segunda-feira, 6 de setembro de 2021

CIDADÂOS DO MUNDO

Antonio Carlos Egypto

 

 



CIDADÃOS DO MUNDO (Lontano Lontano).  Itália, 2020.  Direção: Gianni Di Gregorio.  Com Gianni Di Gregorio, Giorgio Colangeli,  Ennio Fantastichini, Daphne Scoccia.  91 min.

 

Em tempos de prevalência do mundo rural sobre o mundo urbano, no Brasil, dizia-se que a galinha do vizinho era mais gorda ou punha mais ovos.  É uma maneira de fantasiar sobre aquilo que não se conhece direito, invejar o que não se tem, criar expectativa sobre aquilo que poderíamos ser, ou ter. A comédia italiana “Cidadãos do Mundo”, de Gianni di Gregorio, brinca com questões como essa, de um modo leve, mas também explicativo, quase didático. 

 

Os personagens centrais são três homens idosos, dispostos a mudar de vida, insatisfeitos com o que têm, de uma maneira ou de outra.  Gianni Di Gregorio, diretor, corroteirista e também ator do filme, faz o professor que ensinava latim antes de se aposentar.  E que garante que seus alunos ainda se recordam do que aprenderam com ele.  Os vencimentos de aposentado, porém, não satisfazem.

 

Giorgetto (Giorgio Colangeli) reclama ainda mais da aposentadoria, obtida mais por idade do que por tempo de serviço, já que, ao que parece, ele nunca trabalhou de fato.  Ele, junto com o irmão, herdaram uma banca de frutas, mas não quer saber de trabalhar lá.

 

A partir dessa insatisfação, Giorgetto e o professore se encontram com outro companheiro disposto a mudar de vida: Attilio (Ennio Fantastichini), que não tem aposentadoria, vive de comercializar móveis e objetos antigos. 

 

O trio decide, então, que está na hora de sair da Itália, em busca de um lugar ideal, aprazível, sem grandes problemas climáticos, nem guerras ou terrorismo, onde, com o dinheiro que têm, possam viver melhor, aproveitar melhor a vida.  Que lugar seria esse?  Eles resolvem pedir ajuda a outro amigo/conhecido, que lhes dá informações.  Começando pelo preço da cerveja, em euros.  Escolher o lugar já é um grande problema, porém, os cidadãos do mundo, na verdade, são provincianos, para quem os próprios arredores europeus são desconhecidos e a quem falta tudo para tomar as providências necessárias para tais câmbios de vida.

 




É aí que a narrativa explora o quanto é preciso planejar e considerar tudo o que envolve essa viagem e mudança de país, ainda que não precisem ir para muito longe de Roma.  Desfazer-se de casa e dos objetos, vendê-los para angariar dinheiro, tentar transferir a aposentadoria para outro lugar, livrar-se do passado, dos familiares, do cachorro.  Dá tanto trabalho e vai-se revelando cada vez mais incerto, e duvidoso quanto aos ganhos, que o trio balança.  Cada um a seu modo tem medo do que engendraram.

 

Como toda ação que visa à mudança, novas descobertas surgem, no mundo real e no mundo interno, que interferem nos planos originais.  Fica bem interessante acompanhar o processo vivido por esses três senhores, maduros, porém ingênuos e despreparados para o que se propuseram a fazer.  O espectador vive com cada um deles um pequeno drama, situações que beiram o constrangimento, e a gente sorri, mas lamenta por eles.

 

O que não quer dizer que não encontrarão um modo de resolver a questão que passe pelo humanismo e pela empatia, características que foram marcantes no cinema italiano e que ainda encontramos na filmografia recente do país, como é o caso aqui.

 

Gianni Di Gregorio, diretor do ótimo “Almoço em Agosto”, de 2009, e corroteirista de “Gomorra”, de 2008, bom ator também, compõe com seus companheiros de cena um trio cativante de personagens que têm vida e anseios legítimos enquanto pessoas idosas, que podem ser um tanto trapalhões, mas são boa gente.




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