Antonio
Carlos Egypto
AUSÊNCIA.
Brasil, 2014. Direção: Chico
Teixeira. Com Matheus Fagundes, Irandhir
Santos, Gilda Nomacce, Francisca Gavilán.
87 min.
Todo mundo precisa de afeto, ao longo de toda a vida,
para poder viver bem consigo mesmo e com os outros. Os bebês, as crianças e os jovens, se nutrem
do afeto que recebem dos adultos para desenvolver autoconfiança e explorar suas
capacidades e possibilidades. Uma
família acolhedora é importante para o desenvolvimento do caráter e da
personalidade, em moldes saudáveis e criativos.
Na ausência dela, compensações são possíveis, claro. Mas o processo se dá de modo mais complicado.
A ausência do pai, a incapacidade de acolhimento da
mãe, condições sociais adversas, dificuldades econômicas, podem ser
ingredientes alimentadores de dramas, quando não de tragédias. É de uma realidade assim, de carências
fundamentais, que trata o filme “Ausência”, de Chico Teixeira.
O protagonista é o garoto Serginho (Matheus
Fagundes), de 15 anos, que, além de não encontrar o afeto básico de que
precisa, tem de se virar precocemente, para sustentar a família, o que inclui
cuidar de um irmão menor. O pai sumiu. A mãe vive à margem da vida, envolvida pelas
drogas, eventualmente pela prostituição e pela incapacidade de assumir a
condição materna ou o papel de provedor que toda família requer. Na vida de Serginho, a mãe Luzia (Gilda
Nomacce) é um zero à esquerda. Pior,
alguém que ele tem que suportar e escorar.
Os personagens jovens com quem Serginho convive,
enquanto trabalha na feira com um tio, são Mudinho (Thiago de Matos) e Silvinha
(Andréia Mayumi). Não é muito o que ele
pode extrair deles. As carências são
mais ou menos as mesmas. As limitações,
até maiores. Mudinho não tem esse nome
por acaso.
O tão necessário afeto que o menino busca pode estar
na figura de um professor aberto e acolhedor, Ney (Irandhir Santos), mas que
não quer assumir o papel paternal que Serginho espera dele. O atrativo do circo poderá ser uma tábua de
salvação diante da dramática constatação de que o garoto está só no mundo?
Essa bela temática é trabalhada no filme “Ausência”,
com delicadeza, sutileza e respeito pelos sentimentos dos personagens. De modo mais evidente, nos trazendo a figura
sofrida e solitária do adolescente Serginho, condenado a uma aridez de vida
terrível e despertando para a sexualidade e o direito ao prazer. Desencontrado, mas responsável como poucos o
são nessa idade. O jovem ator Matheus
Fagundes encontrou o tom certo para nos transmitir a realidade do
personagem. E tem no elenco coadjuvantes
de grande talento, como o ator Irandhir Santos, de muitos grandes papéis no
cinema brasileiro, a atriz Gilda Nomacce e a chilena Francisca Gavilán, atriz
de “Violeta Foi Para o Céu” (2012).
É um bom trabalho esse do diretor Chico Teixeira,
numa narrativa que está muito próxima do documental e centrada na questão do
afeto, focalizando um universo popular de conflitos e sofrimentos, que se
revelam tão verdadeiros porque se privilegia o mundo psíquico na abordagem. Os
personagens que vemos aí são pessoas humanas reais, que existem, que
reconhecemos.
“Ausência” venceu o Festival de Gramado 2015,
recebendo Kikitos de melhor filme – júri oficial, direção, roteiro e trilha
musical.
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E só para lembrar: “Chico, Artista Brasileiro”, o
filme de Miguel Faria Jr. que se destacou no Festival do Rio e na 39ª. Mostra
de São Paulo, já está em cartaz nos cinemas e é um programa imperdível. Uma homenagem brilhante a Chico Buarque, com
música de alta qualidade, muita informação e imagens de arquivo preciosas.
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