sábado, 26 de março de 2011

VIPs

Tatiana Babadobulos

 VIPs. Brasil, 2010 Direção: Toniko Melo. Roteiro: Bráulio Mantovani e Thiago Dottori. Com: Wagner Moura, Jorge d'Elia, Gisele Fróes, Arieta Correia. 96 minutos
"VIPs”, novo trabalho do ator Wagner Moura, conta a história real de Marcelo da Rocha que, desde pequeno, gosta de imitar as pessoas e se faz passar pelos outros. Do Paraná, onde vive com a mãe, que é cabeleireira, pega o ônibus para Cuiabá, em Mato Grosso, a fim de aprender a pilotar avião, tal como o seu pai. No entanto, é a partir do trabalho que consegue no hangar como lavador dos aviões é que vai começar a escrever a sua própria história e não ter o futuro traçado como um “Zé Ninguém”.

Seu caminho para tirar o brevê (a carteira de piloto) não será a normal, como todos os pilotos o fazem. A certa altura, ele vai trabalhar para um traficante paraguaio e ser procurado pela polícia. Golpe após golpe, o maior de todos será se passar pelo empresário Henrique Constantino, filho do dono da companhia aérea Gol. No resort repleto de personalidades da televisão e do show business, ele vai ter de se virar para continuar sendo quem ele acha que é.

Para viver o protagonista, ninguém faria tão bem o personagem de mil facetas quanto Wagner Moura, que ultimamente tem se destacado no cinema no papel de capitão Nascimento, em “Tropa de Elite”. A fita, dirigida por Toniko Melo (da série “Som & Fúria”), é baseada no livro homônimo de Mariana Caltabiano. O roteiro, porém, tem assinatura de Thiago Dottori e do premiado Bráulio Mantovani que, entre outros, escreveu “Cidade de Deus”, dirigido por Fernando Meirelles, que aqui atua como produtor executivo ao lado de Paulo Morelli e Bel Berlinck.

Em entrevista coletiva concedida à imprensa, Toniko e Bráulio falaram sobre a adaptação. Segundo o roteirista, o personagem nasceu a partir da frase do verdadeiro Marcelo, quando disse que havia sido preso por não ter conseguido sair do personagem. “E daí fomos construindo as características de trás pra frente.” Características, aliás, muito psicológicas, a ponto de uma das principais plateias para a finalização do longa terem sido repletas de psicólogos, psicanalistas, psiquiatras etc.

De acordo com Toniko, só a história real de Marcelo não sustentaria um filme de duas horas. Por esse motivo, há muita ficção misturada. “As histórias reais normalmente são mais pitorescas. E aqui eu precisava de algo para fechar o arco dramático, ou ficaria apenas golpe atrás de golpe. No filme, demos um objetivo ao personagem, fizemos um cara que buscava alguma coisa.”

Com um orçamento de R$ 8 milhões, bem abaixo das últimas produções nacionais que beiram os R$ 20 milhões, Toniko Melo, em sua estreia em longas-metragens, consegue contar uma história real, mas com elementos ficcionais, sem perder a mão ou entediar o espectador. E Wagner Moura prova, mais uma vez, o grande ator que é, principalmente por conta dos seus 34 anos.

Quando leu o roteiro, o ator teve a percepção de que era alguém que estava procurando saber quem é. “Achei linda essa busca, porque é um menino brilhante e talvez não tenha conseguido canalizar esse talento para fazer algo bom”, pontua.

Wagner conta que se propôs a fazer um menino que quer ser alguém e não fazer o estelionatário. “Queria fazer todos os meus personagens assim, com essa honestidade.” O objetivo de Marcelo, portanto, é ser alguém na vida, correr atrás do seu sonho. E, como há muitas cenas no ar, mostrando o rapaz aprendendo a pilotar, o diretor conta que, no céu, apenas profissionais fizeram o voo. “Há cenas que nem um piloto comum seria capaz de fazer. Ali, quem pilota é alguém da Esquadrilha da Fumaça, um craque.” Mas a repórter não se contentou e quis saber: assim como seu personagem, Wagner Moura aprendeu a pilotar? “Sim. As cenas em que apareço taxiando, sou eu, assim como todas as outras no chão. Aprendi bastante coisa”, diz, achando graça.

