Antonio Carlos
Egypto
PAPA FRANCISCO: CONQUISTANDO CORAÇÕES (Francisco: El Padre Jorge). Argentina/Espanha, 2015. Direção: Beda DoCampo Feijóo. Com Darío Grandinetti, Silvia Abascal,
Anabella Agostini, Gabriel Gallicchio, Leonor Manso. 105 min.
O papa Francisco é uma figura pública das mais
admiráveis da atualidade. Por seu
despojamento, sua simplicidade ao exercer o poder que tem, pela procura por
ouvir, acolher e entender mais do que julgar ou restringir as pessoas e a
diversidade humana. É um homem que
pratica o que prega e o faz com humildade.
Sua inserção neste nosso cada vez mais insensato mundo trouxe um sopro
de tolerância e liberdade, que há muito se fazia necessário, sobretudo partindo
da poderosa Igreja Católica.
Chega a seu quarto ano de papado e ganha uma
cinebiografia para celebrá-lo. O
personagem é cativante e merece o apoio que tem recebido dos homens e mulheres
de bem, sejam religiosos ou não. O
problema que esse tipo de filme pode trazer é ser chapa-branca e servir apenas
à propaganda ou propagação de uma religião.
Ou só falar aos já convertidos. O
título em português: “Papa Francisco: Conquistando Corações” só reforça essa
impressão marqueteira. No entanto, o
título original é outra coisa: “Francisco: El Padre Jorge” e corresponde muito
melhor ao que é o filme e ao personagem que retrata.
Jorge Bergoglio, o padre Jorge, que se tornou papa, o
primeiro da América Latina, é uma pessoa forjada no convívio com as questões
sociais de uma região empobrecida. Sendo
um homem de ir às ruas e ao contato com as pessoas, desenvolveu sensibilidade
para ir muito além da doutrina e suas regras, o que seu antecessor Bento XVI,
Joseph Ratzinger, não demonstrava. O
filme mostra isso e coloca claramente os dois polos, o inovador e o
conservador, mas não só não faz qualquer crítica ao papa que renunciou como
cita uma fala de Francisco, colocando como corajoso e revolucionário o seu ato
surpreendente de renúncia. Certamente
não convinha a crítica direta ou a comparação de estilos. Seria quase afrontoso fazê-lo, tão gritante é
essa diferença.
Da mesma maneira, o filme cita os escândalos da
pedofilia na igreja e o do Banco do Vaticano, mas não lida com esses
temas. Do casamento gay nem se
fala. A questão do aborto aparece numa
cena do papa, confortando uma fiel, que chorava e se dizia arrependida de ter
tirado o feto. Terrível, mas algo
passível de ser acolhido ou perdoado. A
questão é mais complexa e pode dispensar essa culpa toda, mas já há algum
avanço aí.
De resto, o filme mostra a evolução do padre Jorge em
cenas muito menos convincentes sobre a sua juventude, relações familiares e
interesse por eventuais namoradas do que na sua vida adulta de padre, bispo,
cardeal de Buenos Aires. Em parte,
porque o ator que faz o jovem padre Jorge, Gabriel Gallicchio, não é muito
expressivo no papel, enquanto o grande ator argentino Darío Grandinetti encarna
magistralmente o papa Francisco. Já
conhecido do público brasileiro por filmes como “Fale Com Ela” e “Julieta”,
ambos de Pedro Almodóvar, ou “Relatos Selvagens”, de Damián Szifron.
A narrativa explora o período que envolve o conclave
que elegeu Ratzinger e depois, o que elegeu Bergoglio, por meio do
relacionamento do padre Jorge com a jornalista Ana, papel da ótima atriz
espanhola Silvia Abascal, cuja parceria com Grandinetti resulta estupenda.
A trama está longe de apresentar uma história
simplificada ou adocicada. Mostra os
conflitos, as dificuldades e as questões que envolveram Bergoglio e a ditadura
militar argentina, incluindo as denúncias feitas quando o atual papa
assumiu. Explica e defende o papel que
ele teve naquela ocasião, junto aos padres jesuítas sequestrados, além de
outros atos de solidariedade que, como mostra o filme, parecem não só comuns
como definidores da personalidade e da atuação do padre Jorge.
Enfim, é um filme que se vê e se aprecia muito bem e
que não entra naquela categoria indesejável de filme religioso de
propaganda. É uma boa produção, dirigida
por Beda DoCampo Feijóo, cineasta nascido em Vigo, na Espanha, mas radicado na
Argentina desde que era bebê, para onde se mudou sua família. Baseou-se no romance Pope Francis, Life and Revolution, de Elisabetta Pique, jornalista
argentina, nascida em Florença, na Itália, correspondente do jornal La Nación, no Vaticano.
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