quarta-feira, 26 de abril de 2017

VERMELHO RUSSO


Antonio Carlos Egypto


Martha Nowil e Maria Manoella junto ao cartaz do filme


VERMELHO RUSSO.  Brasil, 2016.  Direção: Charly Braun.  Com Martha Nowil, Maria Manoella, Michel Melamed, Soraia Chaves.  90 min.



O ponto de partida de “Vermelho Russo” é um diário de viagem escrito por Martha Nowil, contando a experiência que viveu junto com uma amiga, ambas atrizes, fazendo um curso sobre o famoso método de Stanislavski, em Moscou.  Podem-se imaginar as dificuldades de comunicação com um idioma desconhecido, elementos culturais bem distintos, o frio, as nevascas, e tudo o que faz da Rússia majestosa e algo assustadora.

Martha Nowil, que também é atriz do filme, escreveu com o diretor Charly Braun o roteiro de “Vermelho Russo”.  Eles foram alinhavando as experiências, acrescentando, criando, modificando, inventando coisas.  E assim saiu uma narrativa ficcional, que constantemente sofria mudanças.  Chegando ao ponto de que nem eles mesmos, que construíram a trama, sabem direito agora o que é documental e o que é ficcional.

Esse é o maior trunfo do filme, as coisas se mesclam de um tal modo que experiência e imaginação já não se distinguem.  O que nos remete à velha discussão do que é realidade e do que é fantasia.


Equipe de Vermelho Russo


Quem já viajou um pouco pelo mundo sabe que o que a lembrança retém do que foi vivido é algo muito seletivo.  Detalhes assumem uma importância que surpreende a nós mesmos, tempos depois.  Quando se compartilha a experiência, a partir de relatos orais, fotos ou filmes, algumas coisas crescem na imaginação, outras, desaparecem.  Situações um tanto desagradáveis podem ser esquecidas, para que se fique com o que foi o melhor de uma viagem turística, por exemplo. Ou aflorarem em importância, reforçando estereótipos e preconceitos, diante daquilo que é muito diferente de mim ou dos meus valores e costumes.

O que é real em tudo isso?   O que a gente acredita que seja, o que é compartilhado com os amigos como sendo verdade?  O que a gente repete tanto que acaba acreditando que é o certo?  Poderíamos ir longe nessa discussão, mas o que importa aqui é que histórias nascem, se desenvolvem e alimentam o nosso espírito.  Alimento tão essencial quanto aquele que nos nutre a vida material.

A história que “Vermelho Russo” nos conta é bem divertida.  Marta (Martha Nowil) e Manu (Maria Manoella) são as protagonistas que vivem a experiência moscovita, colaborando, sendo solidárias, competindo e brigando muito.  Ambas desempenham seus papéis com muita alegria de viver e muito próximas de si mesmas.  A Marta é vivida pela Martha, a Manu, ou Manuela, é vivida pela Maria Manoela.  Notaram a sutileza do h ausente na personagem de uma e do u em vez do o, na outra?  O ótimo Michel Melamed, que também tem um papel no filme, é Michel, aí desaparece a diferença.  De qualquer modo, eles não estão sendo eles mesmos, mas personagens próximos deles mesmos.  Enfim, um belo trabalho que, não por acaso, foi premiado como melhor roteiro, no Festival do Rio 2016.



Charly Braun


O diretor carioca Charly Braun, que já nos tinha dado um filme belíssimo, “Além da Estrada”, de 2011, todo rodado no Uruguai, agora faz “Vermelho Russo”, todo rodado na Rússia.  Ele sabe explorar bem esse clima de as pessoas estarem fora do seu ambiente natural.  Elas estão conhecendo, se surpreendendo, em busca.  As coisas têm frescor e juventude.  Têm leveza e profundidade.  Um cineasta talentoso, sem dúvida.



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