quarta-feira, 5 de julho de 2023

O CRIME É MEU

                       Antonio Carlos Egypto

 

 



O CRIME É MEU (Mon Crime).  França, 2023.  Direção: François Ozon.  Elenco: Nadia Tereszkiewicz, Rebecca Marder, Isabelle Huppert, Fabrice Luchini, Andre Dussolier, Dany Boon.  115 min.

 

O novo filme dirigido por François Ozon é um roteiro adaptado por ele de uma peça de Georges Berr e Louis Verneuil.  Trata-se de uma comédia, com toques dramáticos e de suspense, a partir de uma espécie de releitura dos filmes policiais. Ou seja, uma baita ironia em relação a esse gênero.  Mas não só ao gênero cinematográfico como à própria realidade das investigações policiais e dos julgamentos e decisões do Judiciário, francês, no caso.

 

É também um filme de época, se passa em Paris nos anos 1930 e sua temática central é a questão das mulheres, o feminismo, a capacidade de enfrentamento e luta delas diante de um mundo marcadamente machista e violador do gênero feminino.

 

É por conta desse enfrentamento que um suposto crime adquire dimensões positivas e passível de dar apoio e fama a quem o cometer.  Nesse caso, confessá-lo pode ser mais interessante do que reivindicar uma onerosa e improvável absolvição por inocência.  Pode até haver uma disputa, regada a boas boladas de dinheiro, a respeito de quem realmente cometeu o crime.  O título em português “O Crime é Meu” resume bem isso, mais claramente do que o original “Mon Crime”.

 


Como se vê, estamos no terreno das chamadas “narrativas”, em que a verdade factual praticamente desaparece.  A questão vai se resumir em saber se faz sentido e até se é aceitável, dependendo das circunstâncias e das motivações envolvidas.  Isso de acordo com a repercussão do caso nos meios de comunicação, que vão atingir os julgamentos populares, dentro e fora dos tribunais.

 

A trama do filme é muito bem estruturada e desenvolvida, trazendo novos elementos e surpresas, ao longo de sua evolução, e novas consequências aos personagens envolvidos.  Uma penca de bons personagens, defendidos por um elenco estelar e de alta categoria, torna o filme “O Crime é Meu” muito atraente e divertido.  Uma comédia inteligente e crítica, que nos brinda com ótimos desempenhos.  Como os de Isabelle Huppert, no papel de Odette, uma atriz envelhecida e decadente que remete ao cinema mudo, ou de Dany Boon, como Palmerède, um ricaço que surpreende pela firme fidelidade à esposa.  Tem ainda o notável Fabrice Luchini, como o delegado que tira conclusões lógicas a partir do que crê ou adapta os fatos às suas crenças, ou o não menos brilhante Andre Dussolier, como o empresário Bonnard, que adapta sua ética ao dinheiro que pode irrigar seu negócio e salvá-lo da crise que enfrenta.  E outros mais num elenco em que as protagonistas são jovens artistas: Nadia Tereszkiewicz, a Madeleine, atriz em busca de concretizar carreira, que pode encontrar na Justiça o caminho para alavancá-la, com a ajuda de Rebecca Marder, no papel de Pauline, advogada desempregada, mas dedicada e criativa, capaz de muita coisa. No meio delas, o herdeiro potencial André, das empresas Bonnard, vivido pelo jovem Edouard Sulpice, que faz de tudo para se dar bem, desde que nunca precise trabalhar, e que é o amor de Madeleine, a quem ele imagina ter como amante, enquanto se casa com uma milionária.

 

O resultado disso tudo é um filme bem dirigido, elegante, divertido, com boa música, que parece bem apropriado para um momento do nosso país, em que um pouco de leveza e alegria caem muito bem.  Sem perder a capacidade crítica, o que é essencial.



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