Antonio Carlos Egypto
PLANO
75 (Plan 75), de Chie Hayakawa, que está indicado pelo Japão ao Oscar
de filme internacional, trata de um programa governamental de eutanásia
voluntária, dirigida a cidadãos idosos, a partir de 75 anos. Uma coisa complicada porque, se se pode admirar
o programa suíço de morte assistida como algo generoso e humanitário, o mesmo
não se dá aqui. Na Suíça, o programa é
particular, tem alto custo e, em princípio, se dirige a cidadãos e cidadãs que
optem por abreviar a existência, em função de sofrimentos físicos ou psíquicos
ou por desalento com a vida. É algo
cercado de muitos cuidados.
No caso do suposto programa japonês
abordado no filme, há a ideia de que os idosos, ou boa parte deles, são um peso
para a sociedade, para os mais jovens.
E, apelando para o espírito de sacrifício japonês (kamikazes, haraquiri, por
exemplo), de o Estado incentivar as pessoas a voluntariamente aderirem à
eutanásia, com algumas vantagens e sem custos.
Embora haja também pacotes luxuosos em resorts para as últimas noites da vida, para os abonados. Quando se estabelece um programa oficial, e
se divulga amplamente isso, pressupõem-se ações em larga escala, para atender a
todos os possíveis interessados, e um esquema em que tudo precisa funcionar
perfeitamente. O que é um desafio
complicado.
Vamos fazer um paralelo entre o
planejamento familiar e o controle de natalidade. Uma coisa é orientar e oferecer recursos para
aqueles que desejarem limitar o número de filhos aos que efetivamente quiserem
e puderem criar. Outra, é realizar um
programa oficial para a redução do número de filhos por família, a partir do
Estado, com leis, punições ou incentivos, ainda que tudo permaneça
“voluntário”. A motivação que vem das
pessoas ou das famílias é muito distinta da motivação do Estado, dos
governantes e dos planos econômicos.
Nesse último caso, é inevitável uma coerção, até pelo poder da
propaganda oficial, com seus meios e recursos financeiros, quando há um
interesse coletivo (ou governamental, pelo menos) na história. Um programa de massa, que atinja muita gente,
tem maior probabilidade de falhar. E
trata-se de um assunto com a seriedade da morte, da própria morte do indivíduo
que adere ao plano.
O filme PLANO 75 mostra essas coisas, a partir de uma narrativa que se
concentra, principalmente, em dois casos, em que o desalento em viver está
acompanhado de dificuldades ou problemas pessoais, mas que também refletem o
abandono a que a sociedade e o Estado relegam os idosos. Basta lembrar das dificuldades de uma pessoa
idosa de encontrar moradia para alugar, diante de um despejo inevitável, quando
se exigem, ironicamente, dois anos de antecipação do aluguel para alguém que já
beira os 80 anos e que não dispõe de recursos para tal. Nesse caso, é o lugar que a pessoa ocupa na sociedade
que está marcado. Marcado para morrer,
se pode dizer. A opção do indivíduo
está, portanto, bastante limitada.
Quando a narrativa se ocupa das falhas
que podem ocorrer, a situação é de chorar, alarmante. Não que o filme seja de emocionar, na sua
concepção. Mas é algo tão grave, que não
dá para brincar. Como, de algum modo, o
filme faz, tentando desanuviar as coisas.
É um produto bem feito, tem seus defeitos, mas é um bom trabalho sobre
um tema cada vez mais sério num mundo cada vez mais povoado por pessoas
idosas. No caso, o Japão é campeão
nisso. De todo modo, essa eutanásia
oficial não pode ser a solução, como o filme mostra.
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