Antonio Carlos Egypto
A
situação proposta pelo filme do Quirguistão PRESENTE DE DEUS (Teniberdi)
é bastante interessante e muito bem realizada.
Ele conta com um andamento previsível até um certo ponto, mas consegue
ir além do esperado. O que se passa no
filme da diretora Asel Zhuraeva é que um casal de idosos, na faixa dos 80 anos,
com a saúde já debilitada, vivendo num pequeno lugarejo, encontra um bebê de 6
meses deixado à porta da casa e tem de resolver o que fazer com isso. Assumir e cuidar? Entregar para a polícia? Para o governo, por meio do Serviço
Social? Subornar autoridades para
conseguir a adoção do bebê, legalmente inviável? A trama vai por aí, num filme afetivo, terno
até, com excelentes atores, que se comunica muito bem com o público. Na sessão em que eu assisti, o filme recebeu
aplausos ao final. Isso tudo num filme
sintético, de apenas 75 minutos.
UMA ESTRADA PARA UM VILAREJO (Gau ayeko bato), filme do diretor Nabin
Subba, do Nepal, é uma pequena joia fílmica, que tem um fascinante ator mirim
num bom elenco. Tudo começa com a
chegada do primeiro ônibus à localidade isolada até então. A modernidade, a partir do ônibus, é saudada
como grande avanço por parte das autoridades locais. Agora será possível ir à cidade regularmente
e conhecer as novidades do mundo moderno, como a coca-cola (com descarada
propaganda do refrigerante no filme), os modernos celulares e as grandes e
sofisticadas TVs atuais. Se isso vai
mexer nas necessidades dos adultos e da comunidade, imagine numa criança
esperta e interessada em tudo. Essa
criação de necessidades, típica do capitalismo de consumo, vai criar uma nova
dinâmica na família do tecelão Maila, pai do menino. Mas vai mexer também nos costumes e tradições
da aldeia e tudo começa a mudar. Como o
vínculo à aldeia versus ir ao estrangeiro.
Como o modo de trabalhar e sobreviver, com a necessidade de ganhar muito
mais dinheiro para ter acesso aos bens tecnológicos da atualidade. Um mundo que desmorona, se desorganiza, mas
que, de algum modo, tenta equilibrar os novos apelos com a sua história. Um filme que tem beleza, ritmo, e que estimula
a reflexão do público. 105 minutos.
O
filme de Camarões, MAMBAR PIERRETTE,
de Rosine Mbakan, centra-se na figura que dá nome ao filme. Mambar, costureira de prestígio na sua
comunidade, a cidade de Douala, tenta viver com dignidade do seu ofício, numa
realidade de pobreza, da qual ela faz parte.
É uma liderança junto a seus clientes, a quem ajuda de outras formas,
como confidente e conselheira. No
entanto, tem de enfrentar enormes dificuldades quando é assaltada, um temporal
inunda sua casa e oficina, entre outros infortúnios que fazem parte da rotina
do lugar. Quem tem um bom personagem
como Mambar pode dispensar uma história, como é o caso aqui. E o filme mantém o interesse. 93 minutos.
EXCURSÃO (Ekskurzija), da Bósnia-Herzegovina, indicado ao Oscar de filme
internacional, da diretora Una Gunzak, nos remete à importância do trabalho de
educação sexual nas escolas. Num colégio
de Sarajevo, uma adolescente do ensino fundamental conta, num jogo, que fez
sexo com um garoto maior, do ensino médio.
Leva adiante a mentira, simulando ter ficado grávida. Isso acaba criando um ruído e uma série de
problemas, afetando o dia-a-dia da escola e uma excursão que está sendo
planejada. Aponta para o fato de que, no
gênero feminino, a fama de ser experiente tem o efeito contrário à do
masculino. Se dá prestígio ao menino,
tende a abalar a moral da menina. No
caso, agravado por uma mentira reiterada.
O filme não vai muito longe na discussão do tema, mas trata corretamente
da questão, numa abordagem fílmica convencional. 93 minutos.
BEIJANDO O CHÃO ONDE VOCÊ PISOU (Hai Ou Lai Guo De Fong Jian), de Macau,
dirigido por Hong Heng Fai, decepciona por excesso de pretensão, ao tratar de
dois personagens do âmbito artístico. Um
escritor em crise e um ator que não alça o voo desejado convivem num
apartamento, atraídos um pelo outro de formas distintas. Enquanto isso, a tela
faz citações literárias, com música sofisticada, mas não chega a lugar
nenhum. 94 minutos.
GAUGUIN E O CANAL (Gauguin y el Canal),
filme do Panamá, dirigido pelo cineasta português Frank Spano, trata da estada
do pintor francês Paul Gauguin (1848-1903) no Panamá, na época da construção do
famoso Canal. O momento é turbulento,
ele enfrenta um julgamento, uma doença e uma dívida que o obriga a pintar uma
grande tela. Viveu os seus últimos dias
entre a loucura e a sanidade. O filme
recorre às visões do inconsciente de Gauguin com as pessoas com quem ele
convivia, de forma alegórica, trazendo uma grande intensidade às cenas. Essa
parte da história de Gauguin, retratada no filme, é menos conhecida. O que cria um interesse a mais para o
espectador. 95 minutos.
@mostrasp
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