Antonio Carlos
Egypto
SOLDADOS DO ARAGUAIA. Brasil, 2017. Direção: Belisário Franca. Documentário.
73 min.
A historiografia brasileira tem muitos
esqueletos no armário. Aspectos
importantes são deixados de lado, relegados ao esquecimento, como se nunca
tivessem existido. O diretor Belisário
Franca já havia mexido numa ferida antiga, no documentário “Menino 23”,
acompanhando a investigação do historiador Sidney Aguiar, que descobriu tijolos
confeccionados com suásticas nazistas, numa fazenda no interior de São
Paulo. E acabou revelando a escravização
de crianças nos anos 1920 e 1930, promovida por empresários de pensamento
eugenista. O vínculo entre elites
brasileiras e crenças nazistas se revela por inteiro, no depoimento de uma
vítima sobrevivente: menino 23, já
que eles tinham que abdicar de seus próprios nomes. Belo documentário.
Agora, Belisário Franca volta à carga,
remexendo na proscrita guerrilha do Araguaia, que aconteceu entre 1967 e 1975,
na selva amazônica. Foi um movimento de
resistência armada à ditadura militar no campo, visando a atingir comunidades
ribeirinhas e rurais na organização da resistência.
Acabou sendo dizimada por forças do exército,
que recrutavam soldados da própria região, que se apresentavam para o serviço
militar e eram treinados para enfrentar a guerra, desconhecendo por completo
suas reais motivações.
O tal treinamento, revela-se no filme, era de
uma crueldade incrível para aqueles recrutas, que sofriam verdadeira tortura física
e psicológica, para aprenderem a endurecer com os “subversivos” comunistas, que
seriam capturados e barbaramente torturados, mortos, jogados ao mar de
helicópteros e todo tipo de excessos.
Não havia lei nem nenhum tipo de garantia constitucional ou dos direitos
humanos. Tudo podia, na ditadura
civil-militar que vigorou por 21 anos no Brasil, especialmente contra a
resistência armada, no campo ou na cidade.
A partir de um trabalho de apoio aos
ex-soldados do Araguaia, que vivem traumas permanentes, relacionam-se com
fantasmas e culpas por toda a vida, o documentário “Soldados do Araguaia”
resolve ouvi-los, contar suas agruras, suas impressões, suas memórias, os medos
que persistem, a opressão que ficou dentro deles, como agentes e vítimas de uma
violência inaudita.
O que se ouve e se vê é estarrecedor. Quem ainda hoje pensa em restaurar dias como
aqueles só pode ser um louco desumano ou um completo desinformado sobre aquele
período. Daí a importância de um filme
como esse, para que não desejemos repetir atrocidades como aquelas.
Quando se quer apagar da história os eventos
que não interessa recordar, que comprometem pessoas e instituições de poder, o
que nos resta é um limbo perigoso, que pode nos levar a reviver barbaridades,
desumanidades, que não se justificam em nome de nenhuma ideia política, seja à
direita, seja à esquerda. Combater a
opressão ao ser humano se sobrepõe a todas as ideologias ou sistemas de poder.
Para que isso seja possível, encarar a verdade
dos fatos é essencial. O documentário é
um meio, um dos caminhos de concretizar isso e alcançar o público. O problema é a distribuição e exibição dos
filmes, que acaba relegando-os a poucos e raros espaços, por pouquíssimo
tempo. Os serviços de TV paga, streaming e a disponibilização na
Internet podem ajudar. Pode ser
incômodo, mas é importante saber dessas coisas.
O penúltimo parágrafo expõe com muita clareza as mazelas que ocorrem nos regimes autoritários. Os regimes ditatoriais se mantém como? Oprimindo, matando, proibindo. Felizmente no Brasil esse regíme se foi, embora na America Latina, só para citar um continente, há muitos regimes ditatoriais escabrosos, que são amplamente elogiados por pessoas que seguem a mesma ideologia. Presos, assassinados? Mereceram, pois são opostos a nosso "heroi"... E assim vai a vida...
ResponderExcluirAquele regime se foi, mas tem gente gestando o ódio, chocando o ovo da serpente. O momento é grave. Pinochets e Videlas sempre podem ressurgir
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