Antonio
Carlos Egypto
A DOCE VIDA (La
Dolce Vita). Itália, 1960. Direção: Federico Fellini. Com Marcello Mastroianni, Anouk Aimée, Anita
Ekberg, Magali Nöel, Yvonne Furneaux, Alain Cuny. 174 min.
Federico Fellini (1920-1993) foi um dos maiores
criadores de toda a história do cinema.
Iniciou sua trajetória como cineasta dentro do neorrealismo e suas propostas de captar a realidade de forma
direta, nas ruas, geralmente com atores amadores, respondendo de forma objetiva
e reflexiva ao cenário de escassez de recursos, desilusões e desgastes, do
pós-Segunda Guerra Mundial, especialmente no contexto italiano.
No entanto, Fellini evoluiu daí para um cinema de
invenção, criando universos próprios e dando extraordinário espaço à
imaginação. Afinal, a realidade não nos
é dada, ela é percebida, captada, recordada, construída. O mundo felliniano de personagens exagerados,
excêntricos, estranhos, circenses, nos leva a pensar em tudo que nos diz
respeito, que nos cerca, o nosso imaginário, o inconsciente, o inusitado da
vida.
Essa história toda parece ter se estabelecido de
forma evidente num dos grandes clássicos do diretor: o lendário “A Doce Vida”,
de 1960. Nele, Fellini inventa um
ambiente em que a burguesia romana da época, entediada e vazia, se alimenta de
festas, orgias, aventuras amorosas, num mundo de aparências e falsidades, sem
sentido. Embora imaginado, era um
retrato da angústia existencial do período.
Lá estavam também a prostituição, a homossexualidade,
o travestismo, o strip-tease de socialites, o vandalismo dos ricos e um
punhado de outros elementos verdadeiramente escandalosos para a época.
“A Doce Vida” introduziu a ideia e a prática dos paparazzi, que invadem, como abutres e
de forma antiética, a vida privada, em
busca de fotos e reportagens de fofoca sobre os famosos ou de desgraças que
possam render grana.
Mas o que faz de “A Doce Vida” um filme atual e
brilhante é a estrutura como foi criado e montado. As sequências são absolutamente notáveis,
aparentemente independentes entre si, mas formando um conjunto cheio de
sentido.
A sequência em que Anita Ekberg entra na Fontana di Trevi e traz Marcello
Mastroianni para a água, após ele chegar com um copo de leite para o gato, é
histórica e jamais foi esquecida. Ela,
por si só, vale por todo o filme, claro.
Mas dezenas de outras encantarão o espectador que se dispuser a
percorrer os 174 minutos de um filme que prende a atenção todo o tempo de
projeção. E a gente ainda quer mais.
A ótima fotografia de Otello Martelli, em preto e
branco, é outro grande atributo do filme.
Sem falar no trabalho excepcional desse grande ator que foi Marcello
Mastroianni, verdadeiramente inesquecível.
E, claro, Anita Ekberg, deslumbrante, Anouk Aimée, ótima. Como se não bastasse, ainda tem a música
maravilhosa de Nino Rota.
“A Doce Vida” é um programa obrigatório para os
jovens que ainda não o viram. E se torna
um evento especial para os que podem revê-lo, agora novamente na tela do
cinema, em cópia restaurada de excelente qualidade. Fiz a experiência de vê-lo, mais uma vez, no
telão, e adorei.
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