terça-feira, 22 de novembro de 2022

SECA

                                                                      

Antonio Carlos Egypto

 

 



SECA (Siccitá).  Itália, 2022. Direção: Paolo Virzì.  Elenco: Monica Bellucci, Silvio Orlando, Valerio Mastandrea, Elena Lietti, Tommaso Ragno.  97 min.

 

Em “Seca”, Roma está no centro de tudo.  Pela cidade, circulam os mais diversos tipos de pessoas, jovens e velhos, homens e mulheres, bem sucedidos e figuras marginalizadas, dedicados trabalhadores, espertalhões e aproveitadores, vítimas.  Gente que oscila entre o amor e a morte, entre o sucesso e o fracasso, entre a alegria e a tristeza, entre o enamoramento e a traição.  Ou seja, tudo cabe e tudo está em Roma, a grande cidade que contempla tudo que é humano em sua amplitude e diversidade.

 

Não se trata, porém, de mais um retrato de Roma e de suas histórias, já bem contadas pelo cinema italiano clássico.  Trata-se de uma Roma contemporânea, portanto, sujeita às mazelas da crise climática que atinge a todos mundo afora. 

 

A cidade está há muito tempo sem chuva, vivendo uma crise séria de falta de água, que produz uma sede monumental e o racionamento pesado da água, que acaba sendo disputada em galões da potável em filas pelas ruas.  Advêm as proibições, os limites, as perseguições aos que ousem, por exemplo, querer lavar o carro, atividade, naturalmente, proibidíssima.  Enquanto isso, as baratas circulam livremente e um vírus misterioso produz uma epidemia que paralisa e derruba pelo sono, afetando a vida das pessoas e também sendo fatal.

 

Esse quadro todo nos obriga a olhar para o que estamos vivendo hoje, com a questão ambiental se materializando numa crise climática que transforma tudo e põe em sério risco todo o planeta.  Não dá para não ver, não se importar com o que nos afeta, queiramos ou não.  No entanto, como os personagens de “Seca”, a vida continua num dia-a-dia agitado, embora muito tomado pelas mudanças climáticas que nos atingem de muitas formas.  Uma delas é a aparição de doenças, epidemias, que reviram comportamentos, atitudes, princípios.

 


A alegoria desta Roma seca é evidente: nossas histórias nunca mais serão as mesmas.  E quem viveu um sonho feliz de cidade, como diria Caetano de sua Salvador, não conseguirá mais.  Já não somos os mesmos, as cidades já não são as mesmas, tudo mudou.  Sabemos disso, mas o que fazer com isso, afinal?  Lutar pela salvação do planeta, claro, do modo como pudermos.  Sem nostalgias inúteis.  E cobrando das autoridades políticas globais.

 

Esse contexto, digamos, tragicômico, fala mais alto do que todas as subtramas, de diferentes personagens, que circulam simultaneamente por Roma, vivendo seus dramas pessoais, cada um à sua maneira, alguns mais afetados pelo que sucede ao coletivo do que outros.  Os que trabalham em hospitais, por exemplo.  Mas todos têm suas histórias multiplicadas ou potencializadas pela crise.

 

Se o filme reduzisse o número de histórias e de personagens seu recado central seria melhor dado e assimilado.  O entretenimento é parte importante da realização cinematográfica, mas o excesso de situações que se apresentam atrapalha um pouco a fruição do filme.  “Seca” é rigorosamente moderno e atual.  Tem um excelente elenco, uma direção afiada e fala muito de perto a todos nós.

 

“Seca”, do diretor Paolo Virzì, de filmes como “A Primeira Coisa Bela”, de 2010, e “Capital Humano”, de 2013, faz parte do Festival do Cinema Italiano que acontece presencialmente e on line, de forma gratuita, até 04 de dezembro de 2022.  Confira a programação e acesse os filmes por meio de https://festivalcinemaitaliano.com/

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário