Antonio Carlos Egypto
Documentários
surpreendentes, inovadores, instigantes, provocadores, informativos. Essa é a matéria-prima do festival É TUDO
VERDADE 2023, com sua variedade de temas, referências e estilos de narrar a
realidade.
O
abuso sexual é o tema do documentário norte-americano (México/EUA) BELEZA SILENCIOSA, em que a diretora
estreante Jasmín Mara López conta sua própria história, de como ela enfrentou e
superou o abuso sofrido aos 9, 10 anos de idade, pelo avô Gilberto, 30 anos
atrás. Ela optou pelo processo corajoso
do enfrentamento, levando o assunto à família diretamente. Descobriu que houve vários outros casos,
encontrou ceticismo, negação, defesa do abusador, omissão e até orientação para
calar-se, passar o pano, como se diz atualmente. Pelo abusador, como de costume, obteve a
resposta de que era delírio, imaginação dela.
O filme é muito interessante, bem realizado, inclusive visualmente
bonito e corretíssimo ao colocar os elementos relevantes da questão como ela de
fato se dá: geralmente dentro da família e com a conivência de familiares. 88 min.
A
produção canadense AMERICANO: UMA
ODISSEIA A 1947, dirigido pelo jovem Danny Wu, traça a já conhecida
trajetória do gênio Orson Welles desde o início da sua carreira no teatro, no
rádio e no cinema, até a sua saída definitiva dos Estados Unidos rumo a Roma,
em 1947. Estão lá o “Cidadão Kane”, a
invasão dos marcianos na rádio transmissão histórica, a vinda ao Brasil para
filmar o carnaval, o empastelamento do filme “The Magnificent Ambersons”
(“Soberba”, no Brasil), a rejeição e derrocada em Hollywood, mas também e
principalmente seu claro posicionamento político em defesa dos direitos
humanos, que o levou à acusação de comunismo e de atividades antiamericanas. Inclui
histórias de americanos de origem japonesa e suas relações com Pearl Harbor e a
bomba de Hiroshima. E ainda o herói
negro esquecido, que, agredido, ficou cego e foi defendido enfaticamente por
Welles no rádio, o que ampliou seus problemas na época. Ou seja, uma narrativa mais ampla e
abrangente da grande figura que Orson Welles foi, para além do grande e
polêmico criador que o cinema conheceu. 102 min.
O CASO PADILLA
(Espanha/Cuba), dirigido por Pavel Giroud, trabalha com uma fita contendo a
gravação da autocrítica do escritor e poeta Heberto Padilla, feita em 1971,
após prisão pelo regime cubano, em encontro de escritores marcado para esse
fim. Um depoimento em que ele se humilha, nega todas as suas ideias e sua obra
premiada, ao se declarar contrarrevolucionário, rebaixando-se e repetindo que
estava completamente errado e a Revolução Cubana, completamente certa. Não só no seu caso, mas no de alguns de seus
colegas escritores ali presentes e de sua própria mulher. A que ponto de degradação pode chegar alguém,
no caso, um intelectual, para salvar a pele e se autodestruir? Sua autocrítica é tão obviamente falsa que,
longe de proteger o regime cubano naquele período, só o comprometeu. 87 min.
O
documentário uruguaio HOT CLUB DE
MONTEVIDEO, dirigido por Maximiliano Correnti, filho de um grande músico,
resgata a notável trajetória da instituição de jazz mais antiga da América
Latina, que sobrevive até hoje, mesmo tendo perdido sua sede física, o que
ocorreu outras vezes. Em sede própria,
num porão, na Aliança Francesa, no Kalima Boliche, ou onde quer que seja, o
jazz de pioneiros uruguaios, como Paco Mañosa, Horacio “Bocho” Pintos, Edgardo
Falero, Ricardo León Serena e muitos outros, se une a todos os grandes nomes do
jazz mundial. Pelo menos, todos aqueles
que um dia passaram por Montevideo e, inevitavelmente, tocaram lá. Os registros de fotos e filmagens
comprovam. O filme respira música da
melhor qualidade e caminha por décadas pela história da capital uruguaia. Há uma nostalgia, relativa, no ar e nos
depoimentos. Afinal, com a pandemia e
com todas as dificuldades, o Hot Club de Montevideo continua vivo. 90 min.
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