O cinema argentino já conquistou bom público no Brasil e isto não é mais novidade. Há uma mostra do novo e do novíssimo cinema argentino no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo. Vale a pena conferir.
Em sessões regulares nos cinemas, temos boas novidades. “A Teta Assustada”, que vem do Peru, e “Gigante”, do Uruguai, exibem fôlego para mostrar que nem só de Brasil, Argentina e México vive o cinema latino-americano.
A TETA ASSUSTADA (La teta asustada). Peru, 2009. Direção: Claudia Llosa. Com Magaly Solier, Susi Sánchez, Efrain Solis, Marino Ballón e Antolin Prieto. 95 min.
A cinematografia peruana é escassa e raramente chega até nós. “La Teta Asustada”, em compensação, vem com nada menos que o Urso de Ouro no Festival de Berlim. As marcas da luta política e do terrorismo deixam saldos imprevistos. As mulheres são vítimas de estupros e desenvolvem uma rara doença que se transmite pelo leite materno: a teta assustada. Faz sentido? Por que não? Realisticamente falando, tal doença não existe, especialmente com transmissão pelo leite. Mas essa pode ser uma doença da mente, do espírito, do desencanto com a vida e com os homens.
A protagonista, a bela Fausta (Magaly Solier) ainda estará às voltas com o cadáver insepulto da própria mãe que lhe passou a tal doença e exibirá ao longo de todo o filme uma depressão que beira a catatonia. É uma mulher dilacerada pela perspectiva do estupro iminente e inevitável. Quem sabe uma batata poderá salvar-lhe a honra... Num ambiente de grande pobreza e que dá muito valor às cerimônias de casamento, ela vai suportando a vida sem esperanças.
O filme mostra esse quadro e nos remete à realidade social do país e suas marcas, sem se ancorar no realismo e também sem adotar a forma fantástica, pura e simplesmente, mas sendo uma forte alegoria expressiva, com cenas que nem sempre completam um todo, mas são cheias de significado.
O contraste entre a vida da patroa e a da empregada que precisa enterrar dignamente sua mãe é mostrado por ambientes opostos: com muita vida e movimento na pobreza; em grandes espaços, tempos mortos e pérolas que se espalham e se contam na casa dos ricos. O medo do estupro se encontra com o medo que se esconde sobre muros e portões que deixam o povo lá fora. A incapacidade de relacionamento que se constrói sobre a ferida deixada pelos estupradores de um passado recente, a crença no poder das almas dos mortos, tudo isso compõe um painel expressivo que surpreende, embora a trama central fique evidenciada desde o início do filme. Difícil ficar indiferente a essa “Teta Assustada” da diretora Claudia Llosa.
GIGANTE (Gigante). Uruguai, 2009. Direção: Adrián Biniez. Com Horácio Camandule, Leonor Svarcas, Fernando Alonso, Diego Artucio e Fabiana Charlo. 90 min.
Após o ótimo “Whisky”, nos chega do Uruguai este “Gigante”. E quem é o gigante? Jara (Horácio Camandule), um homem gordo, forte, tímido e infantilizado, que trabalha como segurança em um supermercado, com direito a complementos na segurança de casas noturnas. Apartar brigas ou evitar roubos, controlando o comportamento dos empregados do supermercado, por meio de câmeras, é tudo o que ele faz, quando não está jogando videogames, vendo TV ou fazendo palavras cruzadas.
E quando ele começa a se encantar com uma faxineira no trabalho como haverá de se comportar? Ele não sabe o que fazer, mas procura segui-la e usa o poder que tem sobre a câmera, que vigia todos.
O assunto é banal, ainda que dê margem a alguma discussão sobre o quanto estamos controlados pelas câmeras na contemporaneidade. Mas é da fragilidade humana desse personagem, de seus tempos longos de observação, hesitação e dúvida, que se alimenta o filme, que acaba se tornando intrigante e um tanto misterioso e que seduz pelo minimalismo e pela simplicidade. Em tempos de overdose de ação e efeitos especiais em profusão, é um contraponto cinematográfico muitíssimo interessante.
“Gigante” também foi premiado em Berlim, com o Urso de Prata (grande prêmio do júri).
“Gigante” também foi premiado em Berlim, com o Urso de Prata (grande prêmio do júri).
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