terça-feira, 1 de março de 2016

OS VENCEDORES DO OSCAR 2016


Antonio Carlos Egypto


Ganharam o Oscar, paradoxalmente, os que não foram indicados e, portanto, não poderiam ser escolhidos: os integrantes negros da indústria cinematográfica de Hollywood.  É realmente inadmissível que atores, atrizes e outros profissionais negros do cinema, pela segunda vez consecutiva, estivessem de todo ausentes do prêmio.  Exceção feita à homenagem prevista para o diretor Spike Lee, pela obra que já havia realizado.  Não é novidade alguma que exista a discriminação.  Isso vem de muito longe, historicamente, são as raízes da escravidão que continuam pesando.  Talvez lá mais do que aqui.  Mas, enfim, está em toda parte. Era hora mesmo de chiar, reclamar, pôr a boca no trombone.  Foi o que eles fizeram, com humor, também, na própria cerimônia do Oscar, comandada por Chris Rock.  Muito bom, alguma coisa tem de mudar.  Foi uma vitória a repercussão que o assunto ganhou.




O Oscar branco de 2016, no entanto, não deixou de premiar bons filmes.  Faltou diversidade, mas teve qualidade. “O Regresso” não ganhou melhor filme, merecia.  Foi o trabalho de maior impacto cinematográfico, entre todos os indicados.  O prêmio para o diretor Alejandro González Iñárritu, bisando o Oscar da categoria (já havia ganhado com “Birdman” no ano passado), é um óbvio reconhecimento do talento do cineasta mexicano.  “O Regresso” faturou o prêmio de fotografia para Emmanuel Lubezki e, ainda, garantiu o esperado Oscar de ator para Leonardo Di Caprio.  Muito justo e apropriado.  Em número, foi pouco, 3 das 12 categorias indicadas, mas são prêmios relevantes.

Em quantidade, quem levou muito foi “Mad Max”, 6 categorias, quase todas técnicas: design de produção (ou direção de arte), montagem, figurino, cabelo e maquiagem, mixagem e edição de som.  O sofisticado filme de ação de George Miller não tem do que se queixar.

E o melhor filme foi, mesmo, “Spotlight”, que também levou o prêmio de roteiro original? Para mim, não.  Mas é um bom trabalho, no estilo clássico, sobre um tema palpitante: a pedofilia na igreja católica norte-americana.  Investigação jornalística como essa mostrada no filme é raridade ou nem existe mais, mesmo.




O filme canadense “O Quarto de Jack” ganhou um prêmio importante, o de melhor atriz para Brie Larson.  Estavam na parada concorrentes fortes: Charlotte Rampling, Cate Blanchet, Jennifer Lawrence e a jovem Saoirse Ronan, do simpático e delicado “Brooklin”.

“A Garota Dinamarquesa”, que não é tudo isso em matéria de cinema, levou o prêmio de atriz coadjuvante para a bela e talentosa Alicia Vikander, que se destacou no filme, ao lado do protagonista masculino, Eddie Redmayne (que levou o Oscar 2015 por  “A Teoria de Tudo”).  O assunto é bom, a primeira cirurgia de mudança de sexo da história.  Eddie está ótimo no papel, mas o filme é certinho, bonitinho e às vezes equivocado.  Querem um exemplo?  O personagem central, o transexual, é um artista, um pintor.  Trabalha em casa, com pincéis e tintas, impecavelmente vestido de terno e gravata, como se estivesse numa festa ou num escritório.  Inconcebível.

O ator coadjuvante escolhido foi Mark Rylance, única referência a “Ponte dos Espiões”, de Spielberg.  Tinha muito gente apostando em Sylvester Stallone, outra vez às voltas com Rocky Balboa.  Não.  Tom Hardy, Mark Ruffalo e Christian Bale estariam na minha lista antes dele.





Sobre o prêmio de roteiro adaptado para “A Grande Aposta”, que eu não vi, mas sei que é daquelas histórias que quem não é economista boia muito.  A adaptação deve ter sido boa o bastante para que o povo entendesse a história da bolha imobiliária que resultou na crise de 2008.  Não sobrou nada para o ótimo “Trumbo”, filme político de primeira linha.  Que tinha tudo para ser mais lembrado e ter recebido mais indicações.

Tem ainda a esperada derrota do lindo “O Menino e o Mundo”, de Alê Abreu, presença brasileira no Oscar.  “Divertida mente”, levou, como todos diziam que levaria, o prêmio de animação. 

Vibrei com a vitória do grande Ennio Morricone, o maestro e compositor italiano, que tanto já fez pelo cinema, recebeu até Oscar honorário, e que acabou sendo o único prêmio do filme do Tarantino, “Os Oito Odiados”.  Canção original não deu Lady Gaga, mesmo com a força do combate ao abuso sexual.  A música do 007 é que levou.  O prêmio de documentário foi para “Amy”, lembrando a trajetória bela e trágica de Amy Winehouse, de Asif Kapadia.




