quinta-feira, 4 de agosto de 2022

UM HERÓI

ANTONIO CARLOS EGYPTO




UM HERÓI, Irã.  Direção: Asghar Farhadi.  Com Amir Jadidi, Moshen Tanabandeh, Sahar Goldust,   Sarina Farhadi.  127 min.

 

 “Um Herói” é um trabalho primoroso do diretor iraniano Asghar Farhadi.  O estilo do cineasta já é bastante conhecido, contando histórias de um modo elaborado, abordando por vários ângulos, trazendo informações novas, adicionais, mostrando o que sente o outro lado.  E, assim, o que parecia ser algo claro se torna duvidoso, obscuro ou até francamente falso.  A meu ver, o estilo Farhadi de contar histórias é que ele o faz problematizando.  Levanta questões e dúvidas o tempo inteiro. 

O que seria, portanto, um herói para o seu cinema?  Alguém que tem uma dívida que está pagando com um período na cadeia até conseguir saldá-la e quando, numa saída autorizada, acha um bom dinheiro numa bolsa na rua e mesmo assim resolve devolvê-la à sua dona, é um claro exemplo.

 Se a verdade fosse pura e simplesmente assim, talvez.  Mas se formos esmiuçar o que de fato aconteceu, novos elementos aparecerão.  Se formos contar a alguém, provavelmente arredondaremos os fatos, para que se tornem mais vivos e interessantes.  Se adicionarmos uma pitada de emoção registrada pelas câmeras, aí é que o sentido muda ainda mais.  Uma grande difusão em forma de notícia tende a causar comoção.

 



 

Por outro lado, no mundo atual das câmeras de celular, redes sociais, para cada notícia pode-se produzir a antinotícia.  Por interesses diversos, mas também porque todo herói tem um lado cafajeste e todo cafajeste tem seu heroísmo também.  Em outras palavras, o mundo é muito complexo para caber em caixinhas bipolares, esquemas simplificadores, certo e errado, preto e branco, verdade e mentira.  A gente é que tende a acreditar no que reforça o que já sabemos e adotamos como verdadeiro para nós.

O exercício que o cinema de Asghar Farhadi nos propõe é o de repensar a cada passo onde estará a verdade, pelo menos a verdade dos fatos.  Porque as interpretações são de outra ordem.  E ele mostra que essa verdade factual nos escapa e, quando ela entra em conflito com a narrativa que adotamos, pode ser ignorada ou rejeitada.  Ou, ainda, revisada, reajustada, de modo a continuar valendo.

Farhadi é um contador de histórias, seu cinema não dispensa bons personagens, situações intrigantes, expectativa, suspense.  E um bom elenco em cena.  Discute a sociedade, os comportamentos, as leis.  Está sempre levantando dúvidas, novas perguntas, nos obrigando a pensar em outras configurações no modo de encarar cada problema que ele nos apresenta.

 

 

3 comentários:

  1. Em tempo de explosão de fake news...bom ganhar esse olhar por vários ângulos, a capacidade de não perder de vista a complexidade da vida

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  2. Meu amigo. Alguma chance de me enviar dicas no Netflix.? Ainda no isolamento, sinto falta de bons filmes

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    1. Eu te recomendo o sesc digital cinema em casa, gratuito e com alta qualidade de filmes, tanto clássicos quanto recentes, atualizados todas as semanas .Netflix não acompanho.

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