A Abraccine (Associação Brasileira de Críticos
de Cinema), da qual também faço parte, elege a cada ano os melhores filmes,
considerando os lançamentos em cinema, streaming, VOD, do ano anterior. No caso, 2019.
Uma centena de críticos,
distribuídos por quase todos os Estados brasileiros, indica os melhores filmes
que, após troca de ideias e debates, passam por votação para a escolha do
melhor, em cada categoria. São
escolhidos os melhores longa e curta nacionais e o melhor longa estrangeiro.
Este ano, a Abraccine
decidiu divulgar não apenas o vencedor de cada categoria, mas também os 10 mais
votados pelo conjunto de críticos da Associação. Assim, se consegue um panorama mais amplo do
melhor da produção cinematográfica do ano que passou.
Confiram a lista dos
indicados e o vencedor em cada categoria.
Em seguida, recoloco as minhas críticas dos longas vencedores.
LONGA-METRAGEM BRASILEIRO
VENCEDOR:
BACURAU, Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles
BACURAU, Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles
Completam o top dez, em ordem alfabética:
DEMOCRACIA EM VERTIGEM, Petra Costa
DESLEMBRO, Flávia Castro
DIVINO AMOR, Gabriel Mascaro
ESTOU ME GUARDANDO PARA QUANDO O CARNAVAL CHEGAR, Marcelo Gomes
INFERNINHO, Guto Parente e Pedro Diógenes
NO CORAÇÃO DO MUNDO, Gabriel Martins e Maurilio Martins
LOS SILENCIOS, Beatriz Seigner
TEMPORADA, André Novais Oliveira
A VIDA INVISÍVEL, Karim Aïnouz
DESLEMBRO, Flávia Castro
DIVINO AMOR, Gabriel Mascaro
ESTOU ME GUARDANDO PARA QUANDO O CARNAVAL CHEGAR, Marcelo Gomes
INFERNINHO, Guto Parente e Pedro Diógenes
NO CORAÇÃO DO MUNDO, Gabriel Martins e Maurilio Martins
LOS SILENCIOS, Beatriz Seigner
TEMPORADA, André Novais Oliveira
A VIDA INVISÍVEL, Karim Aïnouz
LONGA-METRAGEM ESTRANGEIRO
VENCEDOR:
PARASITA, Bong Joon-ho
PARASITA, Bong Joon-ho
Completam o top dez, em ordem alfabética:
ASSUNTO DE FAMÍLIA, Hirokazu Koreeda
CORINGA, Todd Phillips
DOR E GLÓRIA, Pedro Almodóvar
EM TRÂNSITO, Christian Petzold
ERA UMA VEZ EM HOLYWOOD, Quentin Tarantino
O IRLANDÊS, Martin Scorsese
NÓS, Jordan Peele
O PARAÍSO DEVE SER AQUI, Elia Suleiman
SYNONYMES, Nadav Lapid
CORINGA, Todd Phillips
DOR E GLÓRIA, Pedro Almodóvar
EM TRÂNSITO, Christian Petzold
ERA UMA VEZ EM HOLYWOOD, Quentin Tarantino
O IRLANDÊS, Martin Scorsese
NÓS, Jordan Peele
O PARAÍSO DEVE SER AQUI, Elia Suleiman
SYNONYMES, Nadav Lapid
D
CURTA-METRAGEM BRASILEIRO
VENCEDOR:
SETE ANOS EM MAIO, Affonso Uchôa
SETE ANOS EM MAIO, Affonso Uchôa
Completam o top dez, em ordem alfabética:
CARNE, Camila Kater
JODERISMO, Marcus Curvelo
A MULHER QUE SOU, Nathália Tereza
NEGRUM 3, Diego Paulino
QUEBRAMAR, Cris Lyra
SWINGUERRA, Bárbara Wagner e Benjamin de Burca
TEA FOR TWO, Julia Katharine
TEORIA SOBRE UM PLANETA ESTRANHO, Marco Antonio Pereira
TUDO QUE É APERTADO, RASGA, Fabio Rodrigues
BACURAU
Antonio Carlos Egypto
JODERISMO, Marcus Curvelo
A MULHER QUE SOU, Nathália Tereza
NEGRUM 3, Diego Paulino
QUEBRAMAR, Cris Lyra
SWINGUERRA, Bárbara Wagner e Benjamin de Burca
TEA FOR TWO, Julia Katharine
TEORIA SOBRE UM PLANETA ESTRANHO, Marco Antonio Pereira
TUDO QUE É APERTADO, RASGA, Fabio Rodrigues
BACURAU
Antonio Carlos Egypto
BACURAU.
Brasil, 2018. Direção e roteiro:
Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles.
Com Sonia Braga, Udo Kier, Bárbara Colen, Thomás Aquino, Silvero
Pereira, Karine Teles, Antonio Saboia.
132 min.
“Bacurau”, o novo filme de Kleber Mendonça
Filho (de “O Som ao Redor”, 2013, e “Aquarius”, 2015) e Juliano Dornelles é um
western brasileiro. Segue a trilha dos históricos “Deus e o Diabo
na Terra do Sol”, 1963, e “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, 1969,
de Glauber Rocha (1938-1981). Filmes que
já se pautavam por grande força política e preocupação social, tentando
desvendar um universo nordestino, marcado pela violência opressora, de um lado,
e resistente, de outro. Dialoga também
com a produção nacional que sempre teve nos cangaceiros uma fonte de inspiração
permanente e oportunidade de pensar e de criar a partir da realidade do
nordeste brasileiro, para alcançar o país.
“Bacurau” incorpora novos elementos a tudo
isso. Tem invasores agressores e
poderosos. Que chegam a tirar o povoado
do mapa e produzem assassinatos aparentemente inexplicáveis, se valendo até de
drones com aspecto de disco voador.
Falam inglês, seu comandante é um alemão com pinta e comportamento de
nazista, e os colaboradores que atuam com eles falando português, além do
inglês, são desprezados e descartados na primeira oportunidade. Ou seja, estamos no terreno da alegoria
política, que soa tão atual, mas talvez seja mesmo uma constante da nossa
história. Até porque nada se nutre do
momento atual, embora pareça inspirado nele.
Percepção acurada?
Premonição? Visão apurada do
processo histórico, vista da relação entre a casa- grande e a senzala e na
dimensão internacional que as envolve.
“Bacurau” mistura ação e reflexão no mesmo
produto. É um filme forte, intrigante,
provocador, mas é também uma aventura, muito envolvente. Por isso, pode ser visto como um filme de
gênero, embora não esteja preocupado em seguir cartilhas ou convenções. Fala ao sentimento do público, mostra uma
violência que tem de ser decifrada e que, afinal, nos leva a algumas
conclusões. Talvez distintas, para cada
grupo de espectadores. Mas que deve
mexer com todo mundo, de um jeito ou de
outro.
Um elenco enorme e dedicadíssimo a seus
personagens passa uma sensação de grande veracidade e nos remete a um mundo tão
familiar quanto parece distante. Sonia
Braga, como a dra. Domingas, reúne as dimensões da solidariedade e do
descontrole, a nos indicar a profunda humanidade da figura que encarna. Udo Kier é a maldade forasteira, mas também o
impasse e a solidão. Bárbara Colen faz
Teresa, mulher forte e lutadora. Os forasteiros colaboracionistas são
patéticos, mas a gente até se esquece disso porque Karine Teles e Antonio
Saboia nos conquistam pela qualidade de seus desempenhos. Thomás Aquino, como Pacote, e o inusitado
bandido local Lunga, papel de Silvero Pereira, nos mostram como é estar no fio
da navalha entre a fome e o crime. Todos
os personagens são bem construídos e têm um ator ou atriz à sua altura.
A trilha sonora é também bem marcante, vai de
Gal Costa e o objeto voador não-identificado a Geraldo Vandré, passando por
Sérgio Ricardo. Marcos reconhecíveis da resistência que marcou a nossa música e
o nosso cinema, que combinam bem com a temática tratada no filme.
A comunidade do povoado da Barra, no Rio
Grande do Norte, divisa com a Paraíba, onde a maior parte do filme foi gravada,
participou ativamente dos trabalhos de apoio à produção e como figurantes,
contribuindo para a autenticidade das situações mostradas.
“Bacurau” é um filme de peso da produção
brasileira recente, que já vem recebendo o maior reconhecimento internacional,
na forma de convites para mais de 100 festivais e mostras de cinema pelo mundo
e já com prêmios importantes conquistados nos festivais de cinema de Munique,
na Alemanha, em Lima, no Peru, e o importante prêmio do Júri, do Festival de
Cannes.
PARASITA
Antonio Carlos Egypto
PARASITA (Parasite). Coreia do Sul, 2019. Direção: Bong Joon-ho. Com Kang-ho Song, Sun-kyun Lee, Yeo-jeong Jo. 131 min.
“Parasita”, o vencedor da Palma de Ouro em
Cannes e indicado pela Coreia do Sul ao Oscar de filme internacional (ex-filme
estrangeiro), é um produto poderoso. A
narrativa se refere a uma família pobre, que se aproveita de uma oportunidade
de trabalho temporário para um de seus membros, para parasitar uma família
rica.
Para trabalhar essa história, Bong Joon-ho se
vale de uma variedade de gêneros.
“Parasita” é comédia, destila um humor que produz riso na plateia. É também um drama, até bem pesado. Não há personagem que saia incólume de
lá. Tem muito suspense e um sem-número
de surpresas e reviravoltas de tirar o fôlego.
Tem também alguns elementos fantasiosos, surrealistas, eu diria.
Ao mesmo tempo, aborda aspectos da realidade
social que estão subjacentes à situação, mas também explicitados na dinâmica
das classes sociais envolvidas na trama.
Até aspectos políticos da divisão das Coreias aparecem, dando um toque
inteligente em cenas de humor.
O filme consegue intrincar todos esses
elementos dos diferentes gêneros cinematográficos com bastante competência, sem
artificializar as passagens de um a outro registro e sem perder o ritmo. Ao contrário, o ritmo só cresce após cada
reviravolta.
Os desdobramentos das ações, na realidade,
produzem novas histórias e situações-problema.
Constituem-se num desafio novo a cada um dos personagens, deixando
sempre em aberto onde é que tudo isso vai parar. É um filme imprevisível, mas que conta com um
roteiro muito bem engendrado.
Acabou
conquistando o feito inédito de levar tanto o Oscar de melhor filme quanto o de
melhor filme internacional, além do prêmio de diretor e roteiro original. Sucesso
absoluto. Acima de qualquer expectativa de seus realizadores.
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