Antonio Carlos Egypto
Dois
filmes em cartaz nos cinemas refletem o que foi a sangrenta ditadura militar
chilena, comandada pelo general Augusto Pinochet, de 1973 a 1990, enquanto o
Brasil enfrentava sua longa, e também sangrenta, ditadura militar, de 1964 até
1985.
Em PRISÃO NOS ANDES (Penal Cordillera), produção chilena de 2023, o diretor Felipe
Carmona mostra uma prisão especial a céu aberto, na Cordilheira dos Andes, que
abrigava cinco oficiais militares julgados e condenados por crimes de lesa
humanidade como cruéis torturadores do regime de Pinochet, que censurou,
perseguiu, torturou e matou militantes de esquerda, participantes e
simpatizantes do governo de Salvador Allende, artistas e outros. Lá eles estão “vigiados” por guardas que, na
prática, estão tão presos quanto eles e que acabam funcionando até como
empregados deles. Porque os antigos
chefões continuam se sentindo e agindo como se pudessem contar com o mesmo
poder de que dispunham até a queda do regime e esperando voltar a qualquer
momento. Ou seja, na base do quem foi
rei nunca perde a majestade. Ou, melhor
dizendo, opressores cruéis serão sempre opressores cruéis, se assim puderem
agir, mesmo na cadeia. O mérito de
Felipe Carmona é mostrar o cotidiano dessa prisão “especial” injustificada,
depois de tudo o que o Chile viveu com essas figuras. Além de privilégios e benesses inaceitáveis
da tal prisão. No entanto, a exploração
dessa questão não é aprofundada no filme, os personagens militares não são bem
desenvolvidos, algumas situações soam artificiais, gratuitas ou sem relação
direta com o tema. Faltou amarrar as
pontas, integrar a narrativa. No elenco:
Andrew Bargsted, Hugo Medina, Bastián Bodenhöfer. 104 min.
Em AINDA SOMOS OS MESMOS, produção
brasileira de 2024, dirigida por Paulo Nascimento, rodada no Chile e no Brasil,
utilizam-se relatos reais como o de um militante da VPR (Vanguarda Popular
Revolucionária), que ficou 42 dias abrigado na Embaixada da Argentina, em
Santiago, para poder sobreviver naquele momento em que, em qualquer lugar do
país, no ano de 1973, quando se passa a ação, o perigo era total e a morte
política estava à espreita. O jovem
Gabriel (Lucas Zaffari) vai ao Chile, como muitos brasileiros na época, incluindo
exilados, buscar a democracia e a liberdade do governo popular de Allende e
encontrará lá, um pouco depois, uma repressão monstruosa. O pai Fernando (Edson Celulari) empresário
figurão e colaborador do regime brasileiro até ajuda o filho, a contragosto, a
sair do país, mas sobrará para ele a missão de resgatar Gabriel em plena
Embaixada Argentina em Santiago, negociando com os militares daqui e de
lá. A situação é toda tensa e dramática,
mas o filme não consegue atingir tal nível emocional, exceto em alguns poucos
momentos. A centralidade do papel do
empresário, numa história vivida e manejada pelo jovem filho militante da
esquerda, não contribuiu para isso. Se a
intenção era destacar, explicar, o papel da sociedade civil na ditadura
militar, não funcionou. O papel de
Fernando, embora bem interpretado por Edson Celulari, não dá conta disso. Deixa, inclusive, confuso esse papel e as
relações que sustentam esses vínculos, tanto internos quanto externos. 90 min.
É
importante resgatar essas histórias do período das ditaduras
latino-americanas. Um pouco depois, essa
Argentina acolhedora da Embaixada viveria drama idêntico e maior, até, com seus
militares, as Madres de Mayo em busca de
desaparecidos e tudo o que sabemos. A
guerra fria mostrou-se bem quente e coordenada por aqui. Muito já se falou e
ainda há muito a dizer, compreender e reparar, sobre esse período
histórico. Mas isso não basta,
precisamos de filmes intensos, emocionantes, bem elaborados, criativos, para
contribuir para que essa história, de fato, nunca mais se repita.
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