Antonio Carlos
Egypto
NA VENTANIA (Risttuules). Estônia, 2014. Direção e roteiro: Martti Helde. Com Laura Peterson, Mirt Preegel, Tarmo Song,
Ingrid Isotamm, Einar Hillep. 87 min.
Não é todo dia que se vê, no círculo comercial dos
nossos cinemas, um filme da Estônia.
Aliás, nem sei se já houve outro...
Em “Na Ventania”, é abordada uma história gravíssima,
ocorrida durante a Segunda Guerra Mundial.
Em 14 de junho de 1941, Stalin deflagrou uma operação secreta de limpeza
étnica dos povos nativos, nos países bálticos: Estônia, Letônia e Lituânia.
Famílias inteiras foram deportadas de seus
territórios locais e enviadas a prisões, ou gulags,
e campos de trabalho forçado, na Sibéria, separando homens e mulheres. Uma dessas mulheres da Estônia, Erna Tamn,
separada de seu marido, Heldur, escreve a ele cartas da Sibéria, em busca de
reencontrá-lo algum dia, enquanto procurava sobreviver com apenas um pedaço de
pão diário. São essas cartas, que conheceremos em off pela voz da atriz Laura Peterson, que servirão de narrativa ao
filme, cobrindo um período de muitos anos, que passa pela morte de Stalin e
chega às mudanças políticas que se sucederam.
O trabalho do diretor Martti Helde é bastante
original, ao optar, na maior parte do tempo do longa, por compor tableaux vivants com os atores e
atrizes. A câmera se move, explora a
cena, altera os enquadramentos, se aproxima com o zoom, mas os atores não se
movem. Somente um piscar de olhos ou a
presença do vento se nota. Em outros
momentos, há movimentos, compondo uma atuação minimalista. Não há diálogos, só os textos das
cartas. A exceção é uma notícia que se
ouve por meio do rádio.
A fotografia, em preto e branco, é belíssima. Os ambientes naturais, muito bem escolhidos,
favorecendo a exploração da luz e dos espaços pela filmagem. As encenações, com os atores e atrizes
compostos como estátuas, são extremamente detalhadas, produzindo enquadramentos
magníficos, que se transformam com o movimento da câmera, mantendo a condição
de belos quadros o tempo todo.
Essa técnica acaba tendo o efeito de potencializar o
sentido da opressão. Não há o golpe, a
agressão, o sangue não corre, mas o próprio fato de as figuras não se mexerem
sugere, por si só, a impossibilidade de reagir ou resistir. A tragédia surda dos sem vez ou voz soa mais
intensa e forte.
O encontro humano depende da poesia, do vento oeste
que se cruza com o vento leste e realiza, simbolicamente, o que foi negado às
pessoas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário