Antonio Carlos
Egypto
Quem pretende acompanhar a 40ª. Mostra Internacional
de Cinema de São Paulo terá de fazer uma programação do que mais lhe interessa
ver, em dias, horários e salas de cinema mais acessíveis. A dificuldade é grande, porque a oferta é
enorme: 322 filmes em inúmeros cinemas.
Nesse sentido, alguma indicação inicial pode ser útil, mesmo sabendo que
escolhas aleatórias também possam se revelar muito interessantes, embora
envolvam riscos. Dos filmes que já pude
ver da Mostra, aí vão algumas dicas.
O REI DOS BELGAS – um filme sobre a concepção de um
documentário, que vai se desenrolando à nossa frente, partindo de um registro
“chapa branca” da viagem do rei belga à Turquia, que se transforma numa
odisseia. Nela, o monarca se descobrirá
e ao seu mundo próximo. Em tom leve, de
comédia, com ótimos diálogos e uma trama inteligente, o filme do diretor belga
Peter Brosens é um belo trabalho.
O REI DOS BELGAS |
EU, OLGA HEPNAROVÁ – o filme tcheco, dirigido por
Petr Kazda e Tomás Weinreb, nos envolve
no mundo interno de uma jovem antissocial, agressiva, com comportamento
paranóico, que aprofunda suas incapacidades de se conectar com as outras
pessoas e se integrar à sociedade, ao não encontrar apoio ou estímulo para
isso. Belas sequências, fotografia em
preto e branco, enquadramentos e ângulos de filmagem caprichados, em ambientes
esfumaçados pelos cigarros, denotam a bruma em que está envolvido o tema.
ELLE – novo filme do diretor Paul Verhoeven, de quem
a Mostra também reexibe “O Quarto Homem”, que vale a pena ver ou rever. Em ELLE, o que está em jogo é uma sexualidade
violenta e complexa. Há muitas surpresas e uma estrutura bem montada de
suspense. E ainda tem Isabelle Huppert
como protagonista.
O filme francês O IGNORANTE, de Paul Vecchiali, trata
da complexa questão afetiva que envolve pai e filho, as mulheres à volta do
pai, uma obsessão, desejos incompreendidos, incapacidade de se colocar no lugar
do outro. Um bom trabalho na temática
psicológica das relações.
Da Colômbia vem um excelente filme, LA CIÉNAGA, ENTRE
EL MAR Y LA TIERRA, sobre um rapaz acamado, que sofre de uma desordem
neurológica, e das paupérrimas condições de vida que limitam suas
possibilidades de acesso a um tratamento mais adequado. Mas ele tem o afeto da mãe e de uma amiga de
infância e uma história que envolve seu pai e o mar. Narrativa forte e bem desenvolvida, que
desemboca numa decisão polêmica. Filme
concebido por Manolo Cruz e dirigido por Carlos Del Castillo.
LA CIÉNAGA |
NASCIMIENTO, também da Colômbia, é um bom filme, mas
de outro tipo, que pode agradar ou desagradar, dependendo do espectador. Quem aprecia filmes contemplativos,
rarefeitos, sem história, imersos numa bela natureza de rio e floresta, vai
curtir. O filme também mescla o
documental e o encenado, tendo como centro a gravidez em estado avançado e o
nascimento. A direção é de Martin
Mejía.
Da Argentina, dois documentários que podem ser vistos
com prazer. O FUTURO PERFEITO, um doc. encenado, em que uma chinesa sem saber uma palavra do idioma vai viver na Argentina
e constrói sua vida lá, a partir das palavras em espanhol que começa a aprender.
Chegará a vez do futuro perfeito? Filme de Nele Wohlatz. O outro é AS RUAS, que mostra numa pequena
cidade da Patagônia um trabalho escolar, revelando a história, as peculiaridades
e os personagens daquela aldeia. E que
acabará por nomear suas ruas, democraticamente, homenageando figuras da
localidade. O processo de aprender a entrevistar, a construção da pesquisa, o
papel da professora e o progresso dos alunos são o que mais interessa no filme. Direção de María Aparicio.
Do Chile, vi um filme que não para em pé. É fragmentação e cenas gratuitas, que não
chegam a nada: AS PLANTAS. Esse, claro, não recomendo. Passe ao largo, não vai perder nada.
O filme estadounidense O PLANO DE MAGGIE, de Rebecca Miller, interessa pelo modo como
lida com a questão de controlar as coisas.
Quem faz planos detalhados, para si e para os outros, pode se complicar
e quebrar a cara. Afinal, nada costuma
sair como o previsto. Mas há quem não se
emende e insista em novos planos e controles.
OS HEDONISTAS |
Indico também dois importantes curta-metragens,
trabalhos de dois grandes diretores: o iraniano Abbas Kiarostami, já falecido,
fez ME LEVE PARA CASA, 16 min, e o chinês Jia Zhang-Ke, OS HEDONISTAS, 26 min.
Procure incluí-los nos seus programas, se possível. São, para dizer o mínimo, curiosos nas suas
concepções: quem deve ser levada para casa é uma bola e a ironia dos hedonistas
é um trabalho num parque de diversões surreal, que aparece como esperança
derradeira a desempregados.
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