Antonio Carlos
Egypto
IMAGENS DO ESTADO NOVO 1937-1945. Brasil,
2016. Direção: Eduardo Escorel. Documentário.
227 min.
Reavaliar o período da ditadura getulista do
Estado Novo, partindo de imagens, do período compreendido entre 1937 e 1945, é
um desafio que Eduardo Escorel encarou com sucesso, em seu documentário,
concluído em 2016. “Imagens do Estado
Novo 1937-1945” recolheu uma infinidade
de material, entre eles, filmes, tanto oficiais quanto particulares, que
registram esse período histórico conturbado do Brasil, quase todo ocorrendo em
meio à Segunda Guerra Mundial.
O problema é que os filmes disponíveis são os
do cinejornais (brasileiros e estrangeiros), documentários oficiais, registros
de eventos, festas e outras solenidades que, evidentemente, faziam propaganda,
escondendo todas as mazelas, excluindo todas as notícias negativas. E, na época, o tom era muito laudatório e
havia forte censura do chamado DIP, Departamento de Imprensa e Propaganda, de
inspiração nazifascista. Os vídeos pessoais ou familiares permitem observar
comportamentos, roupas, ruas, transportes, a cara e o jeito das cidades,
especialmente do Rio, capital do país, e das pessoas comuns. E, por outro lado, como se comportavam as
multidões que acompanhavam e aplaudiam
Getúlio Vargas pelas ruas, nos grandes eventos.
Tudo isso, por si só, já tem uma importância
história admirável e é apresentado em longos 227 minutos. Inclui, também, trechos de filmes, como “O
Grande Ditador”, de Chaplin, filmagens relativas à guerra mundial e a suas
negociações, além de filmes sobre os pracinhas brasileiros. Percebe-se a vastidão da aula de história que
isso comporta.
Eduardo Escorel escreveu a narrativa dessa
história, que é ilustrada pelas imagens, mas vai além dela, faz a crítica
histórica e política, revelando o outro lado das imagens e o que não está
nelas. Muitas vezes, o texto se descola
das imagens, não tem ilustração possível ou está tratando do macro, enquanto a
imagem mostra o micro. Ou o oficial e o
oficioso, o que não aparece, nem pode aparecer.
O documentário faz esse trabalho ao longo de
todo o tempo, não há entrevistas, comentários, análises feitas por
historiadores, políticos ou especialistas.
Há uma narração constante, articulada, que toma posição, mas dentro dos
limites do bom jornalismo, que dá preponderância total aos fatos. Inclui, ainda, registros em diário, que o
próprio Getúlio Vargas fez durante grande parte desse período.
O ditador que ficou também conhecido como o “pai dos pobres” realizou um governo ambíguo, de clara
inspiração fascista, nacionalista, mas gerando aqui o chamado trabalhismo, que criou e ampliou
direitos, como os da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), que duraram todo
esse tempo, até serem alvejados pela reforma trabalhista do governo atual, de
Michel Temer, o mais impopular da história do país.
Getúlio Vargas, ao contrário, era extremamente
popular, seus discursos alcançavam o povo e incomodavam segmentos da
elite. Depois de flertar com os regimes
nazista e fascista, de Hitler e Mussolini, a opção pelos Estados Unidos colocou
o Brasil no lado certo do conflito mundial e trouxe vantagens pragmáticas. As circunstâncias que envolveram as
negociações da guerra foram benéficas para a industrialização do país.
Só que democracia e liberdade não combinavam
com o regime do Estado Novo, que não resistiu à própria vitória na guerra. Enfim, contradições monumentais e circunstanciais,
semelhantes àquelas que o documentário “Imagens
do Estado Novo 1937-1945” teve de lidar
para extrair dos filmes oficiais a sua sombra, em busca de uma narrativa
crítica, capaz de informar e produzir reflexão.
A longa duração do filme recomenda sua fruição
em duas ou mais partes, para melhor aproveitamento do trabalho que é
apresentado, denso e fortemente informativo.
É possível assisti-lo integralmente, ou em duas partes, no cinema e há a
promessa de exibição na TV, em canais como o Curta! e TV Cultura.
Esse filme foi lançado no festival “É Tudo
Verdade”, de 2016. A nova edição desse
festival internacional de documentários, a 23ª., de 2018, já está
chegando. Será agora, de 12 a 22 de
abril, em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Voltarei ao assunto.
E
MAIS, NOS CINEMAS
O DIA DEPOIS, da Coreia do Sul, é mais um filme de Hang-Sang-Soo, talvez o mais
produtivo cineasta autoral em atividade no mundo. É um filme atrás do
outro. São filmes simples, geralmente com personagens conversando em torno da
mesa, comendo e, principalmente, bebendo, resolvendo conflitos. Portanto,
de realização rápida. Só que ele faz muito e faz bem. Ele sempre
encontra um clima apropriado para desenvolver suas histórias e um elenco que
convence, ao interpretar gente real, com quem cruzamos amiúde por aí.
Esta narrativa de infidelidade e engano é muito boa.
1945 |
1945, da
Hungria, dirigido por Ferenc Tórók, nos remete a um povoado húngaro que, com o
fim da Segunda Guerra Mundial, se sente ameçado em seu poder local e na posse
de bens, pela volta dos judeus sobreviventes da guerra. A filmagem, muito
boa, em preto e branco, remete ao medo, à ganância, ao conflito ético,
enfatizando que é o que está na cabeça das pessoas o que conta, não a percepção
da realidade objetiva.
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