domingo, 4 de agosto de 2013
APENAS O VENTO
APENAS O VENTO (Csak A Szél). Hungria, 2012. Direção: Benedek Filegauf. Com Katalin Toldi, Gyöngyi Lendvai, Lajos
Sárkány. 86 min.
O filme húngaro “Apenas o
Vento”, que levou o Urso de Prata no Festival de Berlim 2012, trata de crimes
étnicos cometicos contra ciganos pobres e trabalhadores. Numa aldeia da Hungria, próxima de uma
floresta, vive uma população carente, em que o principal, e quase único,
símbolo de contemporaneidade é o celular.
No mais, falta tudo: condições de moradia dignas, comida, roupa,
atendimento à saúde. Há escolas,
aparentemente bem equipadas, que podem ser alcançadas por meio de caminhadas a
pé e percurso de ônibus. Mas nelas
parece faltar a presença de educadores atentos, a julgar por uma cena de
tentativa de estupro no próprio espaço escolar.
As pessoas se acomodam e se
adaptam como podem a uma vida de sofrimento e penúria, mas seguem vivendo. Ou seguiriam, se não houvesse um plano
incompreensível de eliminação de famílias de ciganos, que executa um a um de
seus membros, inclusive crianças e idosos.
Isso sem nenhum motivo ou razão aparentes e sem que nada se resolva, nem
se descubra ou se puna quem pratica tais crimes. Nem mesmo uma brigada de vigias da própria
comunidade cigana consegue impedir que os crimes sigam ocorrendo.
Com base nesses fatos
lamentáveis, o diretor Benedek Filegauf constrói uma abordagem fílmica
ficcional, que se centra numa família, dessas marcadas para morrer apenas pelo
fato de serem ciganas.
A mãe, chamada de Passarinha,
vive com seu pai inválido e dois filhos, um menino e uma adolescente, numa
rotina que envolve dois empregos de faxineira.
Isso exige que ela desperte ainda de madrugada, deixe sua família à sua
própria sorte, caminhe, ande de ônibus, faça o seu trabalho pesado e retorne à
noitinha, fatigada. Seu marido está em
Toronto, no Canadá, e há a perspectiva de que, quando houver algum dinheiro, a
família possa ir lá ter com ele. Se a
sentença de morte, latente, não se concretizar.
Vemos as andanças e problemas da adolescente Anna e, principalmente, do
menino Rói, que, em vez de ir à escola, perambula pela mata, faz pequenos
roubos nas casas das famílias dizimadas que ali moravam e descobre um
esconderijo onde possa ficar e deixar suas coisas.
Esses personagens e essa
situação em que se encontram nos são mostrados por câmeras que estão tão
próximas, que, em alguns casos, mal se pode distinguir o que está
acontecendo. Especialmente em cenas
escuras, como o despertar da Passarinha antes do nascer do sol, na casa sem
luz. Por outro lado, tal proximidade
traz a experiência de viver intensamente o que cada personagem experimenta. A dureza da vida é mostrada da maneira mais
concreta possível e a angústia que os cerca, de forma difusa, também.
É um filme muito eficiente no
propósito de realizar essa denúncia de crimes étnicos gratuitos que ficam sem
solução. Além dos preconceitos que
aparecem em diversas cenas, em que a agressividade e o destrato às pessoas
revelam que isso acontece apenas porque são ciganos. Mostrar ciganos sozinhos, e não em grupo,
cantando e dançando, também é uma forma de desconstruir o estereótipo a
respeito da etnia. A discussão tem um
alcance que não se restringe ao contexto húngaro ou só aos ciganos, se aplica a
todas as discriminações racistas.
O senão é que o filme é também
difícil, exige muito do espectador. Não
se preocupa em explicar ou tornar mais facilmente compreensível o que acontece
ou ao que se vincula cada cena ou situação mostrada. Produz um quebra-cabeças que vai fazendo
sentido ao nos mostrar uma realidade vivida pelos discriminados, os excluídos,
literalmente falando. Não é agradável
tolerar cenas sofridas, com muita miséria, lixo, escuridão. Mas que tudo isso mexe com a gente, e muito,
não há dúvida.
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