domingo, 24 de março de 2019

INEZITA

Antonio Carlos Egypto






INEZITA.  Brasil, 2018.  Direção: Hélio Goldsztejn.  Documentário.  85 min.

Inezita Barroso (1925-2015) é uma figura portentosa na história da música popular brasileira. Portentosa parece um adjetivo apropriado para designar a cantora de voz firme, forte, afinada, de timbre marcante e presença exuberante, que descobriu e construiu um repertório de canções inigualável.  Samba, música folclórica, regional e, sobretudo, o caipira de raiz, são marcas do seu trabalho. 

Na TV por 35 anos, comandou o “Viola, Minha Viola”, programa da TV Cultura, dedicado à chamada música caipira de raiz, em que não cabiam guitarras elétricas, nem mesmo baterias e teclados.  E os astros do comercialíssimo sertanejo universitário não tinham vez, a menos que fossem cantar ou tocar suas violas no estilo tradicional.  Isso poderia dar a impressão de uma coisa conservadora ou intolerante, mas não se tratava disso e, sim, de preservação cultural, num espaço único, aberto pela comunicação de massa.  E que Inezita soube manter e solidificar ao longo de tanto tempo, na maior dignidade, até o fim.

Inezita Barroso, em sua vida pessoal e artística, foi uma pioneira, uma mulher que teve de abrir portas com dificuldades, numa época em que ser artista de rádio, atriz de cinema, como ela foi, era abominável para pessoas do sexo feminino, bem-nascidas, como ela.  Ao desbravar esses horizontes proibidos, ela abriu avenidas para que as mulheres pudessem se expressar artisticamente e ocupar os espaços devidos e merecidos, na música caipira e na arte em geral.




Ela foi mesmo muito ousada.  Sua primeira gravação já trazia a antológica “Moda da Pinga” (Marvada Pinga), que falava coisas como “aqui mesmo eu bebo, aqui mesmo eu caio”.  Imagine!  Foi a primeira a gravar “Ronda”, de Paulo Vanzolini, produtor do seu disco.  Foi em busca do folclore e das expressões musicais regionais por todo o país e cantou nossas maravilhas.  Alguns exemplos: “Lampião de Gás”, “Peixe Vivo”, “De Papo pro Á”, “Chico Mineiro”, “Azulão”, “Prenda Minha”, “Fiz a Cama na Varanda”, “Tristezas do Jeca”, “Maringá”, “Meu Limão, Meu Limoeiro”, “Luar do Sertão”, “Adeus, Minas Gerais”, para lembrar algumas belas interpretações dela.

O documentário “Inezita”, dirigido por Hélio Goldsztejn, com roteiro de Fábio Brandi Torres, faz jus à importância artística de Inezita Barroso e conta com participações que enriquecem sua história, com comentários, casos, relatos.  Lá estão Ruth de Souza, Eva Wilma, Nicette Bruno, Renato Teixeira, Ary Toledo, Wandi Doratiotto, Roberta Miranda, as irmãs Galvão, Zuza Homem de Mello, José Hamilton Ribeiro, o produtor musical Pelão, outros cantores e violeiros, a filha Marta e as netas Paula, Cristina e Fernanda, compondo um painel da vida e da obra de Inezita.

Podemos chamar esse documentário de chapa branca?  Talvez.  Mas é uma homenagem mais do que merecida a essa grande artista do nosso tempo, que nos deixou um legado impressionante.  É para aplaudir, mesmo!



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