quarta-feira, 7 de março de 2018

TORQUATO NETO - TODAS AS HORAS DO FIM


Antonio Carlos Egypto




TORQUATO NETO – TODAS AS HORAS DO FIM.  Brasil, 2017.  Direção: Eduardo Ades e Marcus Fernando. Voz de Jesuíta Barbosa.  Documentário.  88 min.



A escolha do personagem Torquato Neto para o documentário de Eduardo Ades e Marcus Fernando não poderia ser mais feliz.  O poeta, que viveu pouco, mas teve intensa e profunda atuação cultural, estava mesmo precisando ser lembrado e resgatado em sua obra, que envolvia música, como letrista, cinema, como criador e intérprete, jornalismo, com seus textos e poemas, e a produção cultural, de modo geral.  Isso foi feito.

O filme resgata a poesia e a prosa de Torquato Neto, na voz de Jesuíta Barbosa, e compreende a sua atuação por meio de muitos depoimentos e trechos de filmes em que ele participou, com o personagem Nosferato do Brasil, sendo dirigido por Ivan Cardoso, e muitos exemplares do cinema marginal, com quem ele interagia, e do cinema novo.




Sua vida cultural envolveu trabalhos com Edu Lobo, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé, Jards Macalé, Wally Salomão, Hélio Oiticica, e muitos outros que compunham com ele a geleia geral brasileira do período em que ele viveu, entre 1944 e 1972. 

Esse piauiense tão talentoso, inovador e provocador, suicidou-se aos 28 anos de idade e falar da sua vida é, inevitavelmente, falar dessa escolha, que sempre o acompanhou como ideia e que ele acabou por concretizar.  Não há respostas, há tentativas de aproximação e entendimento.  O que importa hoje é a obra que ficou, que é muito relevante e merece ser revisitada.

Não faltam elementos, informações, referências visuais ao documentário “Torquato Neto – Todas as horas do fim”, mas ele seria mais interessante se tivesse se preocupado um pouquinho mais em ser didático, o que costuma ser mal visto pelos documentaristas atuais, mas que faz falta, muitas vezes.  E não é nenhum pecado mortal, convenhamos.






As falas, os depoimentos, são ouvidos quase o tempo todo, enquanto as imagens mostram filmes e fotos.  Algumas vezes, aparece o nome da pessoa que fala, outras, não.  Quem não identificar o tom de voz, fica sem saber quem está falando.  Caetano, Gil, Tom Zé, têm timbres bem conhecidos e divulgados, outros, nem tanto.  É possível dizer que o importante é o que se diz, não quem disse.  Mas, sem dúvida, o espectador quer saber e tem esse direito.

Outro aspecto que me incomodou foi a ausência de Edu Lobo, no filme.  A música de Torquato Neto que mais se ouve ainda hoje é “Pra Dizer Adeus”, parceria com Edu, tocada duas vezes no filme.  Porém, a única referência a Edu Lobo na vida de Torquato é uma foto, junto com outras pessoas, e o crédito na música citada, ao final.  Enquanto isso, Caetano e Gil aparecem prodigamente no filme.  Nada contra.  Mas há um descompasso que poderia ter sido pelo menos compensado por alguma citação, se é que Edu não pôde ou não quis dar depoimento para o filme.  Ficou faltando a sua presença, que certamente é menos provocadora, mas não menos importante.

O tropicalismo, movimento que Torquato Neto ajudou a criar e militou culturalmente, tem grande destaque no documentário e as imagens dele, no papel de vampiro, perpassam todo o filme.  As palavras que ele manejava como poucos inundam a tela.  Um resgate bonito e necessário.



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