Diretores importantes, grandes cineastas
costumam ter filmes recentes exibidos na Mostra Internacional de Cinema de São
Paulo. Algumas vezes ficam abaixo da expectativa
que seus nomes geram no público cinéfilo. Outras, correspondem, com maior ou
menor empolgação. A gente celebra quando
algum deles traz uma verdadeira obra-prima.
O PARAÍSO DEVE SER AQUI |
Neste ano, até aqui, o grande destaque para
mim foi o novo filme do cineasta palestino Elia Suleiman, O PARAÍSO DEVE SER
AQUI. Ele dirigiu, fez o roteiro e
protagonizou um trabalho extremamente criativo, inovador, que é uma verdadeira
aula de cinema.
São sequências muito bem construídas, num
filme moderno, com muito humor, que surpreendem pelo inesperado, pelo bizarro,
pelo extemporâneo. Do começo ao fim vigora o inusitado, aquilo que a gente
estranha, de início, não chega a compreender, sentir ou perceber o que, de
fato, está acontecendo. Elia Suleiman
participa de tudo, está envolvido em tudo o que se passa, mas é como se ele
estivesse de fora, observando de forma privilegiada. Esteja em Nazaré, Paris, Montreal ou Nova
York, a Palestina está sempre presente, enquanto identidade. Afinal, para aonde quer que a gente vá, leva
sempre a si mesmo, não é? O que pode ser
trágico em alguns casos, cômico, em outros. E também pode-se rir das pequenas
tragédias, incompreensões ou surpresas da vida.
Vamos fruindo as sequências e é inevitável se
perguntar: como ele conseguiu filmar isso?
Vou dar só um exemplo, muitas cenas em Paris, com seus grandes espaços,
com a cidade absolutamente vazia e um único fato se destacando. Aparentemente, pelo menos, em plena luz do
dia. Suleiman não para de nos surpreender, de nos provocar, sempre com leveza, com
muita inteligência e sofisticação. Sem
se valer de nenhum recurso fácil, como seriam o sexo ou a violência. O que ocupa a cena é sempre sutil, às vezes,
um detalhe, uma inflexão inesperada, uma repetição, um absurdo.
O filme tem ritmo e encadeamento, apesar de as
sequências serem independentes e filmadas em lugares diversos, por onde o
personagem circula.
Participações especiais de Gabriel García
Bernal, no papel dele mesmo, e de Ali Suliman.
O filme é palestino, mas a produção é internacional, envolve França,
Catar, Alemanha, Canadá e Turquia. São
97 minutos de maravilhoso cinema. De encantar, encher os olhos, usufruir do
senso de humor afiado de uma fleumática figura, encarnada pelo cineasta.
A Mostra 43 homenageia Elia Suleiman, conferindo-lhe
o prêmio Humanidade e uma pequena retrospectiva, exibindo mais 2 filmes do
diretor, CRÔNICA DE UM DESAPARECIMENTO, de 1996, e INTERVENÇÃO DIVINA, de 2002.
O PARAÍSO DEVE SER AQUI (It Must Be Heaven) é um dos grandes filmes da presente Mostra. Daqueles que a gente vai lembrar sempre.
Os irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne trouxeram
para a Mostra O JOVEM AHMED, tratando de um personagem adolescente, de 13 anos,
muçulmano religioso fanático. E o fazem
com muito talento ao descrever e desenvolver as situações e atitudes do
personagem, que acaba se envolvendo numa tentativa de assassinato em nome de
Alá. A forma como se conclui o drama ao
final não chega a ser muito convincente, no entanto. Produção belga, com 84
minutos, estrelada por Idir Ben Addi, Olivier Bonnaud, Myriem Akheddiou,
Victoria Bluck.
O diretor chinês Wang Xiaoshuai, de “Bicicletas
de Pequim”, que venceu o Urso de Prata em Berlim, em 2000, comparece com ATÉ
LOGO, MEU FILHO. Trata-se de um
melodrama com todas as tintas do gênero, problemática familiar, morte trágica
de uma criança, personagens que se separam e cujos destinos se cruzam,
relacionados às mudanças por que passava a China, ao longo de 30 anos. Em especial, a política do filho único, que
gerava até multa para quem não cumprisse a determinação. Bela produção, comandada por um cineasta de
peso, mas um tanto alongada. São 185
minutos de um drama que poderia ser contado em muito menos tempo. O
elenco tem Wang Jingchun, Yong Mei, Qi Xi, Wang Yuan.
ATÉ LOGO, MEU FILHO |
O ÚLTIMO AMOR DE CASANOVA, produção francesa
dirigida por Benoit Jacquot, volta ao personagem Casanova para que ele próprio
conte sobre a relação com a jovem prostituta que o fez ignorar todas as outras,
ou quase isso, que teria sido seu último amor.
Depois disso, as conquistas tomaram o lugar do amor e da paixão. Uma produção de época que não acrescenta
muita coisa, apesar de contar com o grande ator Vincent Lindon num papel que
não parece ser para ele. No elenco,
também Stacy Martin, Valeria Golino, Nathan Willcocks. 98 min.
A máxima: Para amar, talvez não seja preciso
sofrer, mas para ser amado, sim.
O novo filme do diretor mexicano Arturo
Ripstein traz uma trama de convívio de amor e ódio, desejo, ciúme, sexo à flor
da pele, entre um casal de idosos e seus envolvimentos dentro e fora do
casamento, que perpassa os anos e parece atá-los para sempre, como um tipo de
simbiose. O DIABO ENTRE AS PERNAS fala,
por exemplo, de fogosidade feminina na velhice. Não fica nada a dever a Nelson
Rodrigues. Sylvia Pasquel, Alejandro Suarez, Greta Cervantes, compõem o elenco
de um filme também um tanto longo, que ganharia com uma edição mais enxuta do
que os 145 minutos dessa produção com bela fotografia em branco e preto.
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