terça-feira, 18 de agosto de 2009

AGOSTO NOS CINEMAS

Antonio Carlos Egypto




Agosto para nós é inverno, onde imperam as gripes e resfriados. Este, então, trazendo uma nova e preocupante gripe, que até adiou o tradicional início das aulas do 2º semestre do ano.

Agosto é, portanto, hora de retomar os estudos, fim das férias. E agosto é, ainda, um mês cheio de desgraças na nossa história política. Na contramão desses sentimentos pouco animadores, o cinema nos brinda com dois belos filmes sobre o mês de agosto, vindos da Europa, onde o verão esquenta os corações e põe as pessoas na rua, em festas e comemorações.


ALMOÇO EM AGOSTO (Pranzo di Ferragosto). Itália, 2008.
Direção: Gianni Di Gregório. Com Gianni Di Gregório, Valeria di Franciscis, Marina Cacciotti, Maria Cali, Grazia Cesarini Sforza. 75 min.

É num feriado tradicional de 15 de agosto que se situa “Almoço em agosto”, uma reconfortante comédia, afetiva e otimista, que propõe que aquilo que parece ser um grande problema pode acabar se tornando uma solução. Tudo depende de como a gente encara a vida e como se desincumbe das surpresas que ela nos coloca.

Gianni, o personagem, ator e diretor do filme, vive na penúria com sua mãe já bem idosa, que nem sequer se dá conta do quanto exige dele, apesar de ser uma figura gentil e educada. Ele não consegue, não pode ou não quer trabalhar e as dívidas se acumulam. É essa circunstância que dará margem à situação de multiplicar as mulheres idosas que estarão ao seu cuidado no tal feriado e que acabarão por ser não mais a multiplicação dos problemas, mas a sua solução. Quem poderia imaginar? A receita envolve dedicação, espírito de sacrifício, capacidade de lidar com afetos e, sendo um filme italiano, é claro que a boa comida, uma bela massa, um peixe saboroso, vão fazer toda a diferença.

Tudo é mostrado com singeleza e sem escamotear os conflitos. Ao contrário, eles são explicitados e, apesar de pequenos, suficientemente angustiantes para a situação. Harmonizar mulheres idosas com suas manhas e manias, num mesmo ambiente, sem que tudo desmonte, exige habilidade. Não é uma situação fácil, nem simples de lidar. Basta lembrar questões de saúde, como a administração de remédios, bem como dietas ou restrições alimentares, inevitáveis nestas personagens. Elas são, porém, gente muito capaz de usufruir da vida e isso acaba sendo muito mais importante do que as limitações da idade. Cada uma, à sua maneira, vai se revelando ao longo da narrativa. E o filme, oportunamente adequado nos seus 75 minutos de duração, nos brinda com um humanismo que tem estado pouco presente no cinema contemporâneo, que vai da descrença ao ilusionismo com muita facilidade nos dias complicados em que estamos vivendo.


AQUELE QUERIDO MÊS DE AGOSTO. Portugal, 2008.
Direção: Miguel Gomes. Com Sonia Bandeira, Fabio Oliveira, Joaquim Carvalho, Andréia Santos, Arnaldo Nunes. 147 min.

Em agosto, no interior de Portugal, em meio às montanhas, o mês se enche de atividades. Muita música, dança, fogos de artifício, gente que se atira das pontes, caça javalis e bebe cerveja. Comemora-se o verão com muita festa, gente por todo o lado, muitas paixões aparecem e sempre alguma excentricidade.

É esse clima de festividade que “Aquele querido mês de agosto” compartilha com os espectadores. Trata-se de festas populares e nem sempre a música é de boa qualidade, mas a alegria é permanente e contagia.

Aí se dará o trabalho de uma equipe cinematográfica que, querendo captar todo esse clima, quer contar uma história de amor e, para isso, precisa encontrar tanto os personagens como os atores e até a própria história.

Desta mistura entre o que se documenta e a ficção que se prevê, surge um filme que se insere na festa como algo inevitável, a que ninguém conseguirá opor resistência. A história de ficção está de alguma forma dada por figuras de uma banda musical e, a certa altura, já não se sabe o que é componente indissociável das festividades e o que é encenação cinematográfica. A verdade é que pouco importa, no fluir da festa a vida se impõe, por vezes estranha, bêbada ou tresloucada, mas é em busca de sensações alimentadas pela música popular que o povo se alegra e se permite viver os seus prazeres.

Como espectadores, testemunhamos tudo isso, conhecemos uma parte da música e das danças populares de Portugal que não costumam chegar por aqui e nos regozijamos com a vida que transborda da tela. Belo exemplo de cinema que nos dá Portugal, do grande mestre Manoel de Oliveira, com seu conhecimento e sua erudição admiráveis. Mas nem só dele vive o cinema português, nem só de uma melancolia que tradicionalmente invade os ares lusitanos. Miguel Gomes nos traz a beleza das tradições da festa e dos caminhos que entrelaçam documentário e ficção, neste empolgante “Aquele querido mês de agosto”, merecido prêmio da crítica na 32ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Visto do verão europeu, por meio do cinema, agosto já não é só o mês do cachorro louco.

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