Além do objetivo que ele tem na vida, o longa dá conta de mostrar como as pessoas são interesseiras, que buscam pessoas conhecidas para se enturmar, e querem estar onde está o dinheiro, o luxo, a mordomia. E também mostra como as coisas acontecem nos camarotes do Carnaval pernambucano com música eletrônica.
Apresentador Amaury Jr. fez uma participação especial no filme

Versatilidade
Versátil como poucos atores de sua geração, Wagner Moura mostra, em apenas um filme, que pode se transformar diversas vezes, mas sem perder o foco da história que está contando. Para se ter ideia, além de mostrar o tal piloto, e depois empresário, há uma sequência na qual ele interpreta uma canção da Legião Urbana, banda liderada por Renato Russo. Na trama, ele canta “Será?”, um dos primeiros sucessos da Legião. Wagner que, na vida real, tem uma banda, “Sua Mãe”, mostrou a dança igualzinha a de Renato. “Aquela no filme é a minha banda”, entusiasma-se. “Eu não perco a oportunidade de mostrar a minha própria banda”, completa.

De acordo com Bráulio Mantovani, o Marcelo imitava Bono Vox, vocalista da banda irlandesa U2. “Mas era muito caro, então fizemos a Legião Urbana, porque o Toniko tinha dirigido o primeiro clip da banda, que, inclusive, aparece no filme.”
Além de contar a história de Marcelo da Rocha, “VIPs” trata do relacionamento de pais e filhos, além da busca do garoto, já que quer ser alguém na vida. Para mostrar as diferentes fases do personagem, sempre vividas por Wagner Moura, a maquiagem é a responsável, principalmente pelo cabelo, que vai mudando com o passar dos anos.

O fato de a mãe do rapaz ser cabeleireira mostra o quanto ela valoriza a aparência e as celebridades das revistas, que cola no espelho do salão onde trabalha. Assim, aparecer ao vivo no programa de Amaury Jr., e se fazer passar por quem não é, significa que o rapaz quer aparecer para ela. O caso, porém, pode ser analisado por especialistas da área. O cinema trata de contar uma história. E que história!

No papel da mãe de Marcelo, a atriz Gisele Froes. “É impressionante como o olhar da mãe é essencial para mostrar quem a gente é”, pontua Wagner Moura. “O da personagem de Gisele é torto. Ele pergunta: 'Me diz quem eu sou'. Ela fica olhando e diz: 'Ah, você é assim...', e ele rebate: 'Assim como?' e muda de assunto. Essa cena me arrepia, é a melhor cena do filme para mim”, completa Moura.
A participação do ator argentino Jorge D'Elia, no papel do patrão paraguaio, também foi bastante festejada, tanto por ele quanto pelo elenco e diretor. “Se eu recebesse um prêmio na Argentina, seria mais um, mas receber um prêmio aqui foi algo extraordinário”, diz o ator, que recebeu o troféu Redentor durante o Festival do Rio. A fita venceu também nas categorias de Melhor Filme, Ator e Atriz Coadjuvante, além de outros festivais. “Cheguei a um lugar desconhecido e encontrei muitas pessoas. E então percebi que estava entre os melhores.” É verdade.
“VIPs” é uma história sobre o golpista, mas nada tem a ver com o “Prenda-me se for Capaz” ou “O Golpista do Ano”, pois, nessas duas, os golpes envolvem falsificações para arrecadar passagens aéreas ou dinheiro de seguro. Em “VIPs” os golpes são com pessoas da high society.

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