domingo, 26 de junho de 2016

VISITA OU MEMÓRIAS E CONFISSÕES


Antonio Carlos Egypto




VISITA OU MEMÓRIAS E CONFISSÕES.  Portugal, 1982.  Direção: Manoel de Oliveira. Documentário.  68 min.


Foi um verdadeiro presente o que nos deu a 39ª. Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, quando Renata de Almeida anunciou a exibição de um filme inédito do mestre português do cinema, Manoel de Oliveira. E que agora chega aos cinemas de um pequeno circuito de salas alternativas. Em São Paulo ao Cinesesc.

A história é a seguinte: em 1982, Manoel de Oliveira chegava aos 74 anos de idade e realizou um filme documental sobre uma casa em que ele morou por muitos anos, 40, creio, e sobre a sua própria vida e história.  Talvez imaginando que já era mesmo hora de fazer isso.  Mas deixou o filme guardado na Cinemateca portuguesa, para só ser exibido após a sua morte.  E assim se fez.

Ocorre que ele só veio a falecer em 2015, aos 106 anos de idade, e trabalhou até o fim da vida mesmo.  Seu último trabalho, “O Velho do Restelo”, é um curta-metragem realizado em 2014.  Seu último grande filme, o brilhante longa “O Gebo e a Sombra”, em 2012.  Ou seja, o filme póstumo do diretor, “Visita ou Memórias e Confissões”, ficou guardado por inacreditáveis 33 anos.  E, se ele já havia feito muita coisa até então, a verdade é que a maior parte da sua grande obra é posterior ao filme.  Foi quando ele trabalhou mais, melhor, mais intensamente, e nos legou filmes inesquecíveis.




É preciso ver “Visita ou Memórias e Confissões” sabendo dessas coisas, para se perceber a importância que ele tem como registro de um trabalho in progress, poderíamos dizer, em relação ao conjunto da obra.

Na abertura do filme, Manoel de Oliveira põe a informação de que fez esse trabalho falando de si mesmo e não sabe se deveria tê-lo feito.  Mas, enfim, está feito.  Que bom, Manoel!  Assim pudemos ter registrada a sua fala sobre aspectos importantes da sua vida pessoal, familiar, problemas econômicos que o levaram a vender a casa tão amada, que expõe lindamente no filme, a sua prisão no tempo de Salazar, suas ideias sobre arte, arquitetura e, especialmente, cinema.  Imagens de filmagens familiares são mostradas, em paralelo à linda casa esquadrinhada e objeto de interessantes reflexões.




A origem do cineasta na cidade do Porto, vindo de uma família de industriais, indicava caminhos diversos do que trilhou no cinema.  As dificuldades da expressão artística no longo período ditatorial do regime salazarista foram grande empecilho.  Ele chegou a ser atleta, piloto de corridas e vinicultor, mas era o cinema o que ele tinha na veia.  E foi tardiamente que conseguiu dar vazão completa a seu espírito criativo e inovador.

O filme autobiográfico de Manoel de Oliveira é simples e admirável, um documento inestimável sobre um dos grandes cineastas que o cinema já teve.  Merece não só ser exibido comercialmente, como integrar uma caixa de DVD ou BluRays com os principais filmes do mestre, coisa que está faltando no mercado brasileiro.  Vários deles foram lançados em DVD, outros, exibidos na TV paga, no canal Brasil, mas para uma obra tão vasta e longeva são apenas pílulas.




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