domingo, 16 de outubro de 2011

A CRIANÇA DA MEIA-N0ITE

 Antonio Carlos Egypto

A CRIANÇA DA MEIA-NOITE (La permission de minuit).  França, 2011.  Direção: Delphine Gleize.  Com Vincent Lindon, Quentin Challal, Emmanuelle Devos.  110 min.

O foco do filme ”A criança da meia-noite” é a relação que se estabelece entre o médico e seu paciente, em determinadas circunstâncias, sendo a principal delas a gravidade da doença.  A criança que, na verdade é um pré-adolescente, é o garoto Romain (Quentin Challal), que sofre de um mal genético raro, chamado no filme de XP (xerodermia pigmentosa).  Romain não pode se expor aos raios UV, ou seja, não pode se expor ao sol e à iluminação noturna usual de alguns estádios esportivos.  Daí a menção à meia-noite.  É a hora em que ele pode praticar surfe, na praia, por exemplo.  Durante o dia, usa máscara e roupa especial, para evitar o sol.  É uma doença incurável, até o momento.

David (Vincent Lindon) é seu dedicado médico, que acaba estabelecendo uma relação muito mais próxima e afetiva do que a que costuma existir profissionalmente.  O que se vê é uma espécie de relação pai-filho, por razões que remetem à condição de vida de ambos.

Um novo desafio profissional para o médico pode pôr em risco essa relação e causar conflitos de difícil superação.  Até onde pode caminhar um vínculo médico-paciente, sem comprometer não só o tratamento, mas também a vida pessoal dos envolvidos? O que pode impedir que novos vínculos se estabeleçam?  E por que outros profissionais não poderiam dar seguimento ao caso, sem maiores traumas?  O que prende não só o paciente a seu médico, mas o médico a seu paciente?

São questões muito pertinentes que o filme aborda, possibilitando a reflexão sobre esse tipo de vínculo profissional e de cuidados com a saúde, quando posta fortemente em risco.  Será preciso um distanciamento pessoal para que o tratamento funcione e possa ser acompanhado por um novo médico?  A maturidade pessoal do profissional conta tanto quanto o seu conhecimento técnico ou a sua dedicação à pesquisa?

Há a questão da demanda que se coloca tanto ao médico quanto ao paciente.  Ambos estão vivendo em sociedade, têm expectativas pessoais e sociais e convivem com outras pessoas, cada um no seu mundo.  É uma demanda que extrapola a relação e escapa aos controles.  Estabelece-se um dilema que não é fácil de resolver.

Um tema rico para um filme que trata o assunto com honestidade e veracidade.  Provavelmente, será percebido como algo árido, para quem busca mais entretenimento do que reflexão sobre questões-problema.  Quem se dispuser a acompanhar com atenção a película será tocado por ela e pelas questões que ela levanta.

Não se trata de mais um filme sobre doença e superação, mas de um trabalho que, dentro de uma trama ficcional convincente, esmiúça as complexas relações médico-paciente.  Parte de uma situação limite, um caso muito doloroso e difícil, mas se presta a uma generalização muito mais ampla e se aplica a terapias prolongadas no atendimento à saúde física ou psíquica e aos relacionamentos que se estabelecem em projetos educacionais e de atendimento a carências sociais.

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