Antonio Carlos Egypto
CÉSAR
DEVE MORRER (Cesare Deve Morire). Itália, 2011.
Direção: Paolo e Vittorio Taviani.
Com Cosimo Rega, Salvatore Striano, Giovanni Arcuri, Antonio Frasca. 76 min.
Prisão
de segurança máxima Rebibbia, em Roma.
Os detentos serão convidados a se preparar e receber treinamento para
encenar o famoso “Júlio César”, de William Shakespeare, uma obra clássica de
grande envergadura e um desafio para qualquer ator. Que dirá para prisioneiros que, em muitos
casos, sequer tinham assistido a uma única peça no teatro?
Numa
prisão de segurança máxima, estão pessoas que cometeram crimes pesados e que,
em princípio, podem representar risco ao convívio social. Além disso, têm longas penas, até mesmo
prisão perpétua. Os irmãos Taviani não
se preocuparam com nada disso. Fizeram
testes com todos os interessados, que tiveram de se apresentar, utilizando
diferentes estilos e emoções. Nem sequer
texto havia. Aproveitaram todos,
selecionando os melhores para os papéis centrais, como o de César, Brutus e
outros.
O filme
“César Deve Morrer” relata o trabalho de preparação dos “atores”, a dedicação
deles aos papéis, a decoração das falas marcantes do texto de Shakespeare e,
sobretudo, o entusiasmo deles com esse trabalho e as mudanças que gerou nos
presidiários-atores. A partir de um registro de caráter documental, o filme
mostra, na forma ficcional, o que acontece por trás da trama da montagem
teatral.
É
impressionante observar como a experiência mexe com as pessoas. A ponto de que uma determinada parte do texto
não conseguiu ser expressa, apesar de decorada, porque o ator prisioneiro se
identificava com o personagem e se recordava de um vínculo que pôs à prova seus
conceitos e sentimentos. Para outro, a
mudança foi tão grande que ele expressou com uma frase genial todo o processo
mostrado pelo filme: “Agora que conheço a arte, esta cela tornou-se uma
prisão”.
Os
octogenários irmãos Tavianni, Paolo e Vittorio, são cineastas que já deixaram
sua marca na história do cinema mundial.
Basta lembrar alguns de seus melhores trabalhos, que atravessaram
décadas de dedicação ao melhor cinema: “Um Grito de Revolta” (San Michele aveva um gallo), de 1971,
“Kaos”, de 1974, “Pai Patrão”, de 1977, “A Noite de São Lourenço”, de 1981,
“Bom-Dia, Babilônia”, de 1986, “Aconteceu na Primavera”, de 1993, e “Afinidades
Eletivas”, de 1996.
“César
Deve Morrer”, novo trabalho deles, vencedor do Urso de Ouro no Festival de
Berlim 2012, faz jus à trajetória desses irmãos, que trabalham brilhantemente a
quatro mãos, há tanto tempo.
O
caminho de recuperar a autoestima e a dignidade das pessoas por meio da arte,
que o filme celebra, aponta para o que se pode construir de muito positivo,
mesmo em situações aparentemente desoladoras.
Criminosos trancafiados têm todo o tempo do mundo para evoluir. Se a
arte puder chegar até eles, podemos ter novas e fundadas esperanças. E o que quem vir o filme perceberá é que eles
podem ser atores competentes e dedicados, a quem as palavras de Shakespeare
podem inspirar e transformar.
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