Antonio Carlos
Egypto
ARÁBIA.
Brasil, 2017. Direção: Affonso Uchôa e João Dumans. Com Aristides de Souza, Murilo Caliari,
Renata Cabral, Gláucia Vanderveld, Renan Rovida. 96 min.
UMA TEMPORADA NA FRANÇA (Une Saison en France).
França, 2017. Direção e roteiro:
Mahamet-Saleh Haroun. Com Eriq Ebouaney,
Sandrine Bonnaire, Leónie Simaga, Aalayna Lys.
100 min.
O cinema dispõe de recursos poderosos para nos
trazer, reportar, realidades, que podem estar distantes de nós, não apenas por
meio de uma riqueza de informações, mas também com a carga emocional que a
situação apresentada requer. Bons
personagens, dentro de uma boa estrutura dramática, são capazes de nos levar a
viver a experiência de vida intensa e sofrida de pessoas que estão mergulhadas
em contextos sociais diversos dos nossos.
ARÁBIA |
O filme
brasileiro “Arábia”, por meio do personagem Cristiano (Aristides de Souza) e
seu diário encontrado após sua morte pelo jovem André (Murilo Caliari), nos
coloca em cheio na realidade do trabalhador operário no Brasil dos últimos anos
e da atualidade. Conhecemos sua
existência bem de perto, o que faz, como trabalha e se relaciona com as
pessoas, suas andanças e mudanças, desejos, esperanças, desilusões. Uma vida muito dura, penosa, mas enfrentada
com vigor e resignação. Emocionalmente
nos transportamos para um universo psíquico, que requer um equilíbrio precário
e difícil, como fator de sobrevivência, para além das circunstâncias materiais
propriamente ditas.
Quem nos conta sua vida no cotidiano é o
próprio personagem, na narrativa descritiva e também reflexiva de seu suposto
diário, escrito em linguagem simples, mas nem por isso menos elaborada,
enquanto dimensão humana. Os diretores evitaram a intelectualização da escrita,
mas a deixaram consistente e profunda.
Detalhada demais para a situação, talvez. É essa narrativa simples e forte que
conquista o jovem leitor, que vive no mesmo ambiente e nas mesmas condições de
penúria e vulnerabilidade.
“Arábia” é um nome estranho à narrativa do
filme. Refere-se apenas a uma piada
contada no bar, que ilustra uma percepção simplista de uma situação inusitada,
essa, sim, ligada ao contexto árabe. Mas
é um título que esconde o que é o filme.
Grande vencedor do Festival de Brasília,
premiado como melhor filme. ator, montagem, trilha sonora e prêmio da
crítica. Foi bem recebido e premiado em
muitos outros festivais internacionais, especialmente em competições latino-americanas.
UMA TEMPORADA NA FRANÇA |
“Uma Temporada na França” é o título irônico
de um filme que também nos leva a viver a dura realidade de um imigrante, Abbas
(Eriq Ebouaney), na França. Fugindo da
guerra civil na África Central, ele e sua família primeiro sofrem a perda da
esposa e mãe, numa perigosa travessia. Depois, vão enfrentar a rejeição do pedido de
asilo, a expulsão, a sensação brutal de ser indesejado.
Quem não se comoverá com o dia-a-dia do
professor de francês do Ensino Médio em seu país que, como imigrante, será
rechaçado? Seus dois filhos ainda pequenos
revelam as agruras psíquicas a que estão submetidos. Há, ainda, a solidariedade da branca
francesa, Carole (Sandrine Bonnaire), a evolução para o amor, mesmo em meio aos
fantasmas do rompimento recente trazido pela morte. Mas as leis de imigração são draconianas e a
burocracia, demolidora, capazes de produzir, até concretamente, a impotência
dos homens. E a gente sente na pele o
que passa esse imigrante africano que precisava de tão pouco para viver uma
vida digna. Bom trabalho do diretor
chadiano Mahamet-Saleh Haroun.
Experimentar essas realidades tão distintas
bem de perto, com envolvimento emocional, é algo que tem tudo para
sensibilizar, tornar mais acolhedor, desenvolver tolerância, diante daquilo que
é diverso do que conhecemos. Não porque,
intelectualmente, não tenhamos sido informados, mas porque outra coisa é estar
ao lado dos sofredores, compartilhar com eles os sentimentos, as injustiças, as
derrotas, a tragédia do cotidiano. Algo
que bons personagens, bons atores, bons roteiros e direção competente no cinema
podem nos oferecer.
FESTIVAL
SESC MELHORES FILMES
Chegou a hora do Festival SESC dos Melhores
Filmes do Ano de 2017. A edição 2018,
que é a 44ª. do Festival, acontece de 05 a 25 de abril, no Cinesesc – São Paulo. É
uma grande oportunidade para assistir a produções de qualidade valorizadas pelo
público e pela crítica, que podem ter escapado, em meio à grande quantidade de
lançamentos cinematográficos do ano que passou.
Em especial, em relação aos filmes de autor e do cinema brasileiro, que
passam meteoricamente pelo circuito cinematográfico. Com uma vantagem adicional: o preço módico
praticado pelo Cinesesc. A qualidade da
projeção e o som do cinema são impecáveis.
Alguns filmes clássicos também serão exibidos,
nada menos do que “ Cidadão Kane”, de Orson Welles, “Juventude Transviada”,
de Nicholas Ray, com James Dean, o “Blade Runner” original, de Ridley Scott, e
“Contatos Imediatos do Terceiro Grau”, de Steven Spielberg. Programação para não perder.
Nenhum comentário:
Postar um comentário