Antonio Carlos Egypto
NOMADLAND, Estados Unidos, 2020. Direção: Chloé Zhao. Com Frances McDormand, David Strathaien,
Linda May, Cherlene Swankie. 106 min.
O mais premiado como melhor filme,
melhor direção e melhor atriz, foi “Nomadland” (terra nômade, terra dos nômades
ou o mundo dos nômades, como poderia ser chamado por aqui). É uma bela obra, de caráter quase documental,
da diretora chinesa Chloé Zhao, que vive e trabalha nos Estados Unidos, tem
críticas ao seu país de origem e teve sua retumbante vitória ignorada e
censurada nos meios eletrônicos chineses. Ela foi também a segunda mulher a
vencer o prêmio de melhor direção. Pois
é, um feito e tanto.
O filme também é uma surpresa como
vencedor de Oscar. Trata de questões
sociais com respeito e compreensão aos retratados, com sutileza e rarefação na
narrativa. A gente acompanha a vida
daquelas figuras da terceira idade que decidiram viver na estrada, em trailers, vans, caminhonetes, casas
sobre rodas, enfim. A protagonista Fern é vivida pela grande atriz Frances
McDormand, premiada com justiça, mais uma vez, no Oscar. Foi escolhida como melhor atriz também em
2018, por “Três Anúncios para um Crime” e, em 1997, por “Fargo”. Seu papel é bastante representativo do
universo retratado.
A cidade de Empire, em Nevada, vê o
fechamento de uma grande fábrica de gesso, que empregava quase todos na cidade,
falir, após a crise de 2008. O próprio
CEP da cidade deixou de ser utilizado, meses após esse fato. A cidade fantasma expulsa seus moradores, que
precisam sobreviver. Uma alternativa é
iniciar uma vida nômade. Viver no carro,
estacionar em terrenos públicos, que não cobram, desde que se saia em duas
semanas, e buscar, a cada quinze dias, uma atividade temporária, empregos
sazonais simples, geralmente mal remunerados.
Para a viúva Fern, era uma saída e ela aprendeu até a gostar, na medida
em que encontrava pessoas e grupos pelo caminho e os reencontrava
periodicamente. Para quem tem facilidade no relacionamento, fica melhor. A
solidariedade vale ouro nessa vida e traz pequenas trocas vantajosas a todos.
Frances McDormand se sente muito à
vontade no papel de Fern, contracenando com os demais atores, que são nômades
mesmo, estão representando a si próprios e expressando suas ideias de
fato. Ela se relaciona com eles com tal
naturalidade e afetividade, que parece mesmo um deles.
O filme acompanha Fern em seus
deslocamentos, trabalhos, dificuldades, e até em contatos familiares, e numa
oferta de moradia e vínculo permanente em uma casa. Mostra também os seus companheiros de
jornada, com quem ela vai se encontrando e se despedindo amiúde. Em função disso, “Nomadland” é também um
filme de estrada, de deslocamentos, uma oportunidade para explorar belas
paisagens, lugares menos conhecidos, como o deserto e partes da costa estadunidense.
É uma bela viagem que também nos
convida à introspecção e à contemplação.
Quem poderia imaginar que um filme assim venceria os principais prêmios
do Oscar? Todos sabemos que o Oscar é um
prêmio da indústria, não da arte.
Bilheterias contam muito. Um
cinema voltado para o mercado geralmente tem mais chance. Mais uma coisa que a pandemia
transformou. Com os cinemas fechados a
maior parte do ano de 2020, muitos filmes não foram terminados, não foram
lançados, estão sendo guardados para o pós-pandemia e, sobretudo, não foram
vistos. Assim, o inesperado acontece,
sob muitos aspectos.
“Nomadland” tem todos os méritos para
ser descoberto e apreciado pelas pessoas.
Os que acreditam que os melhores filmes são os do Oscar vão ter de parar
para pensar, porque o cinema que foi premiado em 2021 é bem diferente do que
estão acostumados a aplaudir. Pelo toque
artístico, pelo toque feminino, pelo toque oriental, pelo ritmo e pelos valores
que veicula. É muito bom cinema.
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