quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

CHÉRI


Antonio Carlos Egypto



CHÉRI (Chéri). Inglaterra, 2009. Direção: Stephen Frears. Roteiro: Christopher Hampton. Com Michelle Pfeiffer, Kathy Bates, Rupert Friend e Felicity Jones. 93 min.



Receita para criar um belo filme, que mobiliza a atenção e o interesse dos espectadores: para começar, parte-se de um romance muito bem escrito por Sidonei Gabrielle Colette (1873-1954), ou simplesmente Colette, escritora francesa de destaque na primeira metade do século XX. O romance é “Chéri”, de 1920, que fala de sedução amorosa no mundo das cortesãs de luxo na Paris do início do século XX, da Belle Époque. É uma história cheia de intrigas, rivalidades, interesses diversos, dinheiro e muita sensualidade.

Algo lhe faz lembrar de “Ligações Perigosas”, aquele filme sensacional, baseado no livro de Choderlos de Laclos, sobre jogos de sedução, intrigas sexuais e de poder, comportamento amoral? Perfeito. Então, é hora de adicionar o roteirista daquele trabalho: Christopher Hampton e seus ótimos diálogos.

E quem deve dirigir tal filme? É claro que é o realizador de “Ligações Perigosas”: o britânico Stephen Frears. E que tal adicionar ainda, como atriz principal, Michelle Pfeiffer, que se destacou naquele mesmo filme, ao lado de Glenn Close e John Malkovich? Como elementos novos, podem-se adicionar a veterana e notável atriz Kathy Bates e, para o papel de Chéri (ou Fred), o jovem Rupert Friend.

Estão aí todos os ingredientes necessários para que um talentoso trabalho cinematográfico aconteça. E não dá outra: o filme flui que é uma beleza, comunica e encanta.

Prostitutas aposentadas porque a idade começa a pesar e a destruir a beleza, Léa de Louval (Michelle Pfeiffer) e Madame Peloux (Kathy Bates) são mulheres bem sucedidas, donas de fortunas que elas têm de administrar com atenção, já que o passado foi glamouroso e cercado de homens poderosos ou notáveis, mas não há mais futuro para elas. E, ainda que ricas, são marginais que têm de conviver entre si, se não quiserem amargar isolamento e solidão. Verdade que a personagem Léa continua linda e charmosa (como a atriz). Ainda assim, seu tempo já passou e é hora de acomodar-se e, quem sabe, até de apaixonar-se.

O filho de Madame Peloux, o Chéri (Rupert Friend), é um garoto infantilizado e feminilizado, que teria muito a ganhar se pudesse aprender a ser homem de verdade pelas mãos de Léa. Mimado pelo dinheiro, apesar do abandono da mãe durante a infância, é autocentrado e egoísta, mas ainda assim acaba se tornando um amante que satisfaz Léa. Pela juventude e impetuosidade, talvez. Mas também porque, com ele, ela pode exercer seus instintos maternais. Ele vive com ela dos 19 aos 25 anos de idade. Mas uma coisa como essa não pode durar para sempre: Madame Peloux, mãe do jovem, amiga e rival de Lea, tem planos de casamento para o moço.

Aí entram os jogos de sedução, as idas e vindas, os ciúmes, as competições e frustrações, as dores de amores, sofrimento, separação, rompimento, retorno. Todos os elementos típicos que compõem esse gênero de história são muito bem arranjados por Frears, num filme que tem vivacidade, humor e agilidade, em ótima reconstituição de época, belos figurinos, ambientes que acentuam e descrevem personalidades e visão de mundo dos personagens, além de interpretações perfeitas de um elenco em que Michelle Pfeiffer brilha intensamente.

O filme explora o curioso mundo das cortesãs, que estão entre as mulheres que maior destaque conseguem na história da humanidade. Rivalizam com as santas e as militantes das causas que foram mudando o mundo. E com um charme todo especial, que alimenta as fantasias masculinas.

O diretor Stephen Frears acertou mais uma vez, tendo a chance de voltar à temática e ao mundo sinuoso de “Ligações Perigosas”, um grande êxito que ele obteve em 1988. Já lá se vão mais de 20 anos!

Frears vem de sucessos recentes igualmente significativos, como “Sra Henderson apresenta” (2004), um musical inteligente e de alto astral, que mostra que o show não pode parar e que transgredir é da essência do espetáculo, ainda que estejamos em plena Segunda Guerra Mundial e Londres esteja sob bombardeio alemão. Depois disso, veio “A Rainha” (2006), que venceu o BAFTA (British Academy of Film and Television Awards) e deu o Oscar a Helen Mirren, um sucesso maior.

“Chéri” é um filme para o grande público apreciar e que os mais exigentes não terão do que reclamar. A receita não desandou, pelo contrário, resultou num produto delicioso para se desgustar.

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