sábado, 11 de outubro de 2025

BUGONIA E OUTROS NA MOSTRA 49

  Antonio Carlos Egypto

 

Bugonia

BUGONIA.  Reino Unido.  Direção: Yorgos Lanthimos.   Com Emma Stone, Jesse Plemons, Aidan Delbis, Stavros Halkias, Alicia Silverstone.

 Quem conhece algum dos filmes do cineasta grego Yorgos Lanthimos, como “Pobres Criaturas” (2023) ou “Dente Canino” (2009), sabe que o cinema que ele cultiva é insólito.  Situações, conceitos, comportamentos improváveis, constituem as sequências que compõem o filme, não necessariamente encadeadas.  Mas cujo sentido revela-se no conjunto.  “Bugonia”, em especial, é um filme bem estruturado e organizado dentro desse caráter insólito.  Ao mesmo tempo em que nos provoca e nos deixa confusos e perdidos em relação ao que se passa, fica muito claro qual seja sua pauta.  A história da CEO de uma grande empresa que é sequestrada por dois personagens estranhos que acreditam, firmemente, que ela é uma alienígena, nos remete a teorias da conspiração, fake news, crenças fanáticas e mirabolantes, mas também à sensação de finitude da humanidade no planeta Terra.  De maluca esta questão não tem nada.  De fato, estamos cavando nosso fim e isso é assustador.  As abelhas, que estão sendo exterminadas, são um elemento central dessa história e ocupam um papel importante na trama de destruição a que estamos submetidos.  Será pura incompetência dos humanos ou envolveria ações decisivas vindas de fora do planeta?  Parece apenas delirante, mas tem tudo a ver com o que estamos vivenciando na contemporaneidade.  E dá muito o que pensar.  O roteiro é divertido, criativo e bem concebido, em que pese toda a estranheza.  O elenco é muito eficaz para criar o clima do filme.  Especialmente Emma Stone, que já trabalhou com o diretor e levou o Oscar de atriz, mostrando seu enorme talento em “Pobres Criaturas”.  Aqui ela está ótima também.  Para curtir e gostar de “Bugonia” é preciso entrar no clima, sem preconceito.  O resultado compensará o espectador.  120 min.

 

Cabelo, Papel, Água

CABELO, PAPEL, ÁGUA é um documentário poético vietnamita.  Dirigido por Nicolas Graux e Truong Minh Quy.  Coprodução belga e francesa.  Focaliza uma mulher septuagenária que nasceu numa caverna e vive num vilarejo envolta pela natureza, pelos elementos básicos da existência e da sobrevivência, mas sai para ir a Hanói ajudar sua filha no parto e com o bebê.  Descobre uma cidade imensa, que a confunde, onde as pessoas têm dificuldade para lidar com necessidades básicas, como a alimentação e o trabalho.  Isso a faz sonhar com suas origens e voltar a elas em busca de paz e felicidade, enquanto seu idioma natal, o ruc, está em vias de se extinguir.  Filme bonito, contemplativo, que explora não uma trama, mas uma realidade sensorial.  71 min.

 

Duas Vezes João Liberada

DUAS VEZES JOÃO LIBERADA, da diretora portuguesa Paula Tomás Marques, trata da realização de um filme sobre uma figura perseguida pela Inquisição no século XVIII, por sua inadequação de gênero.  Ou seja, um caso de transexualidade, quando esse conceito ainda não existia.  Nem o de gênero.  Mas o que se tem de registro oficial sobre a personagem real Liberada é aberto e incompleto, dando margem a que essa biografia possa ser contada de muitas formas, enfoques, representações.  É sobre a construção da personagem, as filmagens, as diferenças entre a concepção do diretor e da atriz lisboeta João que a representa, as escolhas que vão sendo feitas, os conflitos.  A própria mistura entre o que se filma e o que se vive, os impasses que paralisam o filme põem em evidência concepções de mundo, percepções distintas e a técnica cinematográfica intermediando a expressão de tudo isso.  O ato de fazer cinema é explicitado de forma bem interessante, como algo sempre in progress.  Inseguro, incerto, aberto sempre. Com perguntas sem respostas.  Um constante vir a ser.  70 min.   (Da Competição Novos Diretores, para aqueles que estão no primeiro ou segundo longa-metragens.)

 

Corpo Celeste

CORPO CELESTE, produção do Chile, dirigida por Nayra Ilic García, focaliza a figura da jovem Celeste, de 15 anos, em bela viagem a uma praia próxima do icônico deserto de Atacama, cuja experiência virá a tornar-se traumática para ela e para a família.  Quando retorna ao Atacama, atraída por um eclipse solar, tudo já está mudado nela, nas pessoas com quem ela conviveu e no lugar.  A ditadura de Pinochet já terminou, mas suas marcas afetam tanto esse lugar e o país como as vidas, entre elas, a de Celeste, em busca de se encontrar.  Belas locações, mas uma narrativa algo dispersa e fria, que não chega a envolver os espectadores. 97 min. (Também faz parte da Competição Novos Diretores).

@mostrasp

#49mostra



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