sábado, 2 de abril de 2022

3 DOCUMENTÁRIOS INTERNACIONAIS

Antonio Carlos Egypto

 

Da programação do festival É TUDO VERDADE 2022 (31/03 a 10/04), quero destacar três documentários internacionais que merecem atenção.

 


O primeiro deles é, na verdade, um pedido de socorro, um brado de alerta, uma busca desesperada pela comunicação com o mundo.  Chama-se DIÁRIOS DE MIANMAR (Myanmar Diaries) e não tem um diretor identificado.  Nem colaboradores ou técnicos nomeados.  É assinado pelo Coletivo Cinematográfico de Mianmar, simplesmente.  A razão é óbvia, para que seus realizadores pudessem preservar suas vidas, preservar-se de perseguições, prisões e tudo o mais.  Depois de mais um golpe militar, em 2021, a antiga Birmânia, hoje Mianmar, vive uma opressão violenta, que levou jovens ativistas a registrar como pudessem, na forma de acontecimentos diários, manifestações, repressão nas ruas, destruição, fome, que fazem um retrato assustador do país nesses tempos.  Para isso, foi preciso que trabalhassem juntos, mas cada qual com seus equipamentos e recursos (uma câmera escondida na janela de casa era suficiente para mostrar pessoas sendo agredidas e baleadas à altura da vista), buscando comunicar-se com o mundo pela tela do cinema, um modo mais efetivo e emocionante do que o dos noticiários de TV.  O que resultou é um trabalho muito bom.  Triste, de revoltar-se, embrulhar o estômago.  Necessário.  Muito necessário.  70 min.

 



A produção alemã, finlandesa e canadense, OS CARAS DO ESTREITO (The Strait Guys), dirigida por Rick Minnich, nos leva a conhecer figuras raras, pessoas que pesquisam, alimentam e divulgam soluções para o mundo.  Com persistência e otimismo, apesar de todas as dificuldades, custos e a descrença no projeto.  Dito assim mesmo, o projeto.  E que projeto é esse, que um engenheiro de minas tcheco e um pupilo juntaram forças com visionários russos, em busca de ousar o impossível?  Ou o que assim se apresenta?  O projeto é simplesmente ligar os Estados Unidos (Washington) por via férrea à Rússia (Moscou), numa rota que inclui um túnel de cerca de 100 quilômetros sob o Estreito de Bering.  Havendo dinheiro, questões técnicas parecem possíveis, mas seria preciso unir o então presidente norte-americano Trump a Putin, passando pela aquiescência dos extremos do Alasca e das comunidades russas isoladas.  Foram anos e anos de labuta, mas afinal tratava-se de vencer não só as distâncias, como a própria Guerra Fria, passando pela Europa e chegando à China. Tudo ainda parecia possível para daqui a algumas décadas, mas a pá de cal se dá agora, com o advento da guerra da Ucrânia.  Há espaço para a paz e a colaboração mútua no mundo ou isso é coisa de visionários?  100 min.

 



O documentário polonês O FILME DA SACADA (Film Balkonowy) fala de gente e de suas histórias.  Dirigido por Pawel Lozinski, da sacada de seu apartamento,  puxando conversa com os transeuntes que por ali circularam, com um microfone de longo alcance e uma filmagem feita de cima, provavelmente do primeiro andar do prédio.  Pawel estimula que as pessoas falem de si, da sua identidade, da vida, do que fazem, do que querem ou do que lhes interessa falar.  E como ele se revela capaz de ouvir de fato, o que é raro, e encontra amiúde alguns que sempre passam por ali, o que ele colhe é um painel humano muito interessante, de uma rua de Varsóvia.  Que poderia ser de São Paulo ou de qualquer outro lugar.  São desejos, sentimentos, humor, timidez, boa vontade, o que aparece.  Além dos problemas que conhecemos todos, da solidão, das separações, dos medos, ambiguidades, culpas, vícios, e também do desemprego, da prisão, da morte ou separação de uma pessoa querida.  Até patriotismo fajuto e crítica a imigrantes aparecem, mas de relance.  Não é o que mais importa aqui.  De forma aparentemente natural, bem editado, o trabalho flui como aquelas conversas rápidas que se podem ter de uma janela com a rua, ou de  uma janela a outra e que vão aos poucos se tornando familiares e podem até dar margem a confissões.  Simples e humano.  Profundamente humano.  100 min.

 

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