Antonio
Carlos Egypto
FIQUE COMIGO (Asphalte). França, 2015.
Direção e roteiro: Samuel Benchetrit.
Com Isabelle Huppert,
Gustave Kervern, Valeria Bruni Tedeschi, Michael Pitt, Tassadit Mandi, Jules Benchetrit. 100 min.
Tudo parece indicar o contrário, já que no mundo
virtual as pessoas têm centenas de amigos.
Verdadeiras bobagens viralizam, como se diz, entusiasmando os que as
postaram. Pessoas mais conhecidas podem
ter milhões de “seguidores”. Mas a
solidão é um dos maiores problemas psicológicos do nosso tempo.
De muitas maneiras o sentimento de estar só, de não
ser amado ou desejado genuinamente, de não encontrar sentido para a própria
existência ou de se sentir isolado em meio à multidão são fontes de grande sofrimento. A falta de uma vida interior mais rica deixa
muita gente sem o chão sob os próprios pés.
O cinema já abordou essa questão pelos mais diversos
ângulos, geralmente no enfoque dramático.
Será a comédia um bom meio de abordar o problema da solidão? Mais do que isso: a comédia ligeira e os
personagens em situações bizarras, um tanto surrealistas, conseguem trazer
alguma luz sobre um tema como esse? O diretor Samuel Benchetrit buscou esse
caminho ao adaptar um livro que ele
próprio escreveu, “Les Chroniques de L’Asphalte”, no filme “Fique Comigo”.
Num prédio de apartamentos, na periferia de Paris, o
elevador vive quebrado, causando transtorno a seus moradores. Há um homem que, por morar no 1º. andar, não
quer pagar o conserto do elevador, mas uma overdose de esteira ergométrica o
deixa numa cadeira de rodas por algum tempo.
Vai daí que ele se encontra casualmente com uma enfermeira de semblante
triste e tenta conquistá-la, se passando por fotógrafo, que já rodou boa parte do
mundo. Engraçado? Um pouco, mas beirando o constrangedor. A falta de espontaneidade, o passar-se por
quem não é, se torna embaraçoso, digno de pena.
Essa é uma das histórias, relacionamentos, que o filme mostra.
Há a da mulher emigrante de origem argelina, cujo
único filho está na prisão, que recebe a “visita” de um astronauta americano,
diretamente do espaço. E há, ainda, a
história do adolescente que parece abandonado pelos pais e que descobre uma
estrela morando a seu lado. A atriz,
hoje decadente, traz uma nova dimensão à vida dele.
“Fique Comigo” mostra, alternadamente, os três
casos. Todos em busca de reter alguém
que, de algum modo, preencheu a vida de outro alguém, mesmo que de forma
passageira, fluida, improvável. Com
isso, se acentua a necessidade humana de afeto, uma necessidade desesperada,
por sinal. E o custo da solidão. As histórias são diferentes entre si, mas
dialogam a partir desse eixo central, que é relevante e sério. E não deixa de ser divertido, também.
O elenco é um dos trunfos do filme, a começar pela
excelente Isabelle Huppert, no papel da atriz Jeanne Meyer, aquela que já teve
melhores dias quando mais jovem. Logo
Huppert, que está no auge da força interpretativa, ainda que o papel de Jeanne
não exija tanto assim dela. Jules
Benchetrit, filho do diretor, é o adolescente que contracena com ela.
Valeria Bruni Tedeschi, a enfermeira triste, e o
suposto fotógrafo, vivido por Gustave Kervern, formam um par angustiante e
revelador da solidão que procuram retratar.
E o fazem muito bem.
A argelina Tassadit Mandi, atriz de “Dheepan: o
Refúgio”, Palma de Ouro de Cannes 2015, muito boa, faz Hamida e seu par
improvável é o astronauta, papel de Michael Pitt, de filmes como “Os
Sonhadores”, de Bernardo Bertolucci, de 2003, e “Violência Gratuita”, de
Michael Haeneke, de 2007. A dupla também
funciona bem.
O conjunto continua dando a ideia de uma junção de
histórias, apesar do elo que as une. Mas
cada uma das tres histórias é digna de atenção, e o tema está bem abordado no
registro escolhido da comédia, algo dramática.
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