sábado, 3 de agosto de 2024

CARTAS OBSCENAS E O MAL

Antonio Carlos Egypto

 


PEQUENAS CARTAS OBSCENAS (Wicked Little Letters).  Reino Unido, 2023.  Direção: Thea Sharrock.  Elenco: Olivia Colman, Jessie Buckley, Anjana Vasan, Timothy Spall.  101 min.

 

“Pequenas Cartas Obscenas” é uma comédia bem característica do humor inglês.  Focaliza uma pequena localidade litorânea nos anos 1920. Uma sociedade tradicional, conservadora, dominada pela visão religiosa do mundo. Ainda assim, há espaço para uma jovem mulher de hábitos mais livres e um linguajar chulo, que inclui palavrões no seu dia-a-dia.  Algo que incomoda a comunidade e que é mal tolerado.  Esse é o papel da jovem e talentosa atriz Jessie Buckley, a personagem Rose.  Já Olivia Colman, excelente e talentosa atriz já experiente, faz o papel central da trama, o de Edith.  Edith recebe cartas obscenas e injuriosas, curtas e incômodas, que abalam a ela e a seus pais.  Eles reclamam na polícia local e estão certos de que tal coisa se deve a Rose.  Mas a policial local Gladys, vivida pela jovem e muito boa atriz Anjana Vasan, não está convencida disso e resolve investigar, mesmo contrariando a orientação de seus superiores, homens.  O mistério será desvendado.  A história, inspirada em fatos reais, é tão estranha que parece uma ficção exagerada.  Reflete, no entanto, o que o ser humano que não está em paz consigo mesmo é capaz de fazer.  Além do belo elenco, que tem também o conhecido e notável ator Timothy Spall, o clima e os diálogos do filme valem a pena. É uma produção bem cuidada, clássica, sem inovações formais.  Acaba sendo um bom entretenimento, que respeita a inteligência do público.

 


O MAL NÃO EXISTE (Aku Wa Sonzai Shinai) é o novo filme de Ryusuke Hamaguchi, do Japão, que esteve na # 47 Mostra. Quem viu “Drive My Car”, um filme espetacular, e também “Roda do Destino”, sabe que se trata de um talento indiscutível de cineasta.  Daí ser imperativo conhecer seu novo filme. Só que “O Mal Não Existe” nos prega uma grande peça.  O filme é hermético, no sentido de incompreensível.  Não está nas imagens, nem nas falas, nem no inexistente nexo causal entre as sequências, o significado da obra. Cabe ao espectador desvendar a esfinge.  Enquanto isso, assiste-se a uma filmagem bonita, com belas locações, bons atores e tudo o mais. E vê-se muita maldade, ou intenções escusas, num filme que se chama “O Mal Não Existe” .  Como assim?  É só uma ironia ou ele seria uma representação, uma performance teatral? Ou ele está lá e a gente faz de conta que não vê? Poderíamos até fazer uma pesquisa sobre o que cada um achou que era, interpretou, complementou, inventou.  Quando algo não está claramente dado, a tendência é preenchermos as faltas com a nossa própria visão do mundo e das coisas.  Ou simplesmente abandonar o desafio e rejeitar o filme.  O problema é que ele é muito bem feito e está muito longe de ser uma bobagem qualquer.  106 minutos.

 

 

 

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