Uma categoria que sempre me interessa especialmente é a do chamado World Cinema, ou filmes não falados em inglês.  Essa divisão não faz sentido, na medida em que equipara os Estados Unidos, Inglaterra, Irlanda, Escócia, Austrália, Nova Zelândia, Canadá inglês e alguns outros, enquanto segrega todos os demais países, desde que não produzam em inglês.  Isso não é tão explícito assim, mas geralmente é o que acontece.  Dos cinco selecionados, “A War”, da Dinamarca, não passou no Brasil.  “Cinco Graças” (Mustang) é um filme franco-turco que não convence muito.  “O Lobo do Deserto” (Theeb), da Jordânia, é um faroeste bonito.  “O Abraço da Serpente” é consistente na abordagem cultural da Amazônia, um belo filme da Colômbia.  Mas “O Filho de Saul”, da Hungria, mereceu o seu Oscar.  Claro que podemos dizer que campo de concentração, na Segunda Guerra Mundial, é um tema que pega na veia emocional da Academia, mas o filme de László Nemes é uma poderosa realização.

A grande maioria dos filmes aqui citados recebeu críticas, postadas no cinema com recheio, especialmente os que eu julguei melhores.  Quem estiver com seu note book, lap top ou similar, é só usar o campo de pesquisa, digitando, por exemplo, o nome total ou parcial do filme.  No smartphone, eu não saberia dizer como se faz a pesquisa, porque o formato é um pouco diferente.  Experimentem.

Nota triste: costuma ser bonita no Oscar a homenagem ao pessoal do cinema que faleceu no ano anterior.  Mas muito triste mesmo é esquecer de mostrar feras do cinema que morreram em 2015, como Manoel de Oliveira, Jacques Rivette, Andrzej Zulawski e, ainda, a nossa Marília Pêra, que eles conhecem de “Pixote”.  De que cinema, afinal, se está falando?



3 comentários:

  1. Muito boa resenha e comentários Antonio Carlos Egypto! Permita apenas fazer alguns comentários, não propriamente contestando, mas no sentido de contribuir.
    As cerimônias do Oscar normalmente são chatas. Aliás, como são chatos todos os festivais de cinema. Incrível isso, mas parece que o povo que trabalha com imagem não lida bem com esse tipo de eventos. Veja o nosso Gramado, cujo anti clímax é de doer.
    Mas, o que desejo dizer é que a zoada toda sobre a questão do preconceito racial precisa ser melhor considerada, se assim me permite. Se, por dois anos, não houve ator, atriz ou outro profissional negro que não merecesse a indicação, não vejo necessariamente isso como uma prova de racismo, menosprezo etc. Aliás, de certa forma as piadas levadas a cabo pela organização e pelo apresentador pontuam isso. Eu, não vejo que os negros efetivamente não tenham espaço no cinema americano, e não é de hoje. Bem, mas é uma opinião.
    Com relação ao cinema estrangeiro, ou seja o cinema não falado em inglês, também acho que o tema deve ser pontuado com alguma luz, afinal, Hollywood precisou se curvar aos outros cinemas e abrir uma janela, pequena de fato, para premiar produções de outras partes do mundo. Nas prévias, o número de participantes até já aumentou (pouco, mas aumentou). No final, claro, cinco filmes de todo o mundo não inglês é pouco, mas não custa lembrar de que o prêmio é da indústria do cinema americano e não uma premiação dos outros cinemas. Acho válido. Até porque nos outros campos, em especial do cinema artístico, engajado, comprometido, existem uma infinidade de festivais espalhados pelo mundo, com destaque para aqueles que fazem a cabeça e os corações dos cinéfilos: Berlim, Veneza e Cannes.

    Cordialmente,

    Paulo Antunes
    Outro e-mail: pauloantunes@uol.com.br

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  2. Prezado,

    Gostei do seu Blog. Parabéns! Penso em criar um também para falar de cinema. Tenho feito meus comentários em minha página do Facebook, mas lá a coisa é um tanto complicada porque também publico outros temas de meu interesse, coisa que não pretendo fazer com o Blog, que também é uma mídia que conta com mais discrição, seriedade, serenidade e proteção.

    Assim, se for possível gostaria de obter algumas dicas de como viabilizar o referido Blog, quem já tem pode ajudar muito.

    Atenciosamente,

    Paulo Antunes
    Outro e-mail: pauloantunes@uol.com.br

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    Respostas
    1. Obrigado pelos seus comentários. Quanto ao blog pretendo lhe escrever a respeito.

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