domingo, 16 de janeiro de 2011

O PRIMEIRO QUE DISSE

                                                      Antonio Carlos Egypto
O PRIMEIRO QUE DISSE (Mine Vaganti).  Itália, 2010.  Direção: Ferzan Ozpetek.  Com Riccardo Scamarcio, Nicole Grimaudo, Alessandro Preziosi, Ennio Fantastichini, Ilaria Occhini.  110 min.

Uma família tradicional italiana, da Toscana, dona de uma indústria de macarrão, tem papel de destaque na cidade.  Vincenzo (Ennio Fantastichini) é o patriarca, preocupado com a continuidade dos negócios da família.  Ele tem a seu lado o filho Antonio (Alessandro Preziosi) e espera contar também com seu outro filho, Tommaso (Riccardo Scamarcio).
Tommaso, no entanto, tem outros planos.  Acaba de retornar de Roma, onde cursou Letras, enquanto a família pensa que estudou Administração. Lá, já estabeleceu um vínculo amoroso forte com Marco, por quem é apaixonado.  Seu interesse agora é fixar-se em Roma e se livrar das obrigações familiares que o esperam. Resolve, então, sair do armário, ou seja, declarar sua homossexualidade, numa refeição familiar, certo de que será expulso de casa e, então, ficará livre para viver sua vida.
Mas as coisas não acontecem como o planejado.  E não é que seu irmão Antonio se antecipa e se declara gay antes dele?  O que fazer agora, já que Antonio foi, conforme o título brasileiro do filme, “o primeiro que disse”?
Esse é o mote de uma comédia que busca explorar as confusões, contradições, desinformações e preconceitos que cercam o tema da homossexualidade.  E acaba por descobrir que nem tudo é tão nebuloso assim.  Quem está menos centrado em si mesmo, observa, percebe e pode entender o que se passa.  Bem, não é o caso do pai Vincenzo, que combinará sofrimento real com muita teatralização, para tentar lidar com o assunto no plano pessoal, familiar e nas relações com a comunidade.
A questão não é só a da homossexualidade posta em evidência, mas a dos desejos não realizados, dos sonhos abafados, do jogo de aparências.  E, brincando, a trama do filme vai mexendo nesses pontos sensíveis da experiência humana. 
É quando um personagem que nem nome tem, a avó, vivida por Ilaria Occhini, emerge como a figura mais densa e humana de toda a história.  Ela, que viveu toda uma vida, trabalhando ao lado de seu amado, mas casada com o irmão dele, entende de desejos sufocados, sublimados, deslocados.  E sabe o valor que tem um sonho a ser perseguido.
Se Tommaso pode contar com alguém, é com ela, não só para viver o seu amor proibido, mas para realizar o seu imenso desejo de ser um escritor, e com romance publicado.  Para ela, o macarrão, que aprendeu e ensinou a fabricar, foi um objeto de puro amor, mas ela entende que Tommaso rejeite o macarrão para ser escritor.  Cada um com seus amores.
“O Primeiro que Disse” resulta sendo um filme bem construído, com cenas bem elaboradas, que conseguem imprimir um espírito libertário e humanista à trama e aos seus personagens.
O elenco é muito bom e dá bem conta do recado, com destaque para Ilaria Occhini: a avó que ela cria é um primor de interpretação.  Ricardo Scamarcio transmite bem os sentimentos de Tommaso, num registro sutil e convincente.  Nicole Grimaudo é Alba, a tentação feminina ao lado de Tommaso, na fábrica.  E que tentação: é uma mulher lindíssima, de rosto perfeito.  E também boa atriz.  Alessandro Preziosi e Ennio Fantastichini também estão bem nos seus respectivos papéis, o primeiro, mais discreto e contido, como convinha ao personagem, enquanto o pai se apresenta histriônico, já que o personagem pedia muita teatralidade.
Isso tudo dá ao filme o clima de que ele precisa para fazer rir, fazer pensar.  Sem ser uma comédia que produza intensas gargalhadas, nem ser um filme que alcance grande densidade ou profundidade, o resultado é bom e o filme, simpático.

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