quarta-feira, 30 de outubro de 2019

DOIS PAPAS + O FAROL_MOSTRA 43

Antonio Carlos Egypto




DOIS PAPAS (The Two Popes).  Reino Unido, EUA, 2019.  Direção: Fernando Meirelles.  Com Jonathan Pryce, Anthony Hopkins, Juan Minujin.  125 min.

Bento XVI, ultraconservador, tradicionalista, defensor da ortodoxia da fé.  Francisco, liberal, reformador, antenado com as questões mundiais, com os pobres e com os excluídos.  Duas visões muito distintas, que acabaram tendo que conviver de perto, porque, com a surpreendente renúncia do papa Bento e a eleição de Francisco, havia, e há, muitas questões a considerar e arestas a acertar. No filme de Fernando Meirelles, uma produção internacional de alto padrão, amplia-se e estreita-se a relação entre ambos, para mostrar esses caminhos, essas diferenças e a necessidade de encontrar convergências.

 Para quem acompanha os fatos e tem uma visão progressista, é muito claro o avanço que representa o papado de Francisco e a superação do dogmatismo elitista de Bento.  “Dois Papas”, no entanto, alivia a visão sobre Joseph Ratzinger, mostrando-o com humanidade e compreensão, apesar de alguns arroubos autoritários.  Também não se aprofunda nas insinuações de simpatia ao nazismo, nem aborda o papel de Ratzinger no combate, por exemplo, á Teologia da Libertação, durante o papado de João Paulo II.  Ou sua perseguição a “dissidentes”, como Leonardo Boff.

Quanto a Jorge Bergoglio, o papa Francisco, sua história é mais contada e os questionamentos e problemas que viveu durante a ditadura militar argentina estão lá.  O que é muito bom, porque tenta esclarecer os erros cometidos pelo então jesuíta Bergoglio.

Enfim, os caminhos do mundo e os rumos da igreja passam por conversas, confissões e até momentos descontraídos, ligados ao futebol.  Diga-se, de passagem, a grande vitória de Ratzinger sobre Bergoglio acontece na final da Copa do Mundo, entre Alemanha e Argentina.  Mas Ratzinger não se interessava por futebol, enquanto Bergoglio é, como são os argentinos e os brasileiros, muito ligado no espetáculo da pelota, e no seu San Lorenzo, como ficou público para o mundo todo.

A direção de Meirelles é muito segura, a cenografia, a direção de arte, o figurino, a música, tudo funciona bem.  O grande destaque, porém, é o desempenho dos atores.  Jonathan Pryce faz um papa Francisco cativante e Anthony Hopkins faz com que respeitemos e até admiremos o papa Bento XVI, em que pesem suas posições retrógradas.  São dois grandes atores em cena, que valem por todo o filme.  São personagens muito bem explorados, capazes de manter o interesse e a atenção, independentemente de filiações religiosas, posições filosóficas ou políticas, que nos movam.  Porque as questões que o filme levanta, afinal, interessam a todos.

“Dois Papas” é o filme do encerramento oficial da 43ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.  No entanto, ainda haverá a repescagem, com mais uma semana de filmes da Mostra, premiados e favoritos do público, sendo exibidos exclusivamente no Cinesesc.





O FAROL (The Lighthouse).  Estados Unidos, 2019.  Direção: Robert Eggers.  Com Willem Dafoe, Robert Pattinson, Valeria Karaman.  109 min.

Um farol no fim do mundo, em fins do século XIX, onde convivem por algum tempo um faroleiro veterano e seu jovem ajudante, é o ponto de partida para um filme de terror.  O que acontece é até bem previsível para o gênero.  Tormentas, tempestades, aves marinhas que, se mortas, trazem mau agouro, sereias fazendo parte da trama e, claro, a inevitável deterioração de uma relação humana abandonada à própria sorte, num canto obscuro do globo.  O mérito de “O Farol”, no entanto, não está na sua história, mas na sua concepção.  Apresenta uma belíssima fotografia em preto e branco, enquadramentos maravilhosos, sequências de tirar o fôlego e dois atores em atuações impecáveis.  Willem Dafoe e Robert Pattinson se entregam aos seus papéis e a seu convívio dramático, de um modo muito intenso.  Mesmo quem não curta o gênero terror ou as cenas fantasmagóricas e de violência, não deve ficar indiferente.  “O Farol” teve uma procura surpreendente durante a Mostra 43, com prolongadas filas para tirar ingressos, até sessão extra esgotada e tudo o mais.  Não creio que fosse para tanto, até porque o filme estreiará em breve no circuito comercial.  Os fãs do gênero vão adorar, com certeza.


Um comentário:

  1. AAHH!!! Esse eu não perderei qdo.passar no CIRCUITO Comercial!!? Os seus comentários muito aprimorados e com observações detalhadas me deixaram muito curiosa a respeito Ass. MARIA NAVARRo.

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