Antonio Carlos
Egypto
A VIDA APÓS A VIDA (Zhi Fan Ye Mao). China, 2016.
Direção e roteiro: Zhang Hanyi.
Com Zhang Li, Zhang Mingjun. 80
min.
O longa-metragem chinês do cineasta estreante
Zhang Hanyi pode ser definido como um filme singelo e, ao mesmo tempo,
fantástico. Ou que trata do fantástico
com singeleza. Ele nos leva à província
chinesa de Shanxi, uma espécie de local abandonado pelos próprios moradores,
esquecido, parado no tempo. Obviamente,
decadente. Como diz o protagonista: ninguém
mais morre aqui, todo mundo vai embora antes. O cenário é desolador, há muitas
árvores, mas todas secas de outono e as casas são escombros ou muito precárias. A trama é de grande simplicidade, embora
apele ao sobrenatural, como o próprio título do filme, “A Vida Após A Vida”.
Ocorre que uma pequena parte dos antigos
moradores, que já partiram e morreram, voltam na forma de fantasmas, buscando
solucionar questões que deixaram pendentes em suas vidas na Terra, ou, mais
precisamente, em Shanxi.
É o caso do espírito de Xiuying, morta há mais
de dez anos, que toma o corpo de seu filho Leilei (Zhang Li), para reencontrar
o marido, Ming Chu (Zhang Mingjun), e resolver uma coisa importante para ela:
mover uma árvore plantada quando se casou.
Aí vemos o filho falando e se comportando como a mãe, em contraste com o
que foi mostrado antes, um garoto agitado e contestador. O jovem Zhang Li se sai muito bem nesse
desempenho. Zhang Mingjun, que faz o pai, terá, a todo custo, de resolver a
questão do transporte da árvore, o que não se colocará como uma tarefa
fácil. E conviverá com a mulher
materializada num adolescente, o que também traz algumas dificuldades interpretativas.
Para quem não tem familiaridade com a complexa
cultura chinesa – e oriental --, não é simples entender a relação dos seres
humanos com as árvores que os conhecem e com quem têm uma história em
comum. A relação com a natureza é muito
forte e simbólica, especialmente numa pequena localidade rural do interior do
país.
A transcendência que existe aí também não cabe
nos conhecidos parâmetros religiosos ocidentais. A mulher que morreu não reencarna para viver
uma nova vida na Terra. Ela toma emprestado
o corpo de seu filho para poder resolver um problema e, então, se liberar para
viver em paz fora da Terra. Também não sei se se coadunaria com algum preceito
budista e há que se reconhecer que tem similitude com os espíritos ou entidades
que baixam temporariamente em pessoas vivas.
O que é mostrado no filme é que o espírito se
apossa da pessoa e continua caminhando pelo campo, observando as árvores, o
ambiente, e agindo para alcançar seu objetivo, que é imediato. Não remete a questões morais, nem de largo
espectro. É, como disse, singelo.
A direção de Zhang Hanyi combina com
isso. Ele não usa nenhum efeito
especial, nenhuma fantasmagoria, nem passa perto das possessões que chacoalham
as pessoas. Tudo permanece absolutamente
calmo, tranquilo, até desolado, como é a localidade. A relação do casal, separado pela morte dela,
não apresenta nenhuma dramaticidade que ultrapasse a questão em foco, a da
árvore. Embora alguns diálogos remetam
ao passado comum, à ausência, à saudade e ao tempo percorrido. Mas tudo muito discreto.
Uma curiosidade, que recomenda o filme, é que
ele é produzido pelo grande diretor Jia Zhang-Ke. Evidentemente, não se poderia esperar que,
por isso, o filme fosse chegar perto do talento do cineasta produtor. Mas a presença de Zhang-Ke nos créditos abre
portas importantes, principalmente nos festivais de cinema pelo mundo. O filme já passou pelos festivais de Berlim e
Hong-Kong. Neste último, Zhang Hanyi
recebeu um prêmio concedido a cineastas estreantes. Já passou por aqui, no Festival Indie 2016, e agora entra em cartaz no circuito
comercial dos cinemas.
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