sexta-feira, 26 de setembro de 2025

MALÊS e MULHERES

 Antonio Carlos Egypto

 


MALÊS, dirigido por Antonio Pitanga, retrata a revolta dos escravizados em Salvador, em 1835, que é pouco conhecida e estudada.  A Revolta dos Malês foi a maior insurreição do gênero, na história do Brasil.  E parte de dois jovens muçulmanos, arrancados de sua terra natal na África, em pleno casamento, vendidos como escravos no Brasil.  A presença da crença muçulmana e a língua e a tradição árabes presentes na história são mais um dado relevante que precisa ser melhor conhecido.  O filme é ágil, emocionante e muito bem realizado. No elenco: Camila Pitanga, Rocco Pitanga, Antonio Pitanga, Samira Carvalho, Patrícia Pillar, Edvana Carvalho, Bukassa Kabenguele.  113 min.

 




MULHERES

Cinemateca Brasileira, Festival do Rio e Forum des Images de Paris promovem intercâmbio de filmes com foco em realizadoras mulheres. A programação faz parte da temporada França-Brasil 2025.

De 30 de setembro a 10 de outubro, a Cinemateca Brasileira em São Paulo exibirá 13 filmes de diretoras francesas, com a presença de algumas delas nas sessões, incluindo inéditos, como “Diga a Ela que a Amo”, de Romane Bohringer, que ainda nem foi lançado na França.  No Festival do Rio, as exibições ocorrerão de 02 a 06 de outubro, na Estação NET Rio, em Botafogo.  As sessões contarão com legendas em português, tanto lá como cá.

Em contrapartida, o Forum des Images realizará, em Paris, uma mostra de 12 documentários de diretoras brasileiras, como “Passaporte Húngaro” e “No Céu da Pátria Nesse Instante”, de Sandra Kogut, que estará presente, dialogando com o público local.

A mostra das diretoras que ocorrerá na Cinemateca é gratuita e é apenas mais uma entre constantes realizações que envolvem exibições de clássicos do cinema brasileiro, filmes irlandeses e de diretores japoneses, como Ayakashi: O Japão das Criaturas Místicas, que acontecem neste fim de semana por lá.



 

quarta-feira, 17 de setembro de 2025

SR.BLAKE e +

Antonio Carlos Egypto

 


 

SR. BLAKE AO SEU DISPOR (Complètement Cramé).  França, 2023.  Direção: Gilles Legardinier.  Elenco: John Malkovich, Fanny Ardant, Émilie Dequenne, Philippe Bas, Éugenie Anselin.  110 min.

 

John Malkovich, Fanny Ardant e um castelo francês imponente como locação já parecem ser um atrativo suficiente para levar público aos cinemas.  A trama de “Sr. Blake ao Seu Dispor”, uma comédia de erros leve, no entanto, pode frustrar quem buscar algo além de sorrisos e entretenimento despretensioso.

 

Mr. Blake (John Malkovich), um cavalheiro britânico, empresário, se sente perdido e desinteressado pela vida, desde a morte de sua esposa francesa, e por nostalgia resolve viajar para o local onde a conheceu no passado.  Mas, enganos fazem com que ele, para poder ficar lá, tenha de aceitar um emprego de mordomo, totalmente inusitado. Ele aceita um período de “experiência” nesse trabalho que, curiosamente, se alonga.  É o que permite que ele conviva com os personagens da história. 

 


A começar por Madame Beauvillier (Fanny Ardant), também viúva, a excêntrica dona da mansão arruinada financeiramente, que pensa em alugar quartos para hóspedes no castelo ou terá de vender a propriedade.  Conhece Odile (a ótima atriz Émilie Dequenne), a cozinheira durona, que o recebe com regras e exigências.  Conhecerá, ainda, o caseiro Magnier (Philippe Bas), sua companhia masculina, e a jovem empregada Manon (Éugenie Anselin).

 

O que se dá é que todos esses personagens estão tão desencontrados como ele, o que permite ao filme criar situações curiosas, às vezes dramáticas ou românticas, além dos desencontros entre hábitos e linguagens franceses e britânicos que se evidenciam.

 

O problema é que tudo fica na superfície.  Os personagens não têm densidade, não são aprofundados.  E também fica evidente, desde o início, que de um modo ou de outro se entenderão com a ajuda do sr. Blake.  E ele próprio, claro, ao interagir com eles, também fará suas descobertas e se renovará.

 

MOSTRA KORE-EDA




Um programa imperdível é a Mostra do Cinema de Hirokazu Kore-Eda, o mais importante diretor de cinema japonês da atualidade, que vai até 05 de outubro em São Paulo.  A Mostra acontece no CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil, com ingressos gratuitos, e no Cinesesc, com ingressos pagos.  Estão sendo exibidos 28 filmes, além de um curso sobre o cineasta.

bb.com.br/cultura

 

BRASIL NO OSCAR

O cinema brasileiro definiu seu representante na disputa do Oscar de filme internacional.  Como se esperava, coube a O AGENTE SECRETO, de Kleber Mendonça Filho, estrelado por Wagner Moura, esse papel.  Tudo indica que tem boas chances de êxito.  E a safra de filmes nacionais anda entusiasmante.  Vamos torcer pelo filme, que já brilhou em Cannes, na busca de um novo Oscar para o Brasil.



sábado, 13 de setembro de 2025

A VIDA DE CHUCK

Antonio Carlos Egypto

 


A VIDA DE CHUCK (The Life of Chuck).  Estados Unidos, 2024.  Direção: Mike Flanagan.  Elenco: Tom Hiddleston, Chiwetel Ejiofor, Karen Gillan, Mark Hamill, Jacob Tremblay.  111 min.

