segunda-feira, 15 de outubro de 2018

DICAS DA 42ª. MOSTRA


Antonio Carlos Egypto

Já posso comentar alguns filmes da 42ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que vai de 18 a 31 de outubro (mais alguns dias de repescagem, só no Cinesesc).

“Primeiro estranha-se, depois, entranha-se”, este foi o slogan genial que Fernando Pessoa (ou Álvaro de Campos) criou nos anos 1920, para lançar a Coca-Louca em Portugal.  O curta-metragem de apenas 27 minutos COMO FERNANDO PESSOA SALVOU PORTUGAL é uma pequena joia fílmica, que recomendo vivamente.  Direção de Eugène Green.


PEDRO E INÊS:O AMOR NÃO DESCANSA


Outro belo trabalho, também vindo de Portugal, é PEDRO E INÊS: O AMOR NÃO DESCANSA, de António Ferreira.  Quem não se lembra dos versos de Camões: “Estava linda Inês posta em sossego...” ou da expressão coloquial  “Agora é tarde.  Inês é morta”. Pois.  É da história e lenda de D. Pedro I e Inês de Castro, aquela que foi rainha depois de morta, que se trata.  Só que aqui, além de focalizar a apaixonada e trágica história de origem, ela se repete e se atualiza em dois outros contextos, um deles, no presente, dos computadores e celulares.  O filme transita entre esses contextos, ao longo da projeção, o que ressignifica e coloca novas soluções e possibilidades a essa trama de amor apaixonado e eterno que, de uma forma ou de outra, não tinha como não ser trágico.  A caracterização dos diferentes ambientes e situações de época é muito boa.  O elenco, tendo como protagonistas Diogo Amaral, Joana de Verona e Vera Kolodzig, sustenta dramaticamente a trama, com talento.  120 min.

O filme russo VERÃO, dirigido por Kirill Serebrennikov, trata das questões musicais e comportamentais que envolveram o rock soviético, no verão de 1981, em Leningrado, hoje São Petersburgo.  A influência dos grandes astros do rock ocidental impulsionou o surgimento de uma nova geração de artistas, que transformou a música jovem na Rússia soviética e trouxe novos padrões de comportamento libertário, mas encontrou resistência e repressão dos puristas e nacionalistas.  Na linha do que se deu no Ocidente, nos anos 1960.  Entre as polêmicas que o filme mostra, está um triângulo amoroso incomum e também contestador, à sua moda.  Um recurso muito bem utilizado é o da animação gráfica sobre as cenas, enfocando o que não aconteceu ou não podia acontecer, seria desejo reprimido ou delírio.  126 min, em preto e branco.

A CAÓTICA VIDA DE NADA KADIC, de Marta Hernaiz Pidal, da Bósnia Herzegovina, é um filme bem realista, que nos coloca em contato com uma mãe solteira perturbada por uma rotina massacrante, já que sua filha pequena, Hava, super ativa, exige uma atenção constante que desgasta Nada.  A busca de algum novo rumo ou uma tentativa de mudar de rotina a leva a uma viagem com a filha, em busca dos pais, que ficaram no passado.  As mulheres sempre assoberbadas pelas exigências maternais, que nem de longe atingem os homens, impõe a necessidade de se rediscutir a questão de gênero, em todos os cantos.  Não se trata de uma ideologia, mas de enfrentar a realidade dos fatos.  Esse filme, por suas características realistas, dialoga com outro bom trabalho que está em cartaz nos cinemas, fora da Mostra: é o filme húngaro “Um Dia”, de Zsófia Szilágyl, recém exibido no Indie 18.  Também trata da condição feminina às voltas com filhos que exigem um trabalho insano por parte da mãe. 


CULPA


Da Dinamarca vem um filme brilhante, CULPA, de Gustav Möller.  Uma narrativa de suspense muito bem conduzida, a partir da figura do policial Asger (Jakob Cedergen), que trabalha com chamadas telefônicas de emergência.  Ele se envolve com um caso complicado, que vai sendo revelado, pouco a pouco, por meio de seu atendimento telefônico, monitorado por computadores.  Tudo acontece,  nos envolve fortemente, mas nada é mostrado.  Um filme que se passa numa delegacia, praticamente com um só personagem, poderia ser a coisa mais tediosa do mundo.  No entanto, um roteiro muito rico de detalhes, o talento de um cineasta e do seu ator principal o transformam em cinema de alta qualidade, inovador, que faz pensar.  As conclusões que se tiram a partir de uns tantos dados podem ser enganosas e até produzir graves consequências.  E tudo pode ser feito com a melhor das intenções e com a real disposição de ajudar.  90 min.



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