quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

AS CANÇÕES

Antonio Carlos Egypto



AS CANÇÕES. Brasil, 2011. Direção: Eduardo Coutinho.  Documentário.  90 min.

Canções podem estar associadas a momentos marcantes da vida das pessoas.  Às vezes, uma determinada canção evocará uma lembrança de grande amor, de grande tristeza ou dor, que jamais será esquecida ou posta de lado.  Algumas serão ouvidas e cantadas ao longo de toda a existência de um indivíduo.  Outras podem trazer tanto incômodo, que serão objeto de repulsa ou até poderão produzir sensações de medo, quando ouvidas ou entoadas.  Enfim, a associação entre canções e emoções intensas produz um material psicológico tão rico e variado que, para um documentarista do porte de Eduardo Coutinho, só poderia trazer grande interesse.

No painel humano que ele mostrou em “Edifício Master”, de 2002, um dos moradores cantou e contou sua história pessoal por meio da canção My Way, sucesso de Frank Sinatra.  Aquela revelação foi não planejada, ou inesperada, tornando o depoimento daquele personagem bastante atraente. 

Desta vez, Eduardo Coutinho planejou o filme “As Canções”, para obter resultado semelhante, com uma gama de experiências música/história de vida mais ampla.  Divulgou por diferentes espaços da cidade do Rio de Janeiro um chamamento: “Alguma música já marcou sua vida?  Cante e conte sua história”.  Colheu a oferta espontânea dos que se interessaram pela proposta e durante dois meses foi selecionando as melhores histórias.  De 237 pessoas, 42 foram filmadas e 18 estão no filme, com idades que variam de 22 a 82 anos.  Suponho que ele tenha escolhido, também, os que poderiam cantar melhor, porque é surpreendente a boa performance do canto a capela dos que são mostrados.


Conhecemos, então, as mais diversas histórias de amor, traição, submissão, angústia, arrependimento, perda e solidão, só para citar alguns dos elementos constitutivos da farta colheita que Coutinho obteve com sua estratégia.

Histórias que a memória reteve, transformou, reinventou, de grande significado para cada um dos depoentes, pessoas do povo que toparam expor não só seus sentimentos, mas seu canto, em geral intenso e emocionado.  Um filme que flui gostosamente.  Por um lado, há muita espontaneidade.  Por outro, muita graça na teatralidade ou no exagero de alguns.  As músicas, além de serem conhecidas e apreciadas do nosso cancioneiro popular, são interpretadas com uma exuberância afetiva que as torna especialmente atraentes. Os homens e mulheres que se apresentam em “As Canções” não são cantores, mas cantam bem, com alma, Roberto Carlos, Tom Jobim, Vinicius, Chico Buarque e outros mais.

Eduardo Coutinho, um dos nossos maiores documentaristas, que já nos deu o extraordinário “Cabra Marcado para Morrer” (1964-1984), um clássico absoluto do cinema nacional, e “Jogo de Cena”, de 2007, que embaralhou de vez a história da “verdade” documental, num filme provocador e divertido, nos traz agora um produto mais singelo.  Pelo menos, aparentemente.  Afinal, a “verdade” registrada na memória e rememorada por meio de canções é tão produzida, consciente ou inconscientemente pelo sujeito, quanto aquela que a câmera pode planejar e registrar.  Está posta em xeque, uma vez mais, a questão de como poderia ser concebida uma “verdade” documental, seja ela objetiva ou subjetiva.

“As Canções” foi premiado como melhor documentário pelo júri oficial e também pelo público, no Festival do Rio 2011.

Um comentário:

  1. Por favor, moro no RJ, saberia me dizer onde adquiri-lo?

    Obrigada

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