Antonio Carlos Egypto
NÓS DUAS (Deux). França, 2019. Direção e roteiro: Filippo Meneghetti. Elenco: Barbara Sukowa, Martine Chevallier, Léa Drucker, Muriel Benazeraf. 95 min.
O empecilho para isso poderia vir dos
dois filhos e do neto de Madeleine, mas a relação dela com esses familiares tem
arestas. Nada a ver com o amor lésbico,
desconhecido por eles, mas há uma cobrança no ar de que Madeleine não amava
verdadeiramente o marido que se foi. E
isso incomoda.
O desejo de mudança para Roma
desencadeia uma série de situações que abalarão o mundo estável em que as duas
mulheres idosas viviam. Não esperem por
um dramalhão. Ao contrário, o filme
dirigido por Filippo Meneghetti é cheio de pequenos detalhes e sutilezas que
vão revelando os sentimentos dos personagens.
Um silêncio, uma ausência de resposta, um não cumprimento, uma
movimentação no espaço, o toque num objeto, são indicativos disso. Especialmente na primeira parte do filme,
onde as coisas mais graves não aconteceram.
Os eventos se precipitam e as sutilezas se reduzem, porém, não
desaparecem.
O diretor está mais interessado no que
se sente do que nos fatos e soluções em si.
No entanto, existe uma trama acontecendo e envolvendo o espectador. Ela se move pelos sentimentos, o medo,
especialmente, porém, o contexto social também está presente. E, no fim das contas, conta muito.
O diretor e roteirista Filippo
Meneghetti tem 41 anos, é italiano, vivendo na França, e, “Nós Duas” é seu primeiro
longa-metragem. Podemos dizer que,
surpreendentemente, foi o filme escolhido para representar a França na disputa
pelo melhor filme internacional no Oscar 2021.
Um feito para um jovem e promissor cineasta estrangeiro. Merecido.
O seu trabalho é consistente, tem uma história bem concebida e ganha
força nos detalhes, naquilo que fica em menor evidência, aparentemente.
O desempenho da grande atriz Barbara
Sukowa tem muito mérito nesse êxito. Ela
transmite tudo o que sente, o que se passa dentro dela, nos menores gestos,
posturas, olhares, entusiasmo ou desânimo.
Nossa conhecida desde os filmes de Rainer Werner Fassbinder, a atriz
alemã de origem polonesa, é brilhante no desempenho que sustenta o filme o tempo
todo. Sua parceira de protagonismo, a
atriz francesa Martine Chevallier, também é exigida na sutileza interpretativa
e se sai muito bem. Basta dizer que, em
boa parte do filme, ela atua muda, sem emitir uma palavra. E entendemos absolutamente tudo o que se
passa com ela.
Tudo isso funciona bem, numa narrativa
do tipo clássico, mesmo com algumas soluções questionáveis. Por exemplo, guardar bastante dinheiro numa
latinha dentro do apartamento não parece um comportamento razoável para uma
personagem vivida e decidida como Nina.
Vai bem para a trama, mas não chega a convencer. De qualquer modo, coisas como essas não
comprometem um filme tão bem trabalhado, numa temática difícil e pouco,
digamos, comercial.
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