Antonio
Carlos Egypto
Ganharam o Oscar, paradoxalmente, os que não foram
indicados e, portanto, não poderiam ser escolhidos: os integrantes negros da
indústria cinematográfica de Hollywood.
É realmente inadmissível que atores, atrizes e outros profissionais
negros do cinema, pela segunda vez consecutiva, estivessem de todo ausentes do
prêmio. Exceção feita à homenagem
prevista para o diretor Spike Lee, pela obra que já havia realizado. Não é novidade alguma que exista a
discriminação. Isso vem de muito longe,
historicamente, são as raízes da escravidão que continuam pesando. Talvez lá mais do que aqui. Mas, enfim, está em toda parte. Era hora
mesmo de chiar, reclamar, pôr a boca no trombone. Foi o que eles fizeram, com humor, também, na
própria cerimônia do Oscar, comandada por Chris Rock. Muito bom, alguma coisa tem de mudar. Foi uma vitória a repercussão que o assunto
ganhou.
O Oscar branco de 2016, no entanto, não deixou de
premiar bons filmes. Faltou diversidade,
mas teve qualidade. “O Regresso” não ganhou melhor filme, merecia. Foi o trabalho de maior impacto
cinematográfico, entre todos os indicados.
O prêmio para o diretor Alejandro González Iñárritu, bisando o Oscar da
categoria (já havia ganhado com “Birdman” no ano passado), é um óbvio
reconhecimento do talento do cineasta mexicano.
“O Regresso” faturou o prêmio de fotografia para Emmanuel Lubezki e,
ainda, garantiu o esperado Oscar de ator para Leonardo Di Caprio. Muito justo e apropriado. Em número, foi pouco, 3 das 12 categorias
indicadas, mas são prêmios relevantes.
Em quantidade, quem levou muito foi “Mad Max”, 6
categorias, quase todas técnicas: design de produção (ou direção de arte),
montagem, figurino, cabelo e maquiagem, mixagem e edição de som. O sofisticado filme de ação de George Miller
não tem do que se queixar.
E o melhor filme foi, mesmo, “Spotlight”, que também
levou o prêmio de roteiro original? Para mim, não. Mas é um bom trabalho, no estilo clássico,
sobre um tema palpitante: a pedofilia na igreja católica norte-americana. Investigação jornalística como essa mostrada
no filme é raridade ou nem existe mais, mesmo.
O filme canadense “O Quarto de Jack” ganhou um prêmio
importante, o de melhor atriz para Brie Larson.
Estavam na parada concorrentes fortes: Charlotte Rampling, Cate
Blanchet, Jennifer Lawrence e a jovem Saoirse Ronan, do simpático e delicado
“Brooklin”.
“A Garota Dinamarquesa”, que não é tudo isso em
matéria de cinema, levou o prêmio de atriz coadjuvante para a bela e talentosa
Alicia Vikander, que se destacou no filme, ao lado do protagonista masculino,
Eddie Redmayne (que levou o Oscar 2015 por
“A Teoria de Tudo”). O assunto é
bom, a primeira cirurgia de mudança de sexo da história. Eddie está ótimo no papel, mas o filme é
certinho, bonitinho e às vezes equivocado.
Querem um exemplo? O personagem
central, o transexual, é um artista, um pintor.
Trabalha em casa, com pincéis e tintas, impecavelmente vestido de terno
e gravata, como se estivesse numa festa ou num escritório. Inconcebível.
O ator coadjuvante escolhido foi Mark Rylance, única
referência a “Ponte dos Espiões”, de Spielberg.
Tinha muito gente apostando em Sylvester Stallone, outra vez às voltas
com Rocky Balboa. Não. Tom Hardy, Mark Ruffalo e Christian Bale
estariam na minha lista antes dele.
Sobre o prêmio de roteiro adaptado para “A Grande
Aposta”, que eu não vi, mas sei que é daquelas histórias que quem não é
economista boia muito. A adaptação deve
ter sido boa o bastante para que o povo entendesse a história da bolha
imobiliária que resultou na crise de 2008. Não sobrou nada para o ótimo “Trumbo”, filme
político de primeira linha. Que tinha
tudo para ser mais lembrado e ter recebido mais indicações.
Tem ainda a esperada derrota do lindo “O Menino e o
Mundo”, de Alê Abreu, presença brasileira no Oscar. “Divertida mente”, levou, como todos diziam
que levaria, o prêmio de animação.
Vibrei com a vitória do grande Ennio Morricone, o
maestro e compositor italiano, que tanto já fez pelo cinema, recebeu até Oscar
honorário, e que acabou sendo o único prêmio do filme do Tarantino, “Os Oito
Odiados”. Canção original não deu Lady
Gaga, mesmo com a força do combate ao abuso sexual. A música do 007 é que levou. O prêmio de documentário foi para “Amy”,
lembrando a trajetória bela e trágica de Amy Winehouse, de Asif Kapadia.
