sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

AZUL É A COR MAIS QUENTE

                         
Antonio Carlos Egypto




AZUL É A COR MAIS QUENTE (La vie d’Adèle – Chapitre 1& 2).  França, 2013.  Direção: Abdellatif Kechiche.  Com Adèle Exarchopoulos, Léa Seydoux, Salim Kechiouche, Jérémie Laheurte, Catherine Salée. 179 min.



“Azul é a Cor Mais Quente”, o filme francês inspirado numa história em quadrinhos para adultos, foi o vencedor do Festival de Cannes 2013, recebendo a Palma de Ouro como melhor filme.  Evidentemente, essa credencial aumenta a expectativa frente à película.  Isso, em geral, acaba produzindo algumas decepções.  Porque, quando se espera muito, é difícil que o produto corresponda às nossas exigências imaginárias.  O filme, “La Vie d’Adèle” no original, é um bom trabalho do diretor franco-tunisiano Abdellatif Kechiche (de “O Segredo do Grão”, de 2008), mas não chega a empolgar.

Adèle (Adèle Exarchopoulos) é uma jovem de 15 anos descobrindo a sexualidade e o amor. Como qualquer adolescente nos dias de hoje, ela faz suas experiências.  Primeiro, com um rapaz gentil e carinhoso, mas não se envolve com ele.  Experimenta um beijo de amor com uma colega e se sente atraída por ela.  Mas não será correspondida aí.



No entanto, essa experiência encontrará terreno fértil com uma outra garota, essa mais velha e bem mais experiente, que ela encontrará num ambiente gay.  Ela está lá por acaso, já que tem um grande amigo e confidente que é homossexual.  O fato é que algo muito importante para ela vai acontecer a partir daí.  A garota experiente, Emma (Léa Seudoux), tem cabelos pintados de azul, o que lhe confere um charme especial, na visão de Adèle, além de vir de um círculo social e intelectual superior. 

A história de amor, tesão e conflitos, entre Adèle e Emma é o foco central do filme.  O diretor gosta de trabalhar longamente as cenas, não se preocupa em abreviar a sequência, quando o que queria mostrar já está claro.  Dá tempo para a situação se revelar um pouco mais, calmamente.  Isso torna seus filmes, obviamente, mais longos.  Este tem três horas de duração, desnecessárias para contar a história que conta e, mesmo, para enfatizar os sentimentos e expressões envolvidos, como ele faz, usando fartamente a câmera muito perto do rosto das atrizes que protagonizam a trama e dos atores que entram como coadjuvantes. 



Adèle vai trabalhar como professora numa escola de crianças e Kechiche se detém em aulas, exercícios e, principalmente, na forma afetiva e acolhedora como ela trabalha.  A vida na escola e as conversas com as colegas e amigos também se prolongam algumas vezes, assim como contatos familiares, refeições, etc.

Evidentemente, o que chama mais atenção são as cenas de sexo entre Adèle e Emma.  A principal delas se alonga por mais de seis minutos bastante explícitos, com uma exposição farta dos corpos das atrizes.  Mas há outras, menores, muitos beijos, e a exposição de Adèle nua, ao ser pintada por Emma.  O amor físico entre as duas é mostrado com exuberância e sem pressa.

O diretor, questionado quanto a isso, explica que esse é seu ritmo de filmar e pode estranhar às pessoas acostumadas a outros ritmos, mas que ele não segue os ditames esperados.  Quanto à debatida cena de sexo, o que ele responde é que o amor tem um lado físico que é importante e tem de ser mostrado, mas que seu objetivo foi focalizar o amor radical entre as garotas. E mostrar a homossexualidade como algo corriqueiro, banal, até.



Bons propósitos, sem dúvida.  Mas sabe-se que não é assim tão fácil, nem simples, no contexto social. O próprio filme mostra que Adèle não conta a seus pais sobre seu enamoramento homossexual. E que ela é pressionada e criticada pelas amigas, quando percebem o caso.  Só que nem uma coisa nem outra são exploradas depois disso.  Os conflitos potenciais somem, a ponto de desaparecerem as cenas familiares e escolares dela, a partir de então.  Um providencial salto no tempo se encarrega de deixar para trás tais situações.  Nos ambientes em que Emma convive, tudo é tranquilo, inclusive na família dela.  Sinais de evolução civilizatória nas camadas de nível mais elevado? 

Para quem levou três horas para desenvolver a trama do filme, não se entende que esses conflitos tenham sido postos de lado.  Pode ser um desejo de que o tema da homossexualidade seja tratado como algo trivial, mas isso ainda não faz parte da realidade, infelizmente.

Claro que o que mais importa é como se estabelece, se desenvolve e se resolve o caso amoroso entre Adèle e Emma, que poderia ser entre um homem e uma mulher ou entre dois homens. Porque a homossexualidade não é o que explica, determina ou desmancha esse amor.  Mas ignorar que o componente homossexual tenha, ainda, um peso diferencial, me parece algo idealizado.



A jovem atriz Adèle Exarchopoulos, de 19 anos, que faz sua xará personagem, segura uma barra pesada, para uma estreante.  Está em foco todo o tempo, passa por um turbilhão de sensações e emoções e se expõe com coragem.  Dá bem conta do recado. Léa Seydoux, atriz já experiente, também merece destaque, fazendo uma Emma forte, decidida, intelectualizada, exibindo seu corpo e seus cabelos azuis em grande parte do filme.  Mostra talento e firmeza na condução do personagem. Ambas também receberam prêmios em Cannes.


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