Antonio Carlos Egypto
Vou preenchendo este longo período de
permanência em casa, em função da pandemia, que se alonga muito por conta da
condução incompetente com que ela tem sido gerida, as idas e vindas, os
desencontros, a irresponsabilidade governamental. Podiam ter evitado a perda de muitas dessas
vidas, ter feito um lockdown para valer por um
período definido, sem concessões, e o resultado teria sido outro. Enfim, restou a cada um fazer a sua parte, na
medida de suas possibilidades. Enquanto
o quadro trágico se desenrolava, de vez em quando era preciso desligar o
noticiário e rir um pouco.
Nesse sentido, foi providencial o
lançamento recente de uma caixa de DVDs da Versátil Home Vídeo, chamado de
“Obras Primas da Comédia”, com 6 filmes italianos do gênero restaurados,
realizados na década de 1960.
Como sabemos, esse período foi
especialmente brilhante para o cinema italiano, que revolucionou as telas do
pós-Segunda Guerra Mundial com o neorrealismo. E, ao lado do drama social, explorou o humor,
os hábitos e costumes dos agrupamentos humanos das diferentes regiões
italianas. Com argúcia e perspicácia
política nos levou a dar boas risadas, embalados por atores e atrizes espetaculares. Nessa caixa é possível apreciar o trabalho de
Vittorio Gassman, Alberto Sordi, Ugo Tognazzi, Nino Manfredi, Claudia
Cardinale, Claire Bloom, Silvana Pampanini e outros.
O diretor mais presente na caixa, com
3 filmes, é Dino Risi (1916-2008), um dos pais da comédia italiana. E o maior destaque, o filme “Os Monstros” (I Monstri), de 1963, uma sátira da
sociedade italiana da época, dividida em vinte esquetes hilariantes,
protagonizados por Vittorio Gassman e Ugo Tognazzi, com participação também de Lando
Buzzanca.
“Sua Excelência, o Trapaceiro” (Il Mattatore), de 1964, é outro grande
trabalho de Risi, em que Gassman explora sua capacidade histriônica com maestria, aplicando todo tipo de golpe, dando vazão à
sua versatilidade interpretativa.
Um pouco menos brilhante, “O Caradura”
(Il Gaucho), também de 1964, de Risi,
dá a Gassman novamente a oportunidade de explorar um talento cínico e
pretensões golpistas, num festival de cinema em Buenos Aires. Seu amigo italiano vivendo na Argentina dá a
Nino Manfredi a oportunidade de compor um tipo, o do imigrante pobre,
envergonhado do seu insucesso, que nos faz rir e pensar.
“O Magnífico Traído” (Il Magnifico Cornuto), de 1964, de
Antonio Pietrangeli (1919-1968) é uma comédia inteligente que explora o onipresente
tema do cornudo, mostrando como as diferenças de gênero pesam nessa questão.
Ugo Tognazzi protagoniza com brilho um filme que tem Claudia Cardinale no auge
da beleza. É um filme marcante desse
período da comédia italiana.
Os dois outros filmes da caixa têm
Alberto Sordi em estado de graça. Em “O
Professor de Vigevano” (Il Maestro di
Vigevano), de 1963, ele encarna um professor de escola primária, todo
sistemático, que encara com galhardia uma existência digna, mas pobre. Já a
mulher, (Claire Bloom) não aguenta mais isso e o leva a ser empreendedor no
ramo de calçados. Não seria novidade, já que a pequena cidade de Vigevano vive
e respira a produção e venda de calçados com sucesso. Mas para o professor não será tão fácil. A começar pelas concessões que terá de fazer,
a malandragem que ele não tem, e por aí vai.
O filme tem um interessante approach
político, o que não surpreende, já que seu diretor Elio Petri (1929-1982) faria
grandes filmes políticos, como “Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer
Suspeita” (1970) e “A Classe Operária Vai ao Paraíso” (1971), já num registro
dramático. Mas foi muito bem na comédia, também.
O que foi aqui chamado de “Perdidos na África”, de 1968, tem um titulo original imenso: Riusciranno i nostri eroi a ritrovare l’amico misteriosamente scompasrso in Africa? É o único filme colorido da caixa. Alberto Sordi faz um empresário que se mete numa aventura na África, com seu empregado de comportamento estranho, em busca do cunhado que sumiu e que aparecerá de inúmeras maneiras. O filme tem um tratamento que brinca com os clichês, tanto da África, quanto dos italianos, mas também combate preconceitos e atitudes autoritárias e arrogantes. A direção é de Ettore Scola (1931-2016), de grandes filmes, como “Nós que Nos Amamos Tanto” (1974), “Um Dia Muito Especial” (1977), “Casanova e a Revolução” (1982) e “O Baile” (1983).
Foi muito divertido revisitar a
comédia italiana dos bons tempos, para relaxar e esquecer um pouco desse coronavirus
tão onipresente.
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