Antonio Carlos Egypto
SECA (Siccitá). Itália, 2022. Direção: Paolo Virzì. Elenco: Monica Bellucci, Silvio Orlando,
Valerio Mastandrea, Elena Lietti, Tommaso Ragno. 97 min.
Em
“Seca”, Roma está no centro de tudo.
Pela cidade, circulam os mais diversos tipos de pessoas, jovens e
velhos, homens e mulheres, bem sucedidos e figuras marginalizadas, dedicados
trabalhadores, espertalhões e aproveitadores, vítimas. Gente que oscila entre o amor e a morte,
entre o sucesso e o fracasso, entre a alegria e a tristeza, entre o
enamoramento e a traição. Ou seja, tudo
cabe e tudo está em Roma, a grande cidade que contempla tudo que é humano em
sua amplitude e diversidade.
Não se
trata, porém, de mais um retrato de Roma e de suas histórias, já bem contadas
pelo cinema italiano clássico. Trata-se
de uma Roma contemporânea, portanto, sujeita às mazelas da crise climática que
atinge a todos mundo afora.
A
cidade está há muito tempo sem chuva, vivendo uma crise séria de falta de água,
que produz uma sede monumental e o racionamento pesado da água, que acaba sendo
disputada em galões da potável em filas pelas ruas. Advêm as proibições, os limites, as
perseguições aos que ousem, por exemplo, querer lavar o carro, atividade,
naturalmente, proibidíssima. Enquanto
isso, as baratas circulam livremente e um vírus misterioso produz uma epidemia
que paralisa e derruba pelo sono, afetando a vida das pessoas e também sendo
fatal.
Esse
quadro todo nos obriga a olhar para o que estamos vivendo hoje, com a questão
ambiental se materializando numa crise climática que transforma tudo e põe em
sério risco todo o planeta. Não dá para
não ver, não se importar com o que nos afeta, queiramos ou não. No entanto, como os personagens de “Seca”, a
vida continua num dia-a-dia agitado, embora muito tomado pelas mudanças
climáticas que nos atingem de muitas formas.
Uma delas é a aparição de doenças, epidemias, que reviram
comportamentos, atitudes, princípios.
A
alegoria desta Roma seca é evidente: nossas histórias nunca mais serão as
mesmas. E quem viveu um sonho feliz de
cidade, como diria Caetano de sua Salvador, não conseguirá mais. Já não somos os mesmos, as cidades já não são
as mesmas, tudo mudou. Sabemos disso,
mas o que fazer com isso, afinal? Lutar
pela salvação do planeta, claro, do modo como pudermos. Sem nostalgias inúteis. E cobrando das autoridades políticas globais.
Esse
contexto, digamos, tragicômico, fala mais alto do que todas as subtramas, de
diferentes personagens, que circulam simultaneamente por Roma, vivendo seus
dramas pessoais, cada um à sua maneira, alguns mais afetados pelo que sucede ao
coletivo do que outros. Os que trabalham
em hospitais, por exemplo. Mas todos têm
suas histórias multiplicadas ou potencializadas pela crise.
Se o
filme reduzisse o número de histórias e de personagens seu recado central seria
melhor dado e assimilado. O
entretenimento é parte importante da realização cinematográfica, mas o excesso
de situações que se apresentam atrapalha um pouco a fruição do filme. “Seca” é rigorosamente moderno e atual. Tem um excelente elenco, uma direção afiada e
fala muito de perto a todos nós.
“Seca”,
do diretor Paolo Virzì, de filmes como “A Primeira Coisa Bela”, de 2010, e
“Capital Humano”, de 2013, faz parte do Festival do Cinema Italiano que
acontece presencialmente e on line,
de forma gratuita, até 04 de dezembro de 2022.
Confira a programação e acesse os filmes por meio de https://festivalcinemaitaliano.com/
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