O cinema saiu de cena. E eu também.
Dei um tempo para vocês. Não foi
intencional, nem planejado. Aliás, nada
do que vivemos no momento foi intencional ou planejado. O aleatório, o inesperado, faz parte da nossa
vida muito mais do que gostaríamos de admitir.
Alguns preferem criar a fantasia do vírus concebido em laboratório pelos
chineses. Negam a irracionalidade do
mundo, o inconsciente, a destruição do planeta, a própria doença. Como se pudéssemos manejar tudo. Fazemos escolhas, como Teich. Exatamente por não termos domínio da
situação.
Quando foi imperioso ficar em casa,
com meus mais de 70 anos e com minha esposa alguns anos mais velha, ficou muito
incômodo permanecer no apartamento, com um prédio em construção bem ao
lado. A solução era óbvia. Mudar por uns tempos (quantos, nunca se sabe)
para a nossa casa de veraneio em Águas de São Pedro. Quando a compramos, há 20 anos, a ideia era,
quem sabe, ficar por lá, quando batesse a velhice. Nessa hora em que a gente quer mais sossego
do que agitação e o corpo já não obedece à mente. Essa hora ainda não chegou, quero crer. Mas o estigma do vírus que ataca
preferencialmente os idosos pesa.
Lá temos o privilégio de usufruir de
uma casa gostosa, confortável, bem arejada e solar, com varandas e vista para
um lago. O que eu poderia desejar mais
do que isso, durante uma pandemia, em que o programa é ficar em casa?
Permaneci por lá nos últimos 70 dias,
usufruindo de tudo isso, mas tive de voltar agora, por conta da declaração do
imposto de renda, que deixamos para trás.
Pretendo voltar em seguida, porque para nós o isolamento social
permanece indicado. Ou melhor,
indispensável.
Só que lá não disponho da mesma tecnologia
que está à disposição em São Paulo. Não
tenho wi-fi nem TV a cabo. Internet, só pelo smartphone, com limitações.
A TV aberta, jornais e sites, garantem as notícias (cada vez mais
absurdas e assustadoras). CDs e DVDs dão
conta das músicas e filmes preferidos.
Tem também os livros. Ver filmes
inteiros pelo celular ou digitar textos por lá, nem pensar. É preciso ser telegráfico. Nas mensagens, nos textos, nos vídeos para
assistir. E quem precisa de tanto estímulo? Como já dizia Caetano Veloso, em “Alegria,
Alegria”, em 1967/68, quem lê tanta notícia?
Tenho recebido por e-mail, via
celular, muitas informações sobre lançamentos de filmes em streaming, ofertas de filmes gratuitos on line, mas não é apropriado para o meu atual momento ou possibilidade. O coronavírus me fez parar. Eu posso fazer isso e acho que tem seu valor
esse encontro comigo mesmo e essa reflexão sobre o que nos espera. Nessa hora, não estou preocupado em ser
produtivo ou estar atualizado. Tudo tem
seu tempo.
Penso nos trabalhadores da área da
cultura e nos trabalhadores em geral, para quem o desafio desse período está
sendo devastador e, claro, temo pelo futuro de todos nós e da cultura, no
país. Da escalada de mortes que assola o
Brasil, nem se fala. Se alguém que me lê
agora perdeu parente ou amigo nessa pandemia, aceite meus sentimentos. Isso não aconteceu comigo. Pessoas próximas sofreram com a doença,
inclusive um morador aqui do nosso prédio, que se recupera após longo período
hospitalar, com entubação, hemodiálise e tudo o mais. Espero que sobrevivamos. Cuidem-se.
E, se puderem, fiquem em casa.
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