 

A chamada que consta do pôster de “A Vida de Chuck” é muito representativa do que é o filme.  Ela diz: “Cada vida é um grande universo”.  Tudo que faz parte do universo está contido na vida de cada um, que é uma experiência única e admirável.  O filme de Mike Flanagan, baseado em conto homônimo de Stephen King, explora bem isso.  Tudo importa e contribui para o plano geral da existência.

 

O filme começa a contar a vida de Chuck pelo terceiro ato, ou seja, pelo final, quando o declínio de sua existência é refletido na vida de toda a humanidade, que se esvai a olhos vistos.  Ocorre que aqui o filme explora o final dos nossos tempos coletivamente falando, também.  E nisso é absolutamente admirável.

 

Todos sabemos que nossa vida está em perigo neste planeta e que a deterioração é progressiva e assustadora.  Negacionistas à parte, tentaremos sobreviver como, se não conseguirmos realizar a reparação indispensável de nossas condições de vida no planeta Terra?  Queremos crer que esperança ainda há e na undécima hora encontraremos um caminho.  Pode ser.

 

O segundo ato, que vem depois do terceiro, por sinal, é pura esperança.  Celebra a vida ou a parte da experiência que vale por toda ela.   Representada pela dança, maravilhosa, contagiante, que um homem comum desenvolveu ao longo da vida, de forma complementar, marginal.  E, no entanto, é isso que vale a pena.  E que tem caráter reparador.

 


Voltando no tempo, a terceira e última parte é o primeiro ato, a evolução da vida de Chuck desde a infância com os avós, seus lutos, suas perdas, suas descobertas, os mistérios e até as premonições de sua morte precoce, aos 39 anos.  Obrigado, Chuck, por tudo o que fez e viveu por esse tempo aqui.  É algo de que não se pode esquecer, nem negligenciar.  Ou seja, o final terrível foi precedido pela celebração da experiência de viver.  Com todos os percalços e sofrimentos, mas também com muitos encontros e muito amor.  O amor é o recheio da dor.

 

Para quem associa sempre Stephen King ao terror, é um trabalho de muita beleza o que se vê no filme de Flanagan, que também já adaptou vários outros textos de King.  Aqui, o terror não é o tom.  A produção é de primeira categoria, o elenco, muito bom, tudo flui muito bem. O tom afetivo da vida é o que predomina.  

 

Um filme que marca, emociona, transforma o simples, o banal, o ordinário, em extraordinário e universal de uma forma muito interessante e curiosa.



sexta-feira, 5 de setembro de 2025

MOSTRA DE CINEMAS NEGROS

 

  Antonio Carlos Egypto

 




Está em andamento no Cinesesc e em diversas unidades do SESC-São Paulo, capital, litoral e interior, em sua 4ª. edição, OJU – Roda Sesc de Cinemas Negros.  Estão sendo exibidos 15 longas metragens e 10 curtas, além de palestras, debates, rodas de conversa, sobre as criações negras e sua grande relevância no cinema brasileiro da atualidade.

 

Entre os longas que já tive a oportunidade de ver eu destacaria 3 documentários magníficos, que põem em evidência figuras geniais da música brasileira.  “Milton Bituca Nascimento”, de Flávia Moraes, crítica já publicada aqui no cinema com recheio em 18 de março de 2025; “Luiz Melodia – No Coração do Brasil”, de Alessandra Dorgan, comentário postado em 16 de abril de 2024 e “Jackson na Batida do Pandeiro”, de Marcus Villar e Cacá Teixeira, em nota de 21 de julho de 2023.  A ficção “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal, também foi objeto de crítica aqui, em 30 de janeiro de 2025.  Além deles, meu grande destaque para a ficção “Malês”, dirigida por Antônio Pitanga, comentada aqui em 06 de novembro de 2024.  Nessa mesma postagem, comentei outro documentário espetacular, “3 Obás de Xangô”, de Sérgio Machado, enfocando Dorival Caymmi, Jorge Amado e Caribé, que não está nesta Mostra, mas entrou em cartaz nos cinemas, depois de ser exibido em mostras e festivais anteriores.  E é mais um exemplo virtuoso do cinema negro brasileiro.

 

A programação acontece até 11 de setembro de 2025.  O filme de abertura da mostra OJU Roda Sesc de Cinemas Negros no Cinesesc, em 03/09/25, foi “Suçuarana” que, em seguida, deve entrar em cartaz nos cinemas.

