Antonio Carlos Egypto
ENTRE NÓS.
Brasil, 2013. Direção: Paulo
Morelli. Com Caio Blat, Carolina
Dieckman, Maria Ribeiro, Paulo Vilhena, Júlio Andrade, Martha Nowill, Lee
Taylor. 101 min.
O reencontro anos mais tarde de um grupo de amigos,
que se curtiam na juventude e se afastaram, é um tema que tem sido explorado
tanto na literatura quanto no cinema. Há
margem, mesmo, para muitas histórias diferentes.
No caso de “Entre Nós”, o novo longa de Paulo Morelli,
trata-se de um grupo de jovens, na faixa dos 20 e poucos anos, que tem em comum
o gosto pela literatura e pretensões a viver dela, seja como escritores, seja
como crítico literário. São sete amigos,
quatro rapazes e três moças, que passam um tempo juntos na casa de Silvana
(Maria Ribeiro), num paradisíaco recanto da Serra da Mantiqueira, em São
Francisco Xavier.
Há aspirantes a escritor terminando seus livros,
outros, tentando começar, muitas expectativas e muitos planos, sobretudo de
publicações, para o futuro. Cartas são
escritas para serem lidas bem depois, quando cada um poderá avaliar para si
mesmo e diante dos outros como as coisas se deram. Mas nem tudo sai muito bem, nesse período.
Ainda assim, o grupo manterá o combinado e se reunirá
quando já estiverem se aproximando da emblemática casa dos 40 anos, isto é, dez
anos depois. Reencontrar as pessoas e
suas aspirações passadas pode ser um desafio e tanto, diante das muitas coisas
que aconteceram e da tragédia que ocorreu naquele encontro original. O que fazer com as frustrações amorosas, os
fracassos e sucessos profissionais, as lembranças, tanto doces, quanto
trágicas?
Essa é a trama de um filme que se foca em personagens
de classe média, às voltas com seus dilemas e questões éticas importantes. Felipe (Caio Blat), escritor, e Lúcia
(Carolina Dieckman), agora casados e com um filho pequeno, Cazé (Júlio
Andrade), crítico literário, e Drica (Martha Nowill) também vivem juntos, mas
sem filhos, Gus (Paulo Vilhena) não se encontrou, nem na profissão, nem no
amor, e Rafa (Lee Taylor), um talento literário, já não está entre eles. Quanto à Silvana, andou pelo exterior e não
pensa em vínculos estáveis ou filhos.
O momento do reencontro é o ano de 2002, mas as
mulheres estão mais voltadas para o ambiente familiar, seja por não terem
conseguido realizar intentos literários, seja porque dão mais importância à
vida doméstica. Os homens se voltam para
a profissão e, quando falham, como no caso de Gus, se sentem inúteis. No filme, os comportamentos são abertos,
descolados até, mas, paradoxalmente, os padrões de gênero não estão
suficientemente avançados quanto à esfera pública. Em casa, os homens cozinham, arrumam as
coisas e tal, mas para as mulheres acaba sobrando a preocupação com os filhos
ou a ausência deles. No caso de Silvana,
que tem uma bela propriedade, é viajada
e independente, não fica clara a origem do seu dinheiro e alguma possível
atuação profissional. Riqueza
familiar? O fato é que, de um jeito ou
de outro, cada um tem seus segredos, esconde algo dos amigos ou até de si
mesmo.
“Entre Nós” faz pensar, é esteticamente bonito, tem
belíssimas locações e enquadramentos de câmera, cria suspense, reflete sobre
relacionamentos humanos e as consequências não só da passagem do tempo em si,
mas do que foi feito com ele a partir do que aconteceu antes. Tem um bom elenco, sobretudo feminino, e Caio
Blat vive o papel mais atormentado com competência.
Tem um bom mote que segura o interesse do filme:
cartas foram escritas e enterradas em 1992, para serem lidas dez anos depois, e
o significado delas, ainda que aparentemente pudesse ser banal, vai contar
muito quando forem desenterradas e lidas por seus autores. A carta de Rafa, que já não está ali,
especialmente. A história criada a partir
da pedra que marca o local do enterro
das cartas é um bom recurso narrativo, também visual. O espectador se mantém no suspense,
interessado pelo desfecho.
O argumento e o roteiro são do próprio diretor Paulo
Morelli e de seu filho Pedro, que atuou ainda como codiretor. Eles escreveram um drama sério e denso, mas
que inclui humor e leveza. Nem tudo está
tão claro ou bem amarrado, como conviria a uma história como essa, mas isso não
chega a atrapalhar a eficácia da narrativa, nem a capacidade de comunicação com
o público.
Nenhum comentário:
Postar um comentário