quinta-feira, 30 de março de 2023

O CIRCO + UM SAMURAI

  Antonio Carlos Egypto

 



O CIRCO VOLTOU.  Brasil, 2021.  Direção: Paulo Caldas.  Roteiro de Paulo Caldas, Bárbara Cunha e trabalho de pesquisa de João Paulo Soares.  Documentário.  86 min.

 

Quem é que não gosta de circo?  A arte do circo, com seu apelo popular, faz, por meio do palhaço, a alegria das crianças de todos os tempos e lugares.  Mas e os trapezistas, equilibristas, comedores de fogo e os motociclistas do globo da morte?  Uma sensação.  Já houve tempo em que os animais ferozes eram uma outra grande atração.  Não pode mais, a não ser um homem vestido de macaco, por exemplo.  Seja como for, o circo é um encanto, mambembe ou requintado, é um encanto.

 

O documentário “O Circo Voltou”, do cineasta Paulo Caldas, de grandes filmes, como “Baile Perfumado” (1997), “Deserto Feliz” (2007), “Flores do Cárcere” (2019), ou como roteirista de “Cinema, Aspirinas e Urubus” (2005), é uma homenagem a um dos grandes mestres circenses, Zé Wilson.  Com o circo Spadoni percorrendo o Brasil, em várias épocas, e com a Escola de Circo Picadeiro em São Paulo, responsável pela preparação de novos talentos para a arte circense nos dias de hoje.  Ainda que muitos deles só consigam se apresentar nos intervalos dos semáforos da cidade.  Deixando-nos embasbacados, aliás.  Equilibrismo de precisão, com amplo domínio do tempo, incluindo a coleta das contribuições num sinal demorado, foi o que eu vi ainda esta semana em Sampa.

 

“O Circo Voltou” começa muito bem, com imagens quadradas no meio da tela, em preto e branco, magnificamente filmadas, que evocam o passado, a história e a memória.  Quando a tela abre e se torna colorida, vamos ingressar em um road movie, que acompanhará José Wilson e seu grupo circense e familiar por vários cantos do Brasil, retomando o circo Spadoni, sua tradição e brilho.  Seu filho, Pedrinho, que fará essa viagem pela primeira vez e se destacará como o palhaço mais novo do circo, servirá então de narrador da experiência.

 

O circo Spadoni percorre o Brasil por terra, de Furquin, nas Minas Gerais, passando pela comunidade quilombola de Cruzeiro, na Bahia, indo a uma aldeia indígena, em Palmeira dos Índios, em Alagoas, até chegar a Major Isidoro, no sertão de Alagoas, terra de origem do mestre Zé Wilson e jornada emocional da viagem.  E o circo se mostra comunicativo e atraente para todos esses diferentes públicos, exibindo a versatilidade dessa arte popular, que é também de resistência cultural, que vive se reinventando.

 

Zé Wilson fala também de sua experiência inovadora com a Escola de Circo, com a parceria que teve com Cacá Rosset no teatro com os espetáculos do Ubu Rei, famosos e de grande sucesso.  Relembra a amizade com Domingos Montagner (1962-2016), morto tão precocemente em acidente, a quem homenageia nas águas do São Francisco.

 

A performance de Pedrinho no circo, que fecha o filme, mostra que não só o circo volta, mas se renova e se prepara para o futuro.  Salve o circo!

 

 


  

Um outro documentário brasileiro que também merece atenção é UM SAMURAI EM SÃO PAULO, que conta a história do sensei Taketu Okuda, numa pequena academia no bairro de Pinheiros, com alunos praticando karatê, sem saber que estavam diante de um dos mestres mais importantes do mundo.  Ele e outros mestres japoneses das lutas marciais espalharam-se pelo mundo para difundir aquilo que mais amavam.

 

O filme foi concebido e dirigido por uma aluna da academia, Débora Mamber Czeresnia, paulista de origem polonesa, judia, neta de sobreviventes do Holocausto que, ao conhecê-lo e praticar sua luta, viu muito em comum na história de Okuda, marcada pela infância no Japão na Segunda Guerra Mundial, e a de seus avós.

 

A arte marcial das mãos vazias do karatê Butoku-kan é mostrada no filme pela figura, pelos movimentos atléticos que se constituem também numa dança meticulosamente realizada e pela resiliência desse homem, que viveu até os 79 anos de idade no Brasil, morreu em 2022 e enfrentou a morte prematura de seu filho, que vinha sendo preparado para sucedê-lo.  Foi um golpe que ele assimilou e seguiu em frente até o fim.  A tríade que baliza os samurais: honra, lealdade e coragem, foi o que norteou a batalha pela vida de Taketu Okuda.  70 min.

 

 

 

 

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