Uma categoria que sempre me interessa especialmente é
a do chamado World Cinema, ou filmes
não falados em inglês. Essa divisão não
faz sentido, na medida em que equipara os Estados Unidos, Inglaterra, Irlanda,
Escócia, Austrália, Nova Zelândia, Canadá inglês e alguns outros, enquanto
segrega todos os demais países, desde que não produzam em inglês. Isso não é tão explícito assim, mas geralmente
é o que acontece. Dos cinco
selecionados, “A War”, da Dinamarca, não passou no Brasil. “Cinco Graças” (Mustang) é um filme
franco-turco que não convence muito. “O
Lobo do Deserto” (Theeb), da Jordânia, é um faroeste bonito. “O Abraço da Serpente” é consistente na
abordagem cultural da Amazônia, um belo filme da Colômbia. Mas “O Filho de Saul”, da Hungria, mereceu o
seu Oscar. Claro que podemos dizer que
campo de concentração, na Segunda Guerra Mundial, é um tema que pega na veia
emocional da Academia, mas o filme de László Nemes é uma poderosa realização.
A grande maioria dos filmes aqui citados recebeu
críticas, postadas no cinema com recheio, especialmente os que eu julguei
melhores. Quem estiver com seu note
book, lap top ou similar, é só usar o campo de pesquisa, digitando, por
exemplo, o nome total ou parcial do filme.
No smartphone, eu não saberia dizer como se faz a pesquisa, porque o
formato é um pouco diferente.
Experimentem.
Nota triste: costuma ser bonita no Oscar a homenagem
ao pessoal do cinema que faleceu no ano anterior. Mas muito triste mesmo é esquecer de mostrar
feras do cinema que morreram em 2015, como Manoel de Oliveira, Jacques Rivette,
Andrzej Zulawski e, ainda, a nossa Marília Pêra, que eles conhecem de
“Pixote”. De que cinema, afinal, se está
falando?
Muito boa resenha e comentários Antonio Carlos Egypto! Permita apenas fazer alguns comentários, não propriamente contestando, mas no sentido de contribuir.
ResponderExcluirAs cerimônias do Oscar normalmente são chatas. Aliás, como são chatos todos os festivais de cinema. Incrível isso, mas parece que o povo que trabalha com imagem não lida bem com esse tipo de eventos. Veja o nosso Gramado, cujo anti clímax é de doer.
Mas, o que desejo dizer é que a zoada toda sobre a questão do preconceito racial precisa ser melhor considerada, se assim me permite. Se, por dois anos, não houve ator, atriz ou outro profissional negro que não merecesse a indicação, não vejo necessariamente isso como uma prova de racismo, menosprezo etc. Aliás, de certa forma as piadas levadas a cabo pela organização e pelo apresentador pontuam isso. Eu, não vejo que os negros efetivamente não tenham espaço no cinema americano, e não é de hoje. Bem, mas é uma opinião.
Com relação ao cinema estrangeiro, ou seja o cinema não falado em inglês, também acho que o tema deve ser pontuado com alguma luz, afinal, Hollywood precisou se curvar aos outros cinemas e abrir uma janela, pequena de fato, para premiar produções de outras partes do mundo. Nas prévias, o número de participantes até já aumentou (pouco, mas aumentou). No final, claro, cinco filmes de todo o mundo não inglês é pouco, mas não custa lembrar de que o prêmio é da indústria do cinema americano e não uma premiação dos outros cinemas. Acho válido. Até porque nos outros campos, em especial do cinema artístico, engajado, comprometido, existem uma infinidade de festivais espalhados pelo mundo, com destaque para aqueles que fazem a cabeça e os corações dos cinéfilos: Berlim, Veneza e Cannes.
Cordialmente,
Paulo Antunes
Outro e-mail: pauloantunes@uol.com.br
Prezado,
ResponderExcluirGostei do seu Blog. Parabéns! Penso em criar um também para falar de cinema. Tenho feito meus comentários em minha página do Facebook, mas lá a coisa é um tanto complicada porque também publico outros temas de meu interesse, coisa que não pretendo fazer com o Blog, que também é uma mídia que conta com mais discrição, seriedade, serenidade e proteção.
Assim, se for possível gostaria de obter algumas dicas de como viabilizar o referido Blog, quem já tem pode ajudar muito.
Atenciosamente,
Paulo Antunes
Outro e-mail: pauloantunes@uol.com.br
Obrigado pelos seus comentários. Quanto ao blog pretendo lhe escrever a respeito.
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