também é aqui. O filme é muito
competente em abordar essa temática de forma emocionante, envolvente, em
econômicos 83 minutos de duração.
Mas
quem quiser aproveitar o embalo do foco na Índia deste ano não pode deixar de
ver ao menos 2 ou 3 filmes de um dos maiores cineastas da história do cinema: o
indiano Satyajit Ray (1921-1992).
“Canção da Estrada” (1955), “O Invencível” (1956), “O Mundo de Apu”
(1959), “A Grande Cidade” (1963) e “O Herói” (1966) são verdadeiras
obras-primas.
@mostrasp #mostrasp
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