 



SUÇUARANA é um road movie de Minas Gerais que registra uma terra devastada pela mineração, que põe em ação viajantes em busca de sobrevivência, valendo-se, por exemplo, dos escombros de uma fábrica abandonada.  É uma história de busca.  No caso de Dora (Sinara
Reis), que passou os últimos anos vagando pela estrada, em busca de um lugar mítico, a Suçuarana do título, a partir de uma foto que sua mãe lhe deixou nessa suposta localidade.  Solitária, em companhia de um cachorro misterioso, que aparece e desaparece e a guia por caminhos de “salvação”.  Ela, no entanto, não parece estar à procura de um porto seguro, de algo que a acalente.  Sua caminhada não tem começo, nem ponto de parada por muito tempo. Ainda que encontre apoio e afeto de outros por sua trajetória.  Tão despossuídos ou desassistidos como ela, mas gente que se solidariza entre si e com ela.  Afinal, estão todos no mesmo barco.  O filme dirigido por Clarissa Campolina e Sérgio Borges mostra, com muita sensibilidade, essa jornada de Dora em busca de algo que nem ela sabe bem o que é.




quarta-feira, 3 de setembro de 2025

I'M STILL HERE

 Grande Notícia : AINDA ESTOU AQUI, de Walter Salles é o melhor filme do ano de 2025 em todo o mundo, segundo a FIPRESCI. É a primeira vez que um filme brasileiro conquista essa honraria. VIVA!



terça-feira, 2 de setembro de 2025

A MELHOR MÃE DO MUNDO

Antonio Carlos Egypto

 


A MELHOR MÃE DO MUNDO.  Brasil, 2025.  Direção: Anna Muylaert.  Elenco: Shirley Cruz, Seu Jorge, Rihanna Barbosa, Benin Ayo. 106 min.

 

“A Melhor Mãe do Mundo” já está em cartaz há algum tempo nos cinemas, mas só consegui ver o filme agora.  Foi algo circunstancial, já que o trabalho da diretora Anna Muylaert sempre me interessou.  De longa data, aliás.  O seu curta-metragem de 1995, “A Origem dos Bebês Segundo Kiki Cavalcanti”, eu utilizei no trabalho de orientação sexual nas escolas com estudantes, era divertido e as coisas estavam bem colocadas.

 

Um outro curta, “Chamado a Cobrar”, de 2012, me divertiu muito. Seus longas são, reconhecidamente, filmes que se destacam no cinema brasileiro.  Especialmente, “Que Horas Ela Volta?”, de 2015, “É Proibido Fumar”, de 2009, e “Durval Discos”, de 2002.  Seu filme de 2022, “O Clube das Mulheres de Negócios”, no entanto, me decepcionou.  Talvez por isso eu tenha sido leniente em buscar este seu novo trabalho.  Mas sem razão.

 

“A Melhor Mãe do Mundo” é um filme consistente, bem realizado, como sempre, no caso dela, e tem uma narrativa abrangente.  A trama mostra a violência doméstica contra a mulher na ambiguidade dos sentimentos e desejos femininos frente ao agressor.  Vê sua fraqueza que se escora na força bruta descontrolada da embriaguez.  E põe a grande figura de Seu Jorge nos convencendo disso, sem que seja preciso mostrar nem exigir dele agressão nenhuma visível.  Perfeito o que está subentendido.  A relação dele, parceiro da mãe, mas não pai, com duas crianças, também é explorada com sutileza, tranquilidade aparente e muito significado. 

A grande personagem que é Gal, vivida pela excelente Shirley Cruz, é muito bem desenvolvida no seu périplo pela vida de catadora, sem teto após uma separação e sequestrando seus próprios filhos para viver com eles em situação de rua, tendo como único instrumento sua carrocinha.  Aí o filme empresta de “A Vida É Bela”, de Roberto Benigni, de 1997, a ideia de as limitações, opressões e agruras serem apresentadas por Gal e aceitas pelos filhos como grandes aventuras. 

 


Só que aqui, como o isolamento não acontece, a realidade se imiscui na aventura e o destino final do périplo, buscado com realismo e esperança, acaba se revelando uma armadilha.  Uma reviravolta, então, se impõe à narrativa.  E tudo isso se resolve muito bem, no final das contas.

 

O elenco, ponto forte do filme, tem, além de Shirley e Seu Jorge, duas crianças ótimas, magnificamente bem trabalhadas em desempenhos deliciosos: Rihanna e o garotinho Benin.

 

 

                                   CLÁSSICOS DO TERROR    

Aproveito para deixar aqui uma dica para quem gosta de filme de terror, de alta categoria (o que é raro).  É a mostra Clássicos do Terror, em São Paulo, no mês de setembro, às 5as. feiras, às 21:00 h, no Espaço Petrobrás de Cinema, e também no Cinesala, em outros dias.  Serão exibidos: ’O Iluminado”, de Stanley Kubrick, 1980, “Carrie, a Estranha”, de Brian De Palma, 1976, “Os Pássaros”, de Alfred Hitchcock, 1966, “O Bebê de Rosemary”, de Roman Polanski, 1968.  Como se vê, a fina flor do terror na telona.