quinta-feira, 15 de agosto de 2024

O ÚLTIMO PUB

Antonio Carlos Egypto

 


O ÚLTIMO PUB (The Old Oak). Reino Unido, 2023.  Direção: Ken Loach.  Elenco: Dave Turner, Ebla Mari, Claire Rodgerson, Col Tait.  113 min.

 

A obra cinematográfica do diretor britânico Ken Loach é de uma consistência e coerência absolutas.  Seu talvez último filme, realizado no ano passado aos 87 anos de idade, é “O Último Pub”.  Baseado em roteiro de Paul Laverty, colaborador de Loach pelos últimos trinta anos, uma vez mais joga luzes na vida dos trabalhadores, dos excluídos, dos que são vítimas dos preconceitos.  Procurando sempre entender as razões econômicas e coletivas dos fatos.  Fazendo da forma mais simples possível um cinema complexo, porque a vida é complexa.  E ele não quer trapacear.  Muito menos a essa altura da sua existência.

 

“O Último Pub” vai a uma pequena cidade, que já foi muito próspera no passado, mas, com o fechamento das minas e das indústrias locais, produziu um êxodo e quem restou amarga uma decadência, falta de emprego e de perspectivas.  

 

Para cidades como essa, são levados os imigrantes, que fogem de condições de vida insuportáveis em seus países.  No presente caso, imigrantes sírios, fugindo da guerra que destruiu suas casas, seu trabalho, suas comidas, sua condição de vida.  Esses imigrantes pouco ou nada têm a oferecer, nem sequer dominam o idioma.  São, portanto, rejeitados, discriminados.

 

Ocorre que a população local tende a vê-los como os responsáveis pela sua decadência, esquecendo-se de todo o processo histórico-econômico que esvaziou essas cidades.  O estrangeiro é o culpado.  É simples.  Mas falso, muito falso.

 

É da vida dessas pessoas, as locais e os imigrantes, em convívio e conflito, que se alimenta a história desenvolvida pelo filme.

 


O dono do último pub, que resiste na cidade, no entanto, é capaz de se aproximar e quer ajudar esses sofridos sírios.  E se lembrando de um aforismo materno de que o fundamental é comer junto para viver bem, organiza refeições coletivas, reunindo os recursos dele e de todos, para que todos possam comer e existir de uma forma melhor.  Só que essa solidariedade à base da comida incomoda outros, que não aceitam que o pub tenha esse papel e quer os imigrantes longe dali.  Passando fome, não importa.

 

Ao mostrar todo esse processo e relacionamento, Ken Loach reafirma seu humanismo e sua crença na união dos trabalhadores e de todos que se sentem excluídos.  Mas, ao mesmo tempo, parece um pouco desanimado quanto ao êxito dessas lutas na atualidade. 

 

O momento mundial não é mesmo muito animador, com tanta opressão e tantas guerras.  Com o declínio do Estado de Bem-Estar Social na Europa, isso agudizou todo o problema dos imigrantes, hoje uma grande chaga não só no Reino Unido, mas na Europa toda e por aqui também, em escala menor.

 

Mais uma vez, o cineasta nos dá um belo filme político, dentro de uma narrativa dramática muito bem estruturada e trabalhando também com atores não profissionais, sírios que vivem ou viveram o drama que estão representando.  Algo que só solidifica e adensa a sinceridade e a verdade dos fatos.  Cinema da melhor qualidade. Se for mesmo o último filme dele, será uma pena.  O trabalho de Loach no Reino Unido tem uma grandeza que deixará uma lacuna, fará muita falta.

 

Quem não conhece a obra cinematográfica de Ken Loach e quiser ler minhas críticas a muitos dos filmes que ele fez, aqui no cinema com recheio, basta escrever o nome dele no campo de pesquisa, no formato web do blog, e terá muita coisa para ler.  Entre eles, os ótimos e mais recentes “Você Não Estava Aqui”, de 2019, e “Eu, Daniel Blake”, de 2016.  É uma obra maravilhosa, de um grande mestre do cinema